De estado de emergência a estado de calamidade: o que muda

por Graça Andrade Ramos - RTP
Um homem de máscara, passageiro da Transtejo à chegada ao Cais do Sodré, em Lisboa, 29 de abril de 2020. António Pedro Santos - Lusa

O primeiro-ministro anunciou esta tarde as medidas a aplicar nas próximas etapas do Plano de Confinamento, que deverão regular a reabertura social e económica ao longo dos próximos dois meses.

Após um Conselho de Ministros entre as 10h00 e as 16h30, António Costa reuniu-se com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, para lhe apresentar o pacote acordado para relançar a atividade e a mobilidade no país. O terceiro período consecutivo de estado de emergência vai terminar às 00h00 de dia 2 de maio. Será de imediato substituído pelo novo estado de calamidade, a partir de domingo dia 3 de maio, o qual deverá vigorar por 15 dias, sujeito a renovação.

Ao longo do mês de maio e das duas primeiras semanas de junho, de forma faseada, serão retomadas diversas atividades sociais e económicas, sendo que o uso de máscaras será obrigatório em diversos espaços, como escolas, transportes públicos e espaços comerciais.

O dever cívico de recolhimento, com limitação de deslocações, vai ser mantido, assim como o recolhimento obrigatório para essoas doentes com Covid-19 e sob vigilância ativa, sob crime de desobediência.

Os jogos do campeonato da I Liga do futebol profissional vão regressar a partir do último fim de semana de maio, assim como a Taça da Portugal, mas os jogos serão disputados à porta fechada, sem público.

Também a participação em cerimónias religiosas comunitárias será possível, com respeito pelas normas gerais de contenção, isolamento e higiene.

Também teremos de esperar por junho para voltar a ir ao cinema ou ao teatro, mas não irão faltar atividades culturais ou visitas a museus e monumentos, cumprindo regras de distanciamento e sanitárias.

Também em maio, alguns estudantes vão voltar às aulas presenciais, de máscara, e alguns bebés às creches, se as famílias o quiserem. E ir ao restaurante ou ao café e à esplanada, também vai voltar a ser possível, a partir de 18 de maio e sob algumas condições.

Já para ir aos Serviços Públicos ou tratar da higiene pessoal - só será possível mediante marcação prévia.

Dois meses de pandemia
O primeiro-ministro lembrou que sábado, dia 2 de maio, se irão cumprir precisamente dois meses "desde que foi diagnosticado o primeiro caso de Covid-19 em Portugal".

A "pandemia teve uma evolução num sentido positivo ao longo destes dois meses", frisou António Costa, "graças ao esforço de contenção e disciplina dos portugueses e do notável trabalho de todos os profissionais de saúde".

Através de um resumo detalhado da evolução da Covid-19 em Portugal, António Costa sublinhou a diminuição do risco de transmissão e a estabilização dos casos identificados como positivos e do número de óbitos, assim como o aumento progressivo e consistente do número de recuperados.

Nestes dois meses, "passamos de uma fase de crescimento exponencial, para uma fase em que foi possível controlar o ritmo de crescimento", referiu António Costa, o que permitiu concluir que "não se justificava renovar o estado de emergência", o que não implica que "a epidemia esteja ultrapassada" e "possamos retomar a normalidade anterior a 2 de março".

"O risco mantém-se elevado", alertou o primeiro-ministro, o que justifica as cautelas a adotar nas próximas semanas.
Manter a vigilância e a contenção

"Temos de manter um nível de contenção elevado e, por isso, o Governo entendeu que era o momento de descer um degrau no nível de contenção, passando do estado de emergência para o estado de calamidade", explicou António Costa.

A reabertura parcial e gradual da atividade social e económica dos portugueses obedeceu a determinados critérios, explicados pelo primeiro-ministro.

"Um primeiro critério tem a ver com a robustez do SNS, nomeadamente a capacidade de testar o número de casos de risco na sociedade portuguesa". Na Europa, só o Chipre, a Lituânia e a Estónia realizam mais testes por milhão de habitantes do que Portugal, frisou António Costa.

"Em segundo lugar, temos um perfil bastante consolidado de quais são as necessidades de tratamento hospitalar por parte de um doente com covid", a maioria dos quais, 95 por cento, estão sob tratamento domiciliário, outros quatro por cento em tratamento hospitalar e apenas um por cento sob cuidados intensivos.

