Quem é Theresa May, a nova inquilina de Downing Street?

por Andreia Martins - RTP
Theresa May esteve em Downing Street na véspera da tomada de posse Neil Hall - Reuters

Até aqui foi ministra do Interior no Reino Unido e agora deverá ser ela a liderar os destinos do país após o referendo que ditou a saída da União Europeia. Apoiou a campanha pela permanência, ao lado de David Cameron, mas agora quer alcançar “o melhor acordo possível com Bruxelas”.

Via aberta para Theresa May. Depois da votação na semana passada que ditou o afastamento de Michael Gove da corrida à liderança do Partido Conservador, a desistência de uma das candidatas na segunda-feira ditou a substituição imediata de dirigente do partido, que tem agora a porta aberta do número 10 de Downing Street.A tomada de posse enquanto primeira-ministra deverá acontecer já amanhã, dia 13 de julho.

Na votação entre os membros do partido, Gove conseguiu apenas 46 votos, enquanto Andrea Leadsom, antiga ministra da Energia, reuniu 84 votos. Em primeiro ficou Theresa May, com 199 votos. Agora a candidata adversária de May, Andrea Leadsom, decidiu desistir abruptamente da sua candidatura.

“As empresas precisam de certezas. Devemos ter um Governo forte e unificado, que se mova rapidamente e defina um novo quadro de um Reino Unido independente”, disse a antiga ministra da Energia, que justifica a decisão como tendo sido “a melhor” para o país.

Sem adversários na contenda pela liderança dos tories e sem necessidade de uma longa campanha que se previa para as próximas nove semanas, desenha-se agora a rápida ascensão ao cargo de primeira-ministra, que deverá tomar posse já esta quarta-feira. Será a segunda mulher no cargo de primeira-ministra britânica, depois de Margaret Thatcher, entre 1979 e 1990. E pelo que se pode ler na imprensa do país Theresa May partilha muitos traços políticos - e pessoais - com a Dama de Ferro.

Para já, a desistência de Leadsom e a rápida mudança na liderança do Partido Conservador animou os mercados. A libra britânica cresceu 1,2 por cento em relação ao dólar norte-americano esta terça-feira, o que representa a maior subida desde o referendo que ditou a saída do Reino Unido da União Europeia, no passado dia 23 de junho. Em relação ao euro, a moeda britânica também cresceu de forma significativa.

“A clareza quanto à liderança do Reino Unido foi um fator que impulsionou o apetite dos investidores”, disse um analista da FXTM à agência Reuters. Mas, avisam, permanece a grande questão de quando será invocado o artigo 50, sendo incerto como os mercados vão reagir à invocação efetiva do mesmo.
Carreira política
Theresa May nasceu em Eastbourne, Sussex, a sul de Londres. Tem 59 anos e formou-se em Geografia na Universidade de Oxford, em 1977. Mudou de rumo e enveredou pela carreira financeira no Banco de Inglaterra, onde trabalhou entre 1985 e 1997.

Começou a carreira política no conselho local de Merton, em Londres, onde esteve entre 1986 e 1994. Três anos depois, nas eleições legislativas de 1997, chegou pela primeira vez ao Parlamento, na altura deputada conservadora eleita por Maidenhead. May entrava para a casa da democracia britânica num momento difícil para o seu partido, já que a vitória dos trabalhistas, liderados por Tony Blair, ditou nesse ano o ponto final em 18 anos de liderança dos tories.

Na oposição ao Governo, Theresa May destacou-se rapidamente com um papel proeminente no partido. Focou-se em especial nas pastas da Educação, Emprego, Trabalho e Segurança Social. Foi entretanto ministra do Interior de David Cameron no primeiro e no segundo mandatos. Entre 2010 e 2012 acumulou também as funções de ministra da Mulher e da Igualdade.

A mulher que deu os primeiros passos na política enquanto Margaret Thatcher liderava os destinos do Reino Unido parece ter muitos pontos em comum com a Dama de Ferro. Ken Clarke, um histórico do Partido Conservador que já foi chanceler e ministro do Interior, descreve May como “uma mulher muito difícil”, num vídeo captado pela Sky News.


