Novo Congresso norte-americano. Balança do poder altera-se em Washington

por Andreia Martins - RTP
Nancy Pelosi, a nova <i>speaker</i> da Câmara dos Representantes, é aplaudida na sessão inaugural do 116º Congresso dos Estados Unidos Jonathan Ernst - Reuters

O novo Congresso norte-americano tomou posse esta quinta-feira com várias caras novas e um novo equilíbrio entre os dois principais partidos. Se por um lado o Partido Republicano conseguiu não só manter, mas também reforçar, a maioria no Senado, a Câmara dos Representantes passa a estar dominada pelo Partido Democrático, o que poderá complicar seriamente a implementação da agenda política do Presidente norte-americano, a dias de completar dois anos de mandato. Os novos representantes, eleitos nas eleições intercalares de novembro, chegam ao Capitólio num período de paralisação da administração federal.

O início de 2019 fica marcado pela tomada de posse formal do 116º Congresso dos Estados Unidos, que entra em funções num momento de braço de ferro entre democratas e republicanos.  

A paralisação da administração federal (também conhecida por shutdown), em vigor desde 22 de dezembro, deve-se à rejeição por parte do Capitólio em dar aval ao financiamento para a construção de um muro na fronteira com o México, um investimento na ordem dos 5,7 mil milhões de dólares (cerca de 5 mil milhões de euros).   

Sem a inclusão da verba para a barreira fronteiriça - uma das principais bandeiras de Donald Trump desde que assumiu a presidência, em janeiro de 2017, mas que também já tinha sido promessa durante a campanha eleitoral –, o Presidente recusa-se a assinar uma lei orçamental provisória que evitaria a paralisação.  
O Senado continua a ser liderado pelos republicanos (53 senadores do Partido Republicano, 45 do Partido Democrático, mais dois senadores independentes). Já a Câmara dos Representantes terá maioria dos democratas (235 congressistas do Partido Democrático e 199 republicanos).  

Certo é que se as dificuldades para fazer aprovar medidas no Congresso já existiam, a partir de agora serão previsivelmente muito mais significativas, uma vez que as duas Câmaras deixam de estar dominadas pelos republicanos. Mais do que nunca, Donald Trump necessitará de chegar a entendimentos e de negociar com o partido da oposição.  

Já esta tarde, o Presidente norte-americano apontou culpas aos democratas pela paralisação vigente. “O shutdown acontece por causa da campanha presidencial para 2020. Os democratas sabem que não podem vencer com todas as conquistas de Trump, por isso estão a opor-se com todo o vigor ao muro e à segurança na fronteira, de que precisamos desesperadamente ”, escreveu no Twitter.  


Em dezembro, quando, num momento de impasse com os Democratas, a possibilidade de uma paralisação se avolumava cada vez mais, Donald Trump chegou a dizer que ficaria “orgulhoso” por provocar um shutdown no Governo por questões de segurança interna e que nunca atribuiria essa responsabilidade a outros. 

Independentemente das culpas que se possam apontar, o shutdown do Governo federal vigente desde há quase duas semanas será o primeiro grande desafio deste novo Congresso. Os democratas vão procurar desenhar um orçamento que termine com a paralisação e que não inclua os planos de Donald Trump para o muro na fronteira. Mas o Presidente deverá continuar a recusar-se a promulgar esse decreto por tempo indeterminado.   
 
Será a primeira das muitas batalhas e impasses de Washington, pelo menos durante os próximos dois anos, quando houver novas eleições para a Presidência e para o Congresso.

Até lá, outro fantasma paira no horizonte da política norte-americana: a possibilidade de abertura de um processo de impeachment contra Donald Trump, na sequência das várias inquirições que visam a esfera próxima do chefe de Estado norte-americano, bem como a própria investigação especial de Robert Mueller sobre a alegada interferência de Moscovo na campanha de 2016. 
Mulheres e minorias ao poder
O novo Congresso norte-americano empossado esta quinta-feira promete dificultar as políticas do Presidente, uma vez que os Democratas se deverão centrar em temas como a legalização de imigrantes, a diminuição do custo de medicamentos e ainda os aumentos de impostos para grandes empresas e para os mais ricos.