A taxa de ocupação do conjunto de camas das UCI oscilou sempre por outro lado "entre 50 e 65 por cento e, destes, só entre 50 e 60 pocento são doentes covid", o que significa que mesmo nos piores momentos, a capacidade de garantir os cuidados intensivos a doentes covid ou não, "nunca esteve em causa", frisou António Costa.
Apelo à responsabilidade
"Podemos começar de forma gradual, de forma progressiva com todas as cautelas que a segurança impõe, dar pequenos passos tendo em vista o desconfinamento e a eliminação das limitações que têm sido impostas à vida dos portugueses", anunciou o primeiro-ministro.

António Costa elencou depois um conjunto de condições fundamentais para concretizar estes passos, desde a possibilidade de colocar no mercado máscaras e de gel desinfetante, "em abundância" e garantindo o pleno fornecimento do SNS, a higienização dos espaços de acordo com regras definidas pela Direção Geral de Saúde e a redução da lotação máxima dos espaços, a par da higienização e a distanciação entre pessoas.

"Isto permite-nos também criar condições para determinar o uso obrigatório de máscaras comunitárias, em alguns espaços onde inevitavelmente o número e concentração de pessoas é mais difícil de evitar", como transportes públicos, escolas, comércio, e outros locais com múltiplas pessoas, explicou. Vai ser ainda imposta a lotação máxima de cinco pessoas por 100 metros quadrados em instalações fechadas.

"Temos bem consciência de que este é um processo que tem riscos e nenhum de nós pode ignorar a essência desses riscos", a qual "em primeiro lugar depende de cada um adotar as normas de higiene, adotar as normas de afastamento, as normas de disciplina e de auto-contenção de forma a proteger-se e a proteger os outros," apelou o primeiro-ministro.

"Inevitavelmente o risco de transmissão vai aumentar, que ninguém tenha ilusões", o que exige "maior responsabilidade de todos nós", sublinhou António Costa.
Neste plano de transmissão do estado de emergência para o estado de calamidade o Governo definiu um conjunto de três fases, de 15 dias cada uma, sujeitas a avaliação do impacto e admitindo um "passo atrás" nas medidas.

"É um percurso que temos de fazer com confiança mas em conjunto, contando eu com a responsabilidade e com o empenho da cada um dos portugueses e podendo os portugueses contar com a total determinação do Governo em adotar em qualquer momento e em qualquer circunstância todas as as medidas necessárias para preservar a nossa saúde pública", garantiu António Costa.
A reabertura
A partir da próxima segunda-feira, algumas regras gerais irão manter-se, incluindo o confinamento obrigatório para pessoas doentes e em vigilância ativa e o dever cívico de recolhimento.

"Este é um dever comum a todos", sublinhou António Costa. "O estado de emergência acabou mas o comportamento do vírus continua o mesmo, o vírus não anda por si, não anda sózinho, o vírus somos nós que o transportamos e transmitimos aos outros".
"A emergência sanitária permanece entre nós e por isso temos o dever cívico de continuar a procurar o confinamento e o afastamento cívico entre cada um de nós" disse o primeiro-ministro.
Eventos e ajuntamentos de mais de 10 pessoas vão continuar por isso proibidos. As regras para os funerais irão igualmente manter-se.

António Costa lembrou "que compete aos presidente de câmara a definição do limite máximo de pessoas que podem participar" mas aconselhou o aligeirar da severidade das normas, para permitir a participação de familiares nas cerimónias funebres.

Para as confissões religiosas, "serão adotadas as medidas que permitam que a partir do fim de semana de 30 e 31 de maio sejam levantadas as restrições às celebrações comunitárias em qualquer religião".

Nos transportes públicos, além do uso obrigatório da máscara por parte dos utentes, "haverá regras que imporão uma limitação a dois terços da sua lotação, normas muito exigentes em matéria de higienização e de limpeza" prometeu o primeiro-ministro.

Já para as atividades profissionais, "durante o mês de maio continuará a vigorar o princípio do recurso obrigatório ao teletrabalho em todas as atividades laborais" que o permitam, com a sua redução a permitir de junho, de formas desfasadas "de forma a garantir a proteção dos recursos humanos das empresas".
As três fases em pormenor
A reabertura vai seguir um calendário de três fases, de duas semanas cada, já a partir de segunda-feira.

Nesse dia, os serviços públicos - como repartições de finanças e conservatórias - voltarão a abrir ao público de forma desconcentrada, com atendimento por marcação prévia.

Dia 1 de junho serão reabertas as lojas do cidadão, "esperamos a partir daí em condições normais", afirmou António Costa.

Comércio e restauração


A 4 maio - Reabertura de todas as lojas de rua até 200m/2, livrarias e comércio automóvel, cabeleireiros e outros serviços de higiene pessoal - estes por marcação prévia - cumprindo normas de higienização e distanciamento acordadas com a DGS e que serão apresentadas no próximo sábado, 2 de maio.

