Xadrezista iraniana retirou hijab durante torneio "por respeito aos que protestam nas ruas"

por RTP
Reuters

Em dezembro do ano passado, Sara Khadem esteve no Cazaquistão para participar num torneio de xadrez. Numa altura de sobressalto social no Irão, a jogadora iraniana decidiu tirar o lenço com que cobria a cabeça, imagem que correu mundo. Agora, em declarações ao Guardian, Sara Khadem explicou que não queria continuar a cobrir a cabeça porque sentia que estava a trair aqueles que há meses protestavam nas ruas após a morte de Masha Amini.

Jogadora de xadrez, Sara Khadem tem 25 anos e é o número 17 do ranking feminino do circuito e sabia das consequências de retirar o hijab [lenço que cobre a cabeça e esconde os cabelos] durante os jogos de um torneio. Muitos viram a decisão de Khadem como um sinal de apoio aos protestos que ocorriam no Irão após a morte de Mahsa Amini às mãos da polícia da moralidade.

A jogadora e o marido, o realizador Ardeshir Ahmadi, viram naquela situação um ponto de viragem nas suas vidas, já que desde o nascimento do filho em 2022 ponderavam sair do Irão para um país mais seguro.

Uma decisão em muito apressada pela decisão de Khadem de não usar o hijab em público. Depois de dizer ao marido que não queria usar o lenço, Ahmadi apoiou a decisão e disse que o casal e o filho poderiam ir para Espanha, o que acabou por acontecer no início de janeiro, um processo facilitado pelo estatuto de atleta de elite que Khadem tem.

“Ouvi rumores que fizemos isto para conseguir asilo e para nos mudarmos para Espanha. Quero ser clara que não usámos nenhuma desculpa política para nos mudarmos porque não necessitamos dela”.

Sara Khadem é a quinta jogadora de xadrez iraniana a sair do país depois de tomar a decisão de não usar o hijab. No Irão, os protestos continuam e estima-se que perto de 20 mil pessoas tenham sido presas, havendo conhecimento da execução de pelo menos quatro pessoas. A Human Rights Activists do Irão pensa que mais de 500 pessoas morreram durante confrontos com as autoridades.

Apesar de a xadrezista não ter dado um significado político à mudança para Espanha, Teerão não viu a situação dessa maneira e houve uma tentativa de saber onde a família ia instalar-se. Khadem e o marido tentaram manter a sua localização secreta e Sara Khadem disse que apenas ela tem explicações a dar sobre o sucedido e “não a sua família”.

No novo país de residência, o casal tenta manter um perfil discreto mas o marido lembra que “o que ela fez não é tido como uma atitude política em muitos países, mas no Irão tudo é político”.

Também Ahmadi já esteve detido, em 2014, durante três meses na prisão de Dastgerd, onde terão sido conduzidas algumas das execuções por enforcamento dos manifestantes detidos nesta onda de manifestações. O realizador acredita que a detenção aconteceu após ter realizado um documentário sobre uma banda alternativa.

Em declarações a The Guardian, o casal disse que, após a pandemia e o nascimento do filho, quer agora deixar o passado para trás e assentar em Espanha para reconstruir a carreira de Khadem no xadrez.

Apesar de ter saído do Irão, Khadem pretende, no entanto, continuar a representar o país em torneios internacionais: “A decisão que tomei em Almaty foi pessoal. Por isso, quando regressar ao Irão, e tenho a certeza de que vou regressar, irei responder a todos aqueles que me perguntarem quais foram os meus sentimentos”.
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