Primeira cimeira tripartida. Israel, EAU e Egito defendem estabilidade regional

por RTP
Cimeira tripartida em Sharm el-Sheik. à esquerda o príncipe herdeiro de Abu Dabi, sheik Mohammed bin Zayed Al Nahyan, ao centro o presidente egípcio Abdel Fattah al-Sisi, e à direita o primeiro-ministro israelita Naftali Bennet Reuters

O impacto económico da guerra na Ucrânia, a necessidade de manter a estabilidade no Golfo e a renovação do acordo sobre o programa nuclear do Irão dominaram a agenda da primeira cimeira tripartida entre Israel, Egito e Emirados Árabes Unidos, a primeira do género desde que os EAU normalizaram relações diplomáticas com Israel em 2020.

Os encontros decorreram no resort de Sharm el-Sheik no Mar Vermelho e juntaram o presidente egípcio Abdel Fattah al-Sisi, o primeiro-ministro israelita Naftali Bennet e o líder de facto dos EAU, o príncipe herdeiro de Abu Dabi, sheik Mohammed bin Zayed Al Nahyan.

A presidência egípcia revelou que os três debateram o mercado energético, a estabilidade comercial e a segurança alimentar, numa altura em que os preços do trigo e do crude sobem a pique devido à guerra na Ucrânia.

O gabinete de Bennet referiu simplesmente que foi abordado o reforço dos laços a todos os níveis durante as conversações, com o Egito e os Emirados a sublinharem “a importância de reforçar a solidariedade árabe face a desafios comuns”, conforme referiu a agência de notícias dos EAU, WAM.

O Egito e Israel mantêm laços desde a subscrição em 1979 de acordos de paz e a semana passada anunciaram um acordo para estabelecer ligações áreas diretas entre Tel Aviv e Sharm el-Sheik. Em setembro de 2021 Bennet deslocou-se ao Cairo, na primeira visita de um primeiro-ministro israelita ao Egito em mais de uma década.

Israel, os Emirados Árabes Unidos e o Bahrain assinaram por seu lado em 2020 acordos históricos de normalização das relações diplomáticas, económicas e científicas, com o objetivo de criar um eixo regional contra a influência iraniana.

Bennet visitou Abu Dabi em dezembro de 2021, na primeira deslocação de um líder israelita após os acordos.
Preocupados com o Irão
A cimeira começou segunda-feira, quando ocorreram encontros bilaterais de al-Sisi com Zayed Al Nahyan e com Naftali Bennet.

Na sua reunião os líderes do Egito e dos EAU falaram sobre investimentos financeiros mútuos, com al-Sisi a sublinhar o seu empenho em manter a segurança da região do Golfo e a “rejeição de quaisquer atos que procurem desestabiliza-la”, referiu o comunicado presidencial.

A reintegração da Síria no mundo árabe também terá sido abordada, depois de Abu Dabi ter recebido na semana passada o presidente Bashar al-Assad na sua primeira visita a um país árabe desde o eclodir da guerra no país em 2011. Al Assad é contudo considerado próximo de Teerão e terá recebido auxílio militar não só iraniano como por parte da milícia xiita libanesa do Hezbollah, dois inimigos de Israel.

Nenhum detalhe foi referido sobre a reunião entre Bennet e al-Sisi.
Israel, Egito e Emirados Árabes são os três aliados e parceiros dos Estados Unidos mas integram um eixo emergente israelo-árabe que procura contrabalançar a influência iraniana na região do Golfo e incertezas quanto ao apoio norte-americano nos seus problemas regionais.

A anunciada possibilidade de renovação do acordo internacional de 2015 com Teerão sobre o programa nuclear iraniano, o JPCOA, foi por isso debatida com preocupação pelos parceiros, para quem o regime islamita dos Ayatolas se mantém uma ameaça.

O primeiro-ministro israelita criticou domingo os esforços de reavivar o JPCOA “a qualquer custo”. Para o primeiro-ministro israelita o novo Plano de Ação Conjunto é mais fraco do que o original e irá levar a um Médio Oriente mais violento. Bennet apelou os Estados Unidos a não cederem ao pedido de Teerão para remover os Guardas da Revolução da lista negra das organizações terroristas em troca de “promessas ocas”.

Os países do Golfo foram por seu lado excluídos das conversações sobre o pacto, e contestam-no como incompleto, por não abranger o programa de mísseis do Irão e as forças regionais que defendem por procuração os interesses iranianos, como as milícias Houthi que combatem no Iémen e que têm atacado, com mísseis e drones, alvos tanto nos Emirados como na Arábia Saudita.
Unidos apesar dos EUA
O desacordo quanto à questão iraniana e à guerra no Iémen tem agravado a tensão entre o Egito e os Emirados com os Estados Unidos, com os dois primeiros a recearem o regresso do Irão à comunidade de exportadores de petróleo em caso de acordo no nuclear com Washington. “Vemos alguns dos principais aliados dos EUA na região descontentes com a liderança da Administração Biden”, considerou o analista político dos Emirados, Abdul Khaled Abdullah. “Para eles, unirem-se e falarem a uma só voz… poderá ter impacto”.

Khaled Okasha, líder do Centro de Estudos Estratégicos do Egipto, referiu que o encontro entre Bennet e al-Sisi deverá ter focado o impacto da Guerra na Ucrânia e a importância de “manter segura a área do Golfo e garantir que não é ameaçada de forma consistente pelo Irão”.

“Vemos claramente o reforço de um eixo que propõe uma outra narrativa no Médio Oriente, de que podemos trabalhar juntos e cooperar em questões económicas e de defesa”, comentou por seu lado à rádio Khan o vice-ministro israelita dos Negócios Estrangeiros, Idan Roll.

“Israel está interessado em construir uma boa parceria com quem for possível contra o eixo radical do Irão”, acrescentou Roll.
JPCOA a renascer
O regresso pleno iraniano à comunidade internacional apesar da oposição da maioria dos países árabes e de Israel parece ganhar força.

O Irão tem negociado a renovação do JPCOA diretamente com a China, a França, a Alemanha, a Rússia e o Reino Unido e bilateralmente com os Estados Unidos. Na semana passada os negociadores, iranianos referiram que faltava apenas chegar a acordo em dois pontos para restaurar o JCPOA.

Os Estados Unidos confirmaram que o novo acordo poderá estar para breve, com o  porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, Ned Price, a referir a 16 de março que “as questões remanescentes podem ser ultrapassadas”.

Fontes próximas das negociações revelaram que o Irão pretende “garantias económicas” caso uma futura Administração norte-americana decida mudar de rumo e denunciar o documento, à semelhança do que fez Donald Trump em 2018.

Teerão quer ainda que Washington retire o Corpo dos Guardas da Revolução Islâmica do Irão da lista de “grupos terroristas”.
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