Partidos divergem no parlamento sobre intervenção estrangeira 

por Lusa

As forças políticas de oposição na Assembleia da República moçambicana consideraram hoje uma violação da Constituição a entrada de forças estrangeiras sem um debate parlamentar, mas o partido no poder não vê ilegalidades.

"O Governo violou a Constituição ao ignorar a Assembleia da República, órgão de soberania, sobre a presença de tropas estrangeiras em Moçambique", declarou António Muchanga, deputado da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), principal partido de oposição no país, numa questão de insistência na sessão dedicada a perguntas ao Governo.

Segundo António Muchanga, à luz dos números 1 e 2 do artigo 178 da Constituição, a análise sobre a possibilidade de uma intervenção militar estrangeira em Moçambique deve ser debatida na "casa do povo", sendo competência exclusiva do parlamento discutir o assunto.

"A entrada de tropas estrangeiras é um assunto que atinge o âmago da soberania e é uma questão básica da política interna de um país. Acham correta a irrelevância do parlamento num assunto que diz respeito à soberania do Estado", questionou António Muchanga, lembrando, no entanto, que a Renamo não é contra o apoio de forças estrangeiras no combate contra a insurgência armada em Cabo Delgado, mas é necessário que se respeitem as leis.

Também para o deputado do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) Fernando Bismarques o executivo moçambicano violou a lei por não levar o tema à Assembleia da República, destacando que parte dos países que estão a apoiar Maputo debateram o seu envolvimento no conflito em Cabo Delgado nos seus respetivos parlamentos.

"Esta é a casa da democracia e, do mesmo jeito que as forças estrangeiras que estão presentes comunicaram aos seus parlamentos, era recomendável que o Governo trouxesse este tema ao debate aqui", declarou o deputado da terceira força parlamentar em Moçambique.

"É aqui onde está o povo e nós, como deputados, estamos aqui a representar este povo", frisou Fernando Bismarques.

Por sua vez, a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder, entende não existir qualquer violação na decisão, argumentando que o parlamento só deve ser chamado ao debate em caso de declaração de Estado guerra ou sítio, o que nunca aconteceu desde que as incursões começaram, em 2017.

"A Constituição da República tem dispositivos claros quando se trata de envolvimento da Assembleia da República neste tipo de decisões. O envolvimento do parlamento só é possível quando se trata da declaração de Estado de guerra ou de sítio. Logo, como o país não tratou os ataques terroristas nestas dimensões, o debate não é ao nível parlamentar", declarou Dias Julião Letela, deputado do partido no poder, intervindo durante a sessão.

Desde julho, uma ofensiva das tropas governamentais com o apoio internacional permitiu aumentar a segurança, recuperando várias zonas onde havia presença de rebeldes, nomeadamente a vila de Mocímboa da Praia, que estava ocupada desde agosto de 2020.

Grupos armados aterrorizam a província de Cabo Delgado desde 2017, sendo alguns ataques reclamados pelo grupo extremista Estado Islâmico.

O conflito já provocou mais de 3.100 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED, e mais de 824 mil deslocados, segundo atualizações feitas pelas autoridades moçambicanas.

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