Rússia e Estados Unidos traçam metas para reduzir ogivas

Os presidentes dos Estados Unidos e da Rússia assinaram esta segunda-feira um acordo de base para reduzir os respectivos arsenais nucleares no quadro de um futuro tratado de substituição do START 1, firmado em 1991. Barack Obama e Dmitry Medvedev dizem ter relançado as relações, mas mantêm divergências de fundo sobre a proliferação multipolar de armamento.

RTP /
"O Presidente Medvedev e eu estamos empenhados em deixar para trás a suspeição e a rivalidade do passado", disse Obama Anastasia Maltseva, EPA

O instrumento que deverá render o Tratado de Redução de Armas Estratégicas (START 1) vai enquadrar o abate dos arsenais de ogivas nucleares dos Estados Unidos e da Rússia para um número entre 1.500 e 1.675. Ao mesmo tempo, prevê-se um corte no número de "veículos estratégicos de entrega" para um intervalo entre 500 e 1.100. A redução terá de ser concretizada no espaço de sete anos, após a assinatura do novo tratado. Washington e Moscovo comprometem-se a substituir o START 1 até 5 de Dezembro, data em que expira o articulado do tratado de 1991.

O acordo de base para a redução das mais de 2.200 ogivas - 95 por cento da soma mundial de armas nucleares - que as estruturas militares russas e norte-americanas mantêm operacionais serve de ponto de partida para aquilo que Dmitry Medvedev e Barack Obama dizem ser o momento fundador de uma nova era das relações internacionais. Ainda assim, a fasquia acertada entre os muros do Kremlin traduz-se, na prática, em apenas 25 ogivas nucleares abaixo do intervalo de 1.700 a 2.200 previsto para 2012 na letra do Tratado de Moscovo (SORT), selado há sete anos. Ao contrário do SORT, o START detalha mecanismos de verificação das reduções de armamento, uma disposição que constará do próximo tratado.

"Demos passos importantes para aumentar a segurança nuclear e para parar a proliferação de armas nucleares", assinalou o Presidente dos Estados Unidos. Ladeado pelo anfitrião russo, Barack Obama garantiu que o futuro "acordo legalmente vinculativo vai ser completado até ao fim do ano".

Divergências dão lugar a "discussão franca"

O esforço de aproximação é também ilustrado com um gesto do Kremlin, que se compromete a autorizar a passagem gratuita pelo espaço aéreo russo de 4.500 voos anuais dos Estados Unidos com destino ao Afeganistão, um salvo-conduto que permitirá aos norte-americanos poupar 133 milhões de dólares por ano. De permeio surgem compromissos de cooperação militar e um acordo para a ressurreição de um painel governamental conjunto instituído na década de 90 - a comissão Gore-Chernomyrdin, tutelada, à data, pelo vice-presidente norte-americano Al Gore e pelo então primeiro-ministro russo Viktor Chernomyrdin - e negligenciado a partir do primeiro mandato de George W. Bush na Casa Branca.

No entanto, como o próprio Presidente norte-americano reconhece, "em algumas áreas" Washington e Moscovo ainda não conseguem ir além de "uma discussão franca". É o caso do sistema de defesa contra mísseis balísticos arquitectado no Pentágono. É também o caso da geografia dos interesses estratégicos de Moscovo, que continua a fazer do Cáucaso Meridional um exemplo do primado russo.

Nas vertentes mais acidentadas, o entusiasmo nas declarações de Obama e Medvedev aparece temperado pelas fórmulas da diplomacia. Se o Presidente russo reconhece que Moscovo e Washington continuam a divergir numa "gama de posições", o homólogo norte-americano recusa-se "a fingir que os Estados Unidos e a Rússia estão de acordo em todos os assuntos". A começar pela resistência da Rússia de Dmitry Medvedev e do poderoso primeiro-ministro Vladimir Putin à ideia de aceitar a instalação de componentes de um escudo defensivo de assinatura norte-americana na Polónia e na República Checa. Na hora de fazer o balanço das conversações em Moscovo, o Presidente russo deixou claro que a "configuração da defesa global contra mísseis" terá de resultar de uma reflexão conjunta.

Nos temas em que não podem mostrar sinais de convergência, os interlocutores de Moscovo limitam-se a dar conta de "discussões francas". No Kremlin, a Geórgia esteve no centro de uma dessas conversas, segundo o Presidente dos Estados Unidos: "Por exemplo, tivemos uma discussão franca sobre a Rússia, quero dizer a Geórgia, e reiterei a minha convicção de que a soberania e a integridade territorial da Geórgia têm de ser respeitadas".

"Enquanto trabalhamos sobre as nossas divergências quanto ao curso da Geórgia, concordamos que ninguém está interessado em renovar conflitos militares", acrescentou Barack Obama.

"Medvedev é o Presidente e Putin é o primeiro-ministro"

Depois de saudar o que considera ser a aproximação russa às posições dos Estados Unidos sobre a "guerra global contra o terrorismo", a que somou os espinhos diplomáticos relativos aos regimes do Irão e da Coreia do Norte, o Presidente norte-americano não se furtou a falar da distribuição do poder político na Rússia.

Barack Obama procurou retirar crédito a leituras que tendem a reduzir Dmitry Medvedev à condição de uma mera marioneta de Vladimir Putin: "O meu entendimento é que o Presidente Medvedev é o Presidente e que o primeiro-ministro Putin é o primeiro-ministro e que eles distribuem o poder de acordo com a forma de governo da Rússia, da mesma forma que nós distribuímos o poder nos Estados Unidos".

"A minha forte impressão é a de que o Presidente Medvedev e o primeiro-ministro Putin estão a trabalhar juntos de uma forma muito eficaz e o nosso interesse passa por trabalhar com o Governo russo como um todo, de modo a obter a relação bilateral melhorada que julgo poder ser alcançada", concluiu Obama.

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