Face Oculta. Armando Vara sai em liberdade após cumprir parte da pena

por RTP
Nuno Veiga - Lusa

O antigo ministro e ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos saiu do Estabelecimento Prisional de Évora depois de cumprir uma pena de dois anos e nove meses de prisão. Armando Vara tinha sido condenado a uma pena de cinco anos de prisão no âmbito do processo Face Oculta, mas recebeu um perdão de pena. A informação foi inicialmente avançada pela RTP e entretanto confirmada pelo tribunal. À saída do Estabelecimento Prisional de Évora, Armando Vara argumentou que esta decisão o inocenta dos crimes de que foi acusado

Tal como a RTP tinha avançado ao início da manhã e entretanto confirmado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Évora, o perdão de pena foi promovido pelo próprio Ministerio Público e autorizado pelo Tribunal de Execução de Penas. Em causa está o regime excecional criado na pandemia, que se aplica a quem já tenha cumprido pelo menos metade da pena.

No entanto, ao dia de hoje, Armando Vara já não se encontrava no Estabelecimento Prisional de Évora desde sexta-feira, na altura por ocasião de uma saída precária e ainda antes de se conhecer esta decisão, anunciada esta segunda-feira. O antigo ministro teve ainda assim de regressar hoje às instalações onde cumpriu pena para assinar vários documentos e cumprir todas as formalidades referentes à saída em liberdade.

Em declarações aos jornalistas por ocasião desta mesma deslocação, à porta do Estabelecimento Prisional de Évora, Armando Vara sublinhou que não cometeu os crimes de que foi acusado. Armando Vara argumentou que esta decisão o iliba e inocenta dos crimes de que foi acusado e que não se trata apenas de um perdão de pena.

"Ilibado, sou completamente ilibado disso", referiu aos jornalistas, relativamente aos crimes de que foi acusado no exercício de cargos públicos. 

Acrescentou ainda que a acusação do processo Face Oculta é em muito semelhante em relação aos crimes de que é acusado no âmbito da Operação Marquês. "Não deixei de acreditar na justiça. Acredito que vou ser ilibado na Relação", afirmou.

Armando Vara foi ainda a tempo de considerar que a pena que lhe foi aplicada, de cinco anos, é um "exagero para o tipo de criminalidade, entre aspas, de que fui culpado".

"Estive a cumprir uma pena de dois anos e nove meses por crimes que não cometi", afirmou.
De recordar que Armando Vara foi condenado no âmbito do processo Face Oculta a cinco anos de prisão por três crimes de tráfico de influências. Na altura, o coletivo de juizes deu como provado que o ex-governante recebeu 25 mil euros de Manuel Godinho em troca de contactos para favorecer as empresas do sucateiro de Ovar.

O ex-ministro estava preso desde 16 de janeiro de 2019 e a pena ficaria cumprida apenas em outubro de 2023, mas a saída é antecipada e o antigo governante fica em liberdade ao fim de dois anos e nove meses de prisão. A defesa já tinha feito vários pedidos de liberdade condicional que tinham sido todos negados.

Até hoje, Armando Vara apenas tinha saído do Estabelecimento Prisional de Évora por alguns dias, em saídas precárias para marcar presença no processo da Operação Marquês.

No âmbito desse mesmo processo, o antigo ministro e banqueiro foi condenado, em julho último, a uma pena de dois anos de prisão efetiva por branqueamento de capitais, mas agora irá aguardar a partir de agora o desfecho desse processo em liberdade. 

Este processo concreto ainda não transitou em julgado, até porque o Ministério Público apresentou um recurso ao Tribunal da Relação sobre a decisão instrutória da Operação Marquês, o que poderá vir a afetar o processo separado de Armando Vara.
Vara reúne "requisitos legais de perdão de pena"
Em nota enviada à imprensa, o Tribunal Judicial da Comarca de Évora confirma a libertação antecipada de Armando Vara ocorre ao abrigo da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, que prevê um regime excecional de flexibilização da execução de penas em vigor devido à pandemia de Covid-19.

"O Tribunal de Execução de Penas de Évora entendeu e decidiu que Armando Vara reunia os requisitos legais de perdão de pena", à luz do regime excecional que ainda vigora, tendo já cumprido metade da pena. 

O tribunal confirma que o perdão de pena foi promovido pelo próprio Ministério Público e acrescenta que a libertação ocorre também porque Armando Vara "não foi condenado por qualquer crime que a Assembleia da República tenha fixado como 'imperdoável', sendo certo que o perdão incide sobre a pena única e não sobre as penas parcelares fixadas em relação a cada um dos crimes".

Explica ainda que o crime de tráfico de influência pelo qual Vara foi condenado "não se encontra contemplado na exceção geral" prevista na lei de perdão de penas. Ou seja, o crime pelo qual foi condenado não está previsto no conjunto de exceções ao regime de perdão de pena.

O juiz presidente do Tibunal Judicial da Comarca de Évora acrescenta ainda, nesta nota, que os crimes de tráfico de influência foram cometidos entre 2006 e 2009, altura em que Armando Vara "não era titular de cargo político, nem resulta do acórdão condenatório que os crimes por si cometidos o tenham sido no exercício de funções de alto cargo público ou por causa delas".

"A concreta influência movida assentou em ligações pessoais e partidárias", justifica o tribunal.
"Solução menos injusta", diz advogado de defesa

Em declarações à agência Lusa, o advogado de defesa de Armando Vara, Tiago