Pyongyang nunca irá trocar as suas armas nucleares por ajuda internacional, já que a sua defesa nacional é a maior prioridade, defendem altos responsáveis do Partido Comunista norte-coreano. O próximo presidente sul-coreano poderá igualmente ser o candidato que defende o reforço do armamento, incluindo o nuclear, com o argumento da dissuasão.
“Desde a invasão da Ucrânia, cresce entre os quadros norte-coreanos a convicção de que PyongYang nunca poderá abandonar as suas armas nucleares”, referia esta quarta-feira o Daily NK, um jornal baseado na Coreia do Sul com importantes fontes no território norte da península.
Acreditam que, se não fosse o seu arsenal, já teriam sofrido o destino da Ucrânia, num primeiro sinal de nervosismo com a decisão da Rússia.
Um alto responsável norte-coreano considerou que a Ucrânia nunca teria sido atacada se continuasse na posse do arsenal nuclear herdado da União Soviética. Outro referiu que só as armas atómicas da Coreia do Norte têm evitado ataques.
Um alto responsável norte-coreano considerou que a Ucrânia nunca teria sido atacada se continuasse na posse do arsenal nuclear herdado da União Soviética. Outro referiu que só as armas atómicas da Coreia do Norte têm evitado ataques.
Também a Coreia do Sul, à beira de eleger um novo presidente e tendo
em vista o que sucedeu à Ucrânia, poderá seguir o caminho de reforço ou
desenvolvimento das suas armas nucleares, em detrimento do diálogo e da negociação privilegiados nos anos mais recentes.
O candidato do partido no poder em Seul defende o diálogo com vista à paz, com o da oposição a crer que só uma Coreia do Sul fortalecida na capacidade defensiva poderá deter pretensões hegemónicas do vizinho do norte.
A guerra russa parece assim ter dado o golpe de misericórdia em quaisquer projetos de desnuclearização global, lamentou Lee Yang-goo, ex-embaixador da Coreia do Sul para a Ucrânia, reconhecendo que o regime norte-coreano nunca esteve realmente interessado em tal.
“Ao ver as cenas do que se passa na Ucrânia, Pyongyang irá solidificar os seus argumentos internos e externos para justificar a sua posse de armas atómicas”, afirmou ao Daily NK.
“Agora, depois desta crise, será difícil a qualquer país convencer a Coreia do Norte a desnuclearizar”, acrescentou. “Os norte-coreanos pensam que as armas nucleares são as salvadoras da pátria”.
Os sul-coreanos poderão estar a ficar convencidos do mesmo.Nervosismo
A Ucrânia assinou em 1994 o Memorando de Bucareste no qual entregou 1600 ogivas nucleares estacionadas no território sob o domínio soviético. No
acordo, os outros subscritores [Federação Russa, Reino Unido e Estados Unidos] deram garantias de que a integridade e soberania
política ucranianas seriam respeitadas, sem que as suas armas fossem
usadas contra o país exceto em caso de defesa.
Os acontecimentos de há oito anos e a recente invasão mostraram aos coreanos que a palavra dada em 1994 pelos russos de nada valeu aos ucranianos. Já em 2003, a desnuclearização da
Líbia fora também olhada com desconfiança em Pyongyang, com a invasão por parte
da NATO em 2011 e a consequente morte de Muammar Kadafi, o líder líbio, a
confirmarem os seus receios.
“A
Coreia do Norte está cada vez mais agarrada ao seu arsenal nuclear
desde a crise na Ucrânia” afirmou o artigo do Daily NK. “O consenso
entre os altos quadros da Coreia do Norte é que a crise ucraniana
começou quando Kiev abdicou do seu arsenal nuclear”.
Oficialmente a Coreia do Norte responsabiliza os Estados Unidos pela invasão da Ucrânia, ao apoiar as pretensões desta à entrada na NATO e à adesão da União Europeia, contra os interesses russos. O país foi mesmo um dos únicos cinco votos na Assembleia Geral das Nações Unidas a alinhar com a Rússia contra uma resolução a condenar a invasão.Corrida coreana ao nuclear
Nas últimas semanas tem-se verificado atividade no local de testes de Punggye-ri, encerrado oficialmente em 2018 após as últimas detonações efetuadas por Pyongyang em 2017.
A Agência Internacional de Energia Atómica (IAEA) das Nações Unidas, reportou segunda-feira igualmente atividade na central nuclear norte-coreana de Yongbyon, a qual produz material para armas atómicas. A 27 de fevereiro, Pyongyang testou um míssil de cruzeiro integrado no
desenvolvimento do seu sistema de reconhecimento satélite.
Sinais que apontam o provável agravamento da corrida às armas nucleares na Península Coreana.
A maioria dos observadores acredita que o exemplo ucraniano leve a política de diálogo, recentemente defendida e procurada pelo presidente
sul-coreano Moon Jae-in
a desvanecer-se completamente sem ter alguma vez produzido
resultados concretos de desnuclearização.
Também a política de sanções internacionais se mostrou incapaz de reverter a opção nuclear norte-coreana e agora deverá ser ainda mais inútil.
Para março e abril, os Estados Unidos e a Coreia do Sul têm planeados exercícios militares conjuntos e a Coreia do Norte poderá aproveitar para testar o seu míssil balístico intercontinental (ICBM) Hwasong-15, uma vez que o líder norte-coreano Kim Jong-Un afirmou não se sentir obrigado pela moratória quanto a testes nucleares e de ICBM.
O teste ICBM poderá assinalar também a posse em maio do novo presidente sul-coreano.
O teste ICBM poderá assinalar também a posse em maio do novo presidente sul-coreano.
Em 2017 os testes nucleares e balísticos valeram à Coreia do Norte o reforço das sanções internacionais apoiado unanimemente pelos
membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que
incluem a Rússia.
Novas sanções serão
menos prováveis, sobretudo com a Rússia ela própria sancionada
devido à guerra na Ucrânia. Em janeiro último tanto a China como a
Rússia bloquearam sanções a cinco norte-coreanos responsáveis pelo desenvolvimento de armas de destruição maciça e de mísseis balísticos e é
expectável uma resposta semelhante nos próximos meses.
Nuclear sul-coreano
A
questão irá ser herdada pelo próximo presidente da Coreia do Sul, com os
dois principais candidatos a adotarem diferentes estratégias quanto ao
vizinho do norte e ao próprio programa militar. As suas propostas poderão também ser determinantes na
eleição, sobretudo se os eleitores sul-coreanos forem influenciados por
receios de um conflito nuclear devido à guerra na Ucrânia.
Lee
Jae-myung, do Partido Democrático no poder, pretende prosseguir os
esforços de diálogo do antecessor, com um endurecimento se as tensões militares
escalarem na Península Coreana.
O seu
rival, Yoon Suk-yeol, do Partido Poder do Povo, líder da oposição,
não pretende dialogar com Kim Jong-un e irá pugnar pelo reforço das
capacidades militares do país como fator de dissuasão das ameaças
norte-coreanas e pela cooperação militar com os Estados Unidos.
Depois dos Estados Unidos terem recusado publicamente a
eventualidade avançada por Yoon de reintroduzir armas nucleares
norte-americanas na Coreia do Sul, e dado os recentes desenvolvimentos
na Ucrânia, será provável que um número crescente de sul-coreanos venha a
apoiar investimentos no desenvolvimento e produção de armamento atómico
próprio, a par de mísseis balísticos.