Quase 800 estátuas de Chiang Kai-shek vão desaparecer em Taiwan

por Carla Quirino - RTP
Estátua de Chiang Kai-shek em Taipé Imagem do Shutterstock

O Governo de Taiwan prometeu remover todas as estátuas que existem em espaço público dedicadas a Chiang Kai-shek, falecido em 1975. Este anúncio é visto como uma tentativa de apagar o legado do ditador e a ligação histórica com a China. O histórico dirigente governou a ilha durante quase três décadas, até à morte, submetendo-a a um regime autoritário.

Chiang Kai-shek foi um ditador militar chinês que governou a ilha de Taiwan durante quase 30 anos, sob lei marcial. Ao longo desse tempo foram erguidas mais de 760 estátuas dedicadas a Chiang nas ruas e praças do território. Agora estão prestes a desaparecer.

Em 2018, o Executivo de Taiwan, liderado pelo Partido Democrático Progressista, criou um comité de justiça transicional para investigar a governação do antigo general, que foi presidente da República da China e Taiwan até 1975.

Desta avaliação saíram várias recomendações. Uma delas concentra-se na remoção das muitas estátuas de Chiang Kai-shek espalhadas pelos espaços públicos. Um parque no norte de Taipé é famoso pelas milhares de imagens de Chiang dispostas ao redor do local.

Esta segunda-feira, o funcionário do Governo, Shih Pu, avançou que o Ministério do Interior está a preparar-se para retirar pelo menos 760 estátuas do ditador.

Perante as críticas à demora para aplicar a medida decidida em 2018, Shih explicou que “os militares, em particular, demoraram a aceitar os subsídios fornecidos como incentivo para remover as estátuas”.

“O Ministério da Defesa disse que precisa levar em conta a tradição militar”, acrescentou o funcionário, citado no diário britânico The Guardian.

Esta argumentação vai ao encontro da declaração do ministro da Defesa de Taiwan, na semana passada, que justificou a demora com a “tradição militar da República da China homenagear Chiang, que fundou as academias de treino na China e depois em Taiwan e considerava os locais militares propriedade privada”, citou o South China Morning Post.
Legado de Chiang: o ditador que defendia “Uma China”

Estes avanços e recuos na decisão sobre o que fazer com as estátuas do ditador assentam num debate que polariza opiniões.

Se o Partido Democrático Progressista, no poder, defender o afastamento dos tributos ao militar, o Partido KMT de Chiang – agora na oposição – acusa o Governo de querer apagar a história, especificamente o legado deste antigo presidente.

Alguns outros dizem ainda que a atual luta de Taiwan deve ser comparada aos sucessos de Chiang. Ou seja: o ditador supervisionou o caminho de Taiwan para a prosperidade económica, lutou contra os comunistas e os japoneses e fundou as academias militares de Taiwan, observa o jornal britânico.

Chiang Kai-shek apoiou a “Política de Uma China”, um eufemismo estratégico chinês que nega a Taiwan o direito de existência soberana.

No final da guerra civil da China, em 1949, Chiang, o partido KMT (Kuomintang) e milhões de apoiantes fugiram para Taiwan, depois de derrotados no continente.

O militar estabeleceu o Governo da República da China no exílio e conduziu a população de Taiwan sob uma lei marcial durante décadas até sua morte em 1975. O poder foi transferido para o filho, que manteve o regime autoritário até 1987. No final da lei marcial, estimava-se que cerca de 140 mil pessoas tinham sido presas e outras três a quatro mil executadas por demonstrarem oposição ao KMT.

O Partido Democrático Progressista, que defende a soberania de Taiwan, foi acusado de tentar o corte com a China, ao apagar a assimilação cultural, caso se desvaneça a memória de Chiang. O KMT, para além de defender os laços históricos e culturais de Taiwan com a China, sublinha que “é muito importante que o atual Governo contemple mais a memória histórica dos vários grupos de pessoas”, ao invés de “impor a ideologia”.
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