O alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos manifestou esta terça-feira preocupação com o grande número de migrantes expulsos dos EUA, em particular de venezuelanos e salvadorenhos enviados sem julgamento para uma mega prisão em El Salvador. Volker Türk descreve a situação como uma "grave preocupação", na sequência da deportação em massa de 142 mil pessoas dos EUA, entre 20 de janeiro e 29 de abril, que ocorreu desde o regresso de Donald Trump à Casa Branca.
Volker Türk alerta em comunicado para uma situação suscetível de violar direitos fundamentais previstos no direito americano e no direito internacional, nomeadamente os direitos à proteção contra a detenção arbitrária e a tortura, assim como direitos à igualdade perante a lei.
Segundo o chefe dos Direitos Humanos da ONU, a deportação de milhares de migrantes ordenada pelo presidente dos EUA "suscita sérias preocupações relativamente a um vasto leque de direitos
que são fundamentais, tanto para o direito americano como para o direito
internacional".
Após o contacto do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUD) com as famílias dos estrangeiros deportados, Volker Türk explica que estas "expressaram um sentimento de total impotência perante o que aconteceu e a sua dor
por verem os seus entes queridos rotulados e tratados como criminosos
violentos, ou mesmo terroristas, sem que nenhum tribunal tenha decidido
sobre a validade das acusações que lhes são feitas».
Em meados de março, o presidente americano Donald Trump invocou a Lei dos Inimigos Estrangeiros de 1978, até então utilizada exclusivamente em tempo de guerra, para deter pessoas suspeitas de pertencer a gangues e deportá-las sem julgamento para El Salvador.
Segundo a Casa Branca, El Salvador aceitou encarcerá-los em troca de seis milhões de dólares (cerca de cinco milhões de euros), a maior parte deles em Cecot, a mega prisão de alta segurança criada pelo presidente salvadorenho Nayib Bukele para membros de gangues.
Numa conferência de imprensa esta terça-feira, na sede do Alto Comissariado em Genebra, a porta-voz Liz Throssell explicou que o ACNUD entrou "em contacto com as autoridades salvadorenhas" e "solicitou acesso a Cecot para podermos determinar as condições em que as pessoas estão detidas".
Segundo Volker Türk, "a forma como algumas pessoas foram detidas e deportadas — incluindo com o uso de correntes — assim como a retórica humilhante utilizada contra os migrantes, são também profundamente preocupantes". Receio de «desaparecimentos forçados»
Citando dados oficiais americanos, o Alto Comissariado indica a expulsão de cerca de 142 000 pessoas dos Estados Unidos, entre 20 de janeiro e 29 de abril, e alerta para o facto de nenhuma lista oficial dos detidos ter sido publicada pelas autoridades norte-americanas ou salvadorenhas. O paradeiro de pelo menos 245 venezuelanos e cerca de 30 salvadorenhos expulsos permanece incerto, alerta o Alto Comissariado.
A organização da ONU explica que muitos dos detidos não foram sequer informados da intenção do Governo norte-americano de os expulsar para um país terceiro e que muitos deles não tiveram acesso a um advogado ou a possibilidade de contestar a legalidade da sua expulsão antes de serem repatriados.
Liz Throssell, porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, salientou que, tendo em conta "as circunstâncias e o risco de violação dos direitos humanos, podem existir preocupações quanto a desaparecimentos forçados».
Após o recurso da administração Trump à lei sobre "inimigos estrangeiros" utilizada para expulsar imigrantes, os tribunais e os tribunais de recurso, assim como o Supremo Tribunal, bloquearam provisoriamente o recurso a esta lei, argumentando que as pessoas expulsas deviam poder fazer valer os seus direitos.
No início do mês de maio, também um juiz federal do Texas considerou "ilícito" o recurso à Lei dos Inimigos Estrangeiros de 1978.
Na sequência destes desenvolvimentos, o Alto Comissariado apela ao Governo dos EUA para tomar "as medidas necessárias para garantir o respeito pelos procedimentos legais, para
dar rápida e plena execução às decisões dos seus tribunais, para
salvaguardar os direitos das crianças e para cessar o envio de qualquer
indivíduo para qualquer país onde exista um risco real de tortura ou
outros danos irreparáveis».
Trump acolhe "refugiados brancos" com estatuto de refugiados
O alerta da ONU surge no dia em que um primeiro grupo de 49 afrikaners (sul-africanos brancos, descendentes de colonos holandeses) chegou aos Estados Unidos, com o estatuto de refugiados, ao abrigo da promessa de Donald Trump, de acolhê-los como refugiados por alegada discriminação.
O presidente norte-americano assinou uma ordem executiva que permite aos afrikaners, uma minoria descendente de colonos maioritariamente holandeses, que aleguem sofrer "discriminação racial injusta" pedir asilo nos EUA.