Em entrevista ao diário The Telegraph, a futura primeira-ministra capitalizou o comentário de Clarke: “Precisamos de mulheres muito difíceis. Já tivemos uma a dirigir o país, no passado. Agora precisamos de outra”, prometendo levar essa resiliência para as negociações com Bruxelas.

A frieza e tenacidade da futura líder britânica poderão também ser atribuídas a uma vida pessoal de dificuldades. Nasceu no seio de uma família abastada e confortável em termos financeiros, que lhe permitiu frequentar as melhores escolas. Mas de forma abrupta, após a conclusão dos estudos, viu morrer os pais no espaço de um ano e descobriu que não poderia ter filhos. É casada com o gestor financeiro Philip May desde 1980.
Convicções
No jornal The Guardian, antigos colegas de May dizem que ela “pode ser irritante” e “alguém difícil com quem trabalhar”. A primeira-ministra designada também é comparada a Gordon Brown, que assumiu a liderança do Governo trabalhista em 2007, em condições semelhantes às de Theresa May. Mas não só. É que a candidata guia-se “mais pela moral do que pela ideologia, por um sentimento muito pessoal da injustiça, do que é certo e do que é errado”.

Talvez por isso se tenha destacado durante a liderança de Cameron pela mão pesada que teve em casos de corrupção na Polícia, a qual ameaçou com cortes no financiamento de 190 mil libras anuais.

O braço de ferro em 2014 exigia às forças policiais reformas urgentes, que seriam impostas pela lei. Já este ano, a antiga ministra do Interior atacou os gastos orçamentais “questionáveis e opacos” por parte da polícia britânica.


Para além da política, Theresa May sempre se destacou pelos sapatos coloridos e originais. Não faltam fotogalerias do assunto na internet. "São precisos dois homens para calçarem os sapatos de uma mulher" é uma das suas frases mais conhecidas. Foto: Paul Hackett - Reuters

Durante a campanha antes do referendo, Theresa May foi pouco interventiva. Há um enorme vazio no que diz respeito à opinião da futura primeira-ministra britânica em assuntos de grande relevância, nomeadamente os que se relacionam com o Brexit. As convicções de May poderiam ter sido escrutinadas durante a campanha à liderança do Partido Conservador, mas a abrupta designação para o cargo de primeira-ministra coloca em Downing Street alguém com posições incertas e até contraditórias.

É que Theresa May já assumiu uma orientação liberal em questões de discriminação racial e votou a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo. São conhecidos vários discursos em que denuncia a disparidade salarial entre homens e mulheres.

No discurso de segunda-feira, quando assumiu a liderança do Partido Conservador, May prometeu “estar absolutamente ao serviço dos trabalhadores”, numa linha que lhe é conhecida de grande apoio aos diretos dos trabalhadores.
Política migratória
Num país onde a política migratória tem um enorme peso eleitoral, a atuação de May foi amplamente criticada por não ter sido alcançada uma redução nos números da imigração, prometida por David Cameron. É precisamente na imigração, tema central na votação do Brexit, que estão as visões mais conservadoras de Theresa May.

Uma das políticas mais polémicas que promoveu nos últimos anos para reduzir os números da imigração dentro da União Europeia foi a imposição da lei que impede que cidadãos britânicos consigam trazer o companheiro ou companheira para o Reino Unido, a menos que auferiram menos de 18.600 libras anuais. Várias famílias procuram atualmente reverter a lei no Supremo Tribunal de justiça.

Sobre o processo de saída da União Europeia, que vai liderar a partir de quarta-feira, Theresa May é perentória e não quer pensar em voltar atrás ou questionar a validade do voto.

“Brexit significa Brexit e vamos ser bem sucedidos. Não haverá qualquer tentativa de permanecer na União Europeia. Não haverá segundo referendo. O país votou para sair, por isso vamos sair”, reiterou.
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