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Parlamento francês adota projeto-lei controverso sobre a imigração
Após meses de controvérsia e ameaças de rebelião no seio da própria maioria presidencial, o texto do projeto-lei que reforma de forma dura as leis da imigração em França, foi adotado por 349 votos a favor e 186 contra.
A lei é contestada pela esquerda em peso devido ao pendor repressivo de diversas das suas medidas, incluindo o fim do acesso aos apoios sociais por parte de imigrantes ilegais ou sem emprego e o fim da naturalidade francesa automática aos filhos de pais estrangeiros nascidos em França.
O texto do projeto-lei agora votado saiu esta tarde de uma Comissão Mista Paritária, composta por sete deputados e sete senadores, e foi anteriormente aprovado pelo Senado por 214 votos a favor e 114 contra, com o grupo macronista a juntar-se na sua maioria aos republicanos e aos centristas e os três grupos da esquerda a oporem-se de forma vigorosa.
No Parlamento, após a aprovação do projeto-lei, o ministro do Interior Gérard Darmamnin, saudou a decisão de um texto "claro" e "duro sobretudo com os delinquentes".
"Estou muito orgulhoso de estar num governo com um presidente que aguentou, que não cedeu", acrescentou.
Durante toda a tarde, a ala esquerda dos macronistas pressionou Emmanuel Macron a desistir da reforma, alegando que esta iria servir os interesses da extrema-direita. Vários deputados da maioria ameaçaram votar contra e três ministros anunciaram a demissão se o texto fosse aprovado.
No final, entre a maioria, 20 deputados do Renaissance votaram contra e 17 abstiveram-se. Cinco deputados do MoDem votaram contra e 15 abstiveram-se, enquanto que no Horizons, apenas dois votaram contra.
Como prometido, os 88 deputados do Rassemblement national de Marine Le Pen, votaram a favor mas o projeto-lei teria passado mesmo sem estes votos, por 261 por e 186 contra, o que permite à maioria e ao governo afirmar que não necessitaram dos votos da extrema-direita para passar a reforma.
A crise política que ameaçou Emmanuel Macron e o executivo durante toda a tarde poderá ter assim sido mitigada mas só nos próximos dias se perceberá se foi ultrapassada.
Marine Le Pen, que assumiu a influência ideológica nacionalista da reforma como sua, anunciou durante a tarde desta terça-feira que o RN iria votar a favor do projeto-lei.
O que inclui o projeto-lei
- O projeto-lei altera as condições de acesso dos imigrantes a prestações sociais não contributivas, como os abonos de família, ajudas de custo de apoio à autonomia, ou direito à habitação. Passa a distinguir entre os que estão, ou não, "em situação de emprego", estabelecendo um período de espera de cinco anos para os que não trabalham e de trinta meses para os restantes.
- O acesso a Ajuda Pessoal para o Alojamento, APL, foi um dos pomos da discórdia. Ficou previsto que o acesso fique dependente de uma permanência de cinco anos em França para os imigrantes que não trabalham e de três meses para os empregados.
- Estudantes estrangeiros, refugiados e titulares de uma carta de residente não são abrangidos por estas novas restrições. Aos estrangeiros que solicitem uma autorização de residência "de estudante" passará a ser pedida uma caução, para cobrir eventuais "custos de afastamento".
- O acesso ao título de residência de "estrangeiros doentes" e à ajuda médica estatal será igualmente mais restrito, não podendo ser acordado, salvo algumas exceções, exceto se o "tratamento apropriado" não existir no país de origem. Se a segurança social francesa considerar que o requerente tem igualmente recursos suficientes para pagar o tratamento, não terá direito à assistência estatal.
- Quanto à regularização da permanência em França, um imigrante sem papéis não poderá pedir uma autorização de residência sem o aval do seu empregador, exceto se as autoridades locais o considerarem essencial para uma atividade económica específica.
- Os outros poderão pedir um visto de permanência de um ano, decidido caso a caso, desde que tenha residido três anos em França e exercido labor assalariado por pelo menos 12 meses dos anteriores 24. Uma restrição "experimental" que só entrará em vigor em finais de 2026.
- Está ainda previsto introduzir quotas imigratórias, a par de um debate parlamentar anual sobre a migração.
- A perda da nacionalidade passa a incluir os detentores de dupla nacionalidade condenados por homicídio voluntário de toda a pessoa representante de autoridade pública.
- Deixa de ser automática a atribuição da nacionalidade francesa aos nascidos em França de pais estrangeiros, tendo de ser pedida entre os 16 e os 18, sendo negada se a pessoa for condenada por violação da lei.
- O projeto-lei recupera ainda a figura de "delito de permanência irregular", penalizado com multa sem detenção.
- Uma das conquistas do governo de Macron neste acordo é a proibição de colocar estrangeiros menores sob detenção.
- Para o reagrupamento familiar, as novas regras irão impor uma permanência mínima em França de 24 meses do requerente, devendo apresentar prova que recursos "estáveis, regulares e suficientes" e dispor de seguro de saúde.