Por seu lado, os republicanos no Congresso parecem inclinados para a criação de acordos com a oposição - sem a bênção da Casa Branca - nomeadamente em temáticas centrais como a reforma das leis de imigração.  

Mas sem que tenha sido aprovada qualquer lei ou normativa, contra ou a favor da vontade de Donald Trump, este Congresso recém-empossado já fez história pela sua mera composição. Dele farão parte 102 mulheres, um número recorde para o Capitólio que passará a ser constituído por 23,4 por cento de senadoras e congressistas do sexo feminino. Trinta e cinco destas mulheres foram eleitas para os respetivos lugares pela primeira vez nas eleições intercalares de novembro.  

Alexandria Ocasio-Cortez, Ayanna Pressley, Ilhan Omar, Deb Haaland, Veronica Escobar e Sharice Davis fotografadas para a revista Vanity Fair

A posição de destaque das mulheres nestas câmaras será ainda mais evidente com o papel de relevo de Nancy Pelosi, que foi até aqui a líder da minoria democrata na Câmara dos Representantes, e que passa agora a ser a speaker principal (uma espécie de presidente da Assembleia da República para a câmara baixa do Capitólio).  

De resto, Pelosi foi a primeira mulher de sempre a ocupar este mesmo cargo, entre 2007 e 2011. No Senado, a presidência é ocupada pelo republicano Mike Pence, que é paralelamente o vice-presidente. 
Na Câmara dos Republicanos passa a haver 106 mulheres no total de 441 congressistas. No Senado, assumem o cargo 25 mulheres senadoras para um total de 100 senadores.  

Entre as mulheres que chegam a este Congresso estão as duas primeiras mulheres muçulmanas de sempre eleitas pelo povo norte-americano, ambas do Partido Democrático: Rashida Tlaib, nascida em Detroit e filha de imigrantes palestinianos, e lhan Omar, que chegou aos Estados Unidos aos 14 anos, em fuga da guerra civil na Somália.  

Não obstante estas presenças significativas, a religião católica continua a ter um peso preponderante na Câmara dos Representantes e no Senado, conclui o Pew Research Center

Também no Partido Democrático faz-se história com a eleição da mulher mais jovem de sempre para o Congresso, eleita por Nova Iorque. Com apenas 29 anos, Alexandria Ocasio-Cortez, de descendência porto-riquenha, já tinha ganho um papel de destaque na campanha presidencial de Bernie Sanders, em 2016.  

Deb Haaland e Sharice Davids são também as primeiras mulheres de origem nativa norte-americana a serem eleitas para o Congresso. Ambas do Partido Democrático, Haaland faz parte da tribo de Pueblo de Laguna, no Novo México, e Davids é da tribo Ho-Chunk Nation, do Wisconsin.  

Ayanna Pressley é mais uma das mulheres democratas que entra no Capitólio a fazer história. Foi a primeira mulher negra eleita pelo Estado de Massachussets. O mesmo acontece com Jahana Hayes, a primeira mulher negra eleita pelo Connecticut.

Veronica Escobar e Sylvia Garcia são, por sua vez, as primeiras mulheres latino-americanas a serem escolhidas para representarem o Texas na Câmara dos Representantes.  

Marsha Blackburn é a primeira mulher eleita para o Senado pelo Estado do Tennessee. Abby Finkenauer e Cindy Axne são as duas primeiras mulheres a chegarem à Câmara dos Representantes por eleição no Estado norte-americano do Iowa.  

Destaque ainda para a eleição de Jim Langevin, democrata de Rhode Island, que é o primeiro tetraplégico a chegar ao Congresso norte-americano.
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