Quinhamel, o "ex-libris" da panaria guineense
Os habitantes da pacata vila de Quinhamel, interior norte a 25 quilómetros da capital guineense e símbolo das ostras, tiveram hoje um dia que tarde ou nunca vão esquecer: abriu um centro artesanal de tecelagem de panos.
O secular ofício de tecelagem de panos está para os habitantes de Quinhamel como o fabrico de queijo está para os açorianos. Ofício reservado aos homens e rapazes da etnia papel, todos, ou quase todos, na zona da região de Biombo fazem desse trabalho o seu ganha-pão.
O problema, como reconheceram à Agência Lusa os tecelões Paulo Djú e Ndaus Té, é que toda a tecelagem que faziam até aqui se resumia à venda em pequenas remessas para o Senegal ou a alguns turistas que visitam a Guiné-Bissau.
Mariana Ferreira, cidadã romena casada com um guineense e a viver na Guiné-Bissau vai para mais de 20 anos, é a grande obreira da provável mudança de vida dos habitantes de Quinhamel.
Insistente, Mariana, formada em Belas Artes pela Universidade de Bucareste, deitou mãos à obra, batendo portas, pedindo apoios para transformar o ofício secular de subsistência dos de Quinhamel para produzir "arte vendível no mercado justo".
Na busca de financiamento para a construção de raiz da fábrica de tecelagem hoje baptizada pelo primeiro-ministro guineense, Carlos Gomes Júnior, com o nome "Artissal", Mariana disse à Lusa ter recebido "muitas negas e algumas reticências".
"Ninguém acreditava na viabilidade de um projecto dessa natureza", lembrou, sublinhando logo que a única instituição internacional que lhe quis dar "ouvidos e apoios concretos" foi a cooperação portuguesa.
Sensibilizado pelos insistentes pedidos da Mariana, sobretudo pela argumentação apresentada para justificar a razão de ser do projecto, combate à pobreza e ao desemprego na Guiné-Bissau, o Ministério da Solidariedade Social português, através da Direcção- Geral de Cooperação, e tendo Lucília Figueira a liderar as acções, decidiu avançar com parte da verba cujo valor a empresária se recusa a adiantar.
"Não lhe vou dizer quanto é que recebi da Cooperação portuguesa mas digo-lhe apenas que gastámos 11 mil euros para a construção de raiz deste centro de tecelagem. Não interessa o valor, mas sim o gesto", disse Mariana.
Como sublinhou, "apenas uma forma de retribuir a atenção da Cooperação portuguesa", Mariana convidou a directora dos Serviços de Cooperação do Ministério da Solidariedade Social português a ser "a madrinha" do "Artissal", dando-lhe "a honra" de inaugurar formalmente a fábrica, mesmo na presença do primeiro-ministro e da "primeira-dama" da Guiné-Bissau.
No seu discurso, carregado de alguma emoção, Mariana Ferreira sublinhou ser esta o dia mais feliz da sua vida, isto porque, afirmou vai ajudar a mudar a vida dos habitantes da zona de Quinhamel e, ao mesmo tempo, combater a pobreza, quase endémica naquela zona da Guiné- Bissau.
Numa primeira fase, a "Artissal" dará emprego directo a 21 pessoas, 16 rapazes e cinco mulheres, havendo a possibilidade de a fábrica vir a ser ampliada.
Por seu turno, e em nome do Ministério português da Solidariedade Social, Lucília Figueira, com um pano da nova fábrica à cintura, frisou que a Cooperação portuguesa se sente "feliz pelo gesto", embora tenha disponibilizado poucos fundos para o apoio ao projecto.
Também visivelmente contente, o primeiro-ministro guineense disse aos jornalistas que agradece "de fundo do coração" o "gesto" de Portugal para com a Guiné-Bissau, sublinhando que a fábrica hoje inaugurada vai contribuir para o combate ao desemprego na região e consequentemente aliviar o governo.
Mas a alegria de Carlos Gomes Júnior não ficou por aqui, já que, como o próprio frisou, os panos que vão sair da "Artissal" serão uma espécie de "cartão de visita" da nova imagem da Guiné-Bissau.
"Sabemos que todo o mundo aprecia a qualidade dos panos da Guiné-Bissau. É mais um cartão de visita do nosso país além fronteiras", acrescentou o chefe do governo guineense.