A 18 maio - Se a avaliação da evolução da pandemia o permitir, poderão retomar o atendimento ao público as lojas de rua até 400 m2 de área, sendo que as Câmaras Municipais poderão ainda autorizar a reabertura de lojas de área superior à referida. Também poderão retomar a atividade os restaurantes, cafés e pastelarias com lotação de 50 por cento, assim como as esplanadas, sob normas que estão ainda a ser trabalhadas com os representantes do setor as quais deverão ser ainda aprovadas pela DGS.

A 1 junho - será a vez da reabertura das lojas com área superior a 400 m2 e inseridas em centros comerciais

Atividade escolar

O dia 18 de maio foi fixado para o retomar das atividades letivas presenciais do 11º e do 12º ano e dos 2º e 3º anos de outras ofertas formativas do ensino secundário.

A reabertura destas escolas será limitada às disciplinas nucleares para o acesso ao Ensino Superior, em horários contidos a definir entre as 10h00 e as 17h00 procurando potenciar o menor tempo possível de permanência na escola.

Todos os que frequentarem o espaço escolar deverão usar máscara disponibilizada pela escola e esta deverá ter disponível gel desinfetante e seguir todas as normas de higienização.

Terá também início a reabertura dos equipamentos sociais na área da deficiência e das creches, a frequência das quais nos primeiros 15 dias será por opção da família, sem prejuízo dos apoios financeiros de que os pais têm gozado no período de confinamento.

A 1 de junho, irá dar-se a reabertura plena das creches e do ensino pré-escolar - "recomendamos as atividades ao ar livre" sugeriu o primeiro-ministro - assim como os Centros de Atividades de Tempos Livres.

Cultura

O primeiro-ministro lembrou que este foi "dos primeiros setores a ser encerrado e que mais duramente tem sido atingido pelas medidas de contenção". A reabertura será gradual.

Dia 4 de maio - Serão reabertas bibliotecas e arquivos, e espaços públicos como jardins de museus ou monumentos nacionais.

Dia 18 - Reabertura de museus, monumentos e palácios, galerias de arte, salas de exposições e similares,

Dia 1 de junho - Reabertura com lugares marcados, lotação reduzida e distanciamento físico, das restantes salas de espectáculos designadamente cinemas, teatros e auditórios "de forma que as atividades culturais possam recomeçar a ter atividade ao público"

Desporto


Depois de todas as restrições, os atletas podem voltar a exercitar-se, cumprindo as regras de contenção social. Também vão regressar os jogos do campeonato profissional de futebol da I Liga e a Taça de portugal, mas irão sempre realizar-se à porta fechada, sem público.

Dia 4 de maio - Deixam de existir limitações à prática de desportos individuais ao ar livre fora de competições, sem utilização de balneários nem piscinas.

Os restantes desportos em recintos fechados e de contactos permanecem interditos, com a exceção, no fim de semana de 30 e 31 de maio, de se iniciar "a conclusão das provas oficiais dos clubes da I Liga de futebol profissional, permitindo concluir as últimas 10 jornadas do campeonato e o final da Taça", anunciou António Costa.

O reinício destas atividades está sujeito à aprovação pela DGS do protocolo sanitário apresentado pela Liga de Futebol Profissional e condicionado à avaliação de que estádios cumprem as condições indispensáveis a retoma da atividade, lembrou ainda o primeiro-ministro.

O calendário apresentado pelo Governo.


"Até haver uma vacina disponível no mercado e acessível a todos nós" ou outra forma de tratamento, "vamos ter de continuar a conviver com o covid-19", lembrou António Costa, apelando ao esforço de todos para cumprir as normas impostas e recomendadas, de forma a não "perder no próximo mês aquilo que alcançamos tão duramente nestes dois meses".

Calamidade também na Madeira
O Conselho do Governo da Madeira declarou, já esta quinta-feira, a situação de calamidade no arquipélago, com efeitos a partir das 00:00 de domingo.

O uso de máscara vai passar a ser obrigatório na região, em todos os espaços comerciais, para clientes e funcionários. Os trabalhadores devem medir a temperatura duas vezes por dia e manter o distanciamento social.

Em comunicado, o executivo regional, de coligação PSD/CDS-PP, informa que foi ainda determinado o "confinamento, se necessário compulsivamente, por um período de 14 dias, de todas as pessoas e respetivas bagagens que desembarquem nos aeroportos e portos da Madeira e Porto Santo".

Não são abrangidos os "doentes em tratamento e as pessoas que desembarquem nos portos por razões profissionais", em termos definidos através de despacho.
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