Oposição turca vence eleições municipais. Quem é o principal adversário de Erdogan?

por Inês Moreira Santos - RTP
Tolga Bozoglu - EPA

As eleições autárquicas na Turquia, que decorreram no domingo, são já consideradas um "ponto de viragem" no plano político do país. O partido AKP do presidente turco, Recep Tayyip Erdoğan, foi derrotado pelo principal partido da oposição, Partido Republicano Popular (CHP, na sigla em turco). O chefe de Estado não conseguiu recuperar Istambul e Ancara, mas prometeu "respeitar a decisão da nação" nas urnas. Com a reeleição para a autarquia de Istambul, Ekrem İmamoğlu já está a ser apontado como potencial candidato à Presidência da Turquia nas eleições de 2028. Quem é então o principal opositor de Erdoğan ?

O principal partido da oposição turca, Partido Republicano Popular (CHP, na sigla em turco), reivindicou uma vitória “histórica”, depois de derrotar o AKP nas principais cidades do país, de acordo com os resultados oficiais das eleições autárquicas de domingo. Com uma afluência superior a 77 por cento, o CHP obteve 37,7 por cento dos votos contra 35,5 por cento do AK Parti, depois de contados 99,8 por cento dos votos.

Com o partido de Erdoğan a perder terreno e o próprio a assumir que é um “ponto de viragem”, a situação económica, com a inflação a atingir os 70 por cento, é uma das causas apontadas para a mudança do cenário político. E a oposição acrescenta ainda o descontentamento da população com o que diz serem as políticas autoritárias do atual presidente.

“Não desrespeitaremos a decisão da nossa nação, evitaremos sermos teimosos, agir contra a vontade nacional e de colocar em questão o poder da nação”, afirmou Erdoğan aos jornalistas, na sede da força partidária, o Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), em Ancara, citado pela agência France Presse (AFP). “Infelizmente não obtivemos os resultados que queríamos”.
O principal partido da oposição conseguiu vencer nas maiores cidades da Turquia, incluindo a capital Ancara e Istambul. No total, o CHP venceu em 36 das 81 províncias da Turquia, informou a agência estatal Anadolu. A maior parte do poder regional na Turquia Ocidental está agora pintada de vermelho, a cor do CHP.

Em Ancara, o atual presidente da câmara, Mansur Yavas, foi o primeiro a reivindicar a vitória nas eleições: “As eleições terminaram, continuaremos a servir Ancara e os seis milhões de habitantes, sem discriminação”.

Pouco depois, o presidente cessante da câmara de Istambul, Ekrem İmamoğlu, também do CHP, anunciou a sua reeleição.

“Estamos em primeiro lugar, com um avanço de mais de um milhão de votos (...). Ganhámos a eleição”, afirmou aos jornalistas.
Imamoglu, o principal opositor de Erdoğan

O mapa autárquico alterou-se nas últimas décadas na Turquia, com o AKP - partido conservador islâmico - a dominar o centro e norte do país, enquanto o principal rival CHP - partido social-democrata - prevalece na parte ocidental e mediterrânica. Mas já em 2019, a conquista das câmaras municipais de Istambul e Ancara pelo CHP significou um duro revés para Erdoğan, que centrou o discurso político na reconquista de Istambul. Com 16 milhões de habitantes, sublinhe-se, Istambul é o motor financeiro, social e cultural da Turquia, para além de possuir um valor simbólico para o atual chefe de Estado: Erdogan foi presidente da câmara municipal e foi nesta grande metrópole que iniciou a sua carreira política, num mandato algo turbulento.

Nas eleições de 2019, Imamoglu contou com o apoio em Istambul de dois outros importantes partidos da oposição, o Partido do Bem (IYI) de centro-direita e o Partido Democrático dos Povos (HDP), atualmente Partido da Igualdade e da Democracia (DEM), que representa a esquerda pró-curda do país. Para o escrutínio de domingo passado ambos optaram por apresentar candidatos próprios, apesar de as sondagens indicarem que muitos dos habituais eleitores iriam optar por Imamoglu.

Agora, com a reeleição de İmamoğlu , o presidente cessante de Istambul já está a ser apontado como potencial candidato à Presidência da Turquia nas eleições de 2028, às quais Erdogan não pode teoricamente apresentar-se. A vitória de Ekrem İmamoğlu alimenta mesmo as expetativas no país de que pode tornar-se no futuro líder nacional, uma vez que as eleições autárquicas são vistas como um termómetro tanto do apoio de Erdogan como da durabilidade e força da oposição.

Apesar de serem opositores e apresentarem ideiais políticos distintos, Erdoğan e Imamoglu têm um percurso semelhante. Além de ambos já terem sido presidentes da câmara de Istambul, os dois têm raízes familiares na região oriental do Mar Negro.

Têm outros pontos comuns: tanto Erdogan como Imamoglu já viram as suas carreiras políticas desafiadas por questões judiciais e, quando eram novos, foram ambos jogadores de futebol.
Ideias opostas

Recep Tayyip Erdoğan e Ekrem İmamoğlu partilham de uma forte capacidade para atrair eleitores, mas quando se trata de política divergem. O próprio Imamoglu, um ex-empresário afável, admitiu-o durante a campanha.

"As nossas ideias são em grande parte opostas", afirmou aos jornalistas, citado pelas agências.

Enquanto que Erdoğan entrou na política com um partido islâmico e remodelou o Estado secular com uma visão piedosa desde que assumiu o poder em 2002, Imamoglu pertence ao secularista Partido Popular Republicano (CHP), tendo ingressado em 2008 e tornando-se o líder partidário no distrito de Beylikduzu, em Istambul, há 10 anos.

O sucesso de İmamoğlu, de 53 anos, deve-se à capacidade de ter superado o limite máximo de cerca de 25 por cento de apoio do CHP social-democrata na Turquia e de conquistar os eleitores mais conservadores.

İmamoğlu estudou na Universidade de Istambul, formando-se em Administração de Empresas em 1994, ano em que Erdoğan se tornou prefeito da cidade. Posteriormente, começou uma carreira como empresário ao ingressar nos negócios do setor da construção da família. Muçulmano praticante, mas membro de um partido secular, este antigo empresário do Mar Negro fez fortuna na construção antes de entrar na política.

Casado e pai de três filhos, é conhecido por ter uma personalidade carismática e mediática, pelos óculos de armação fina e pela polémica condenação a dois anos e sete meses de prisão por, alegadamente, "insultar" os membros da Comissão Eleitoral da Turquia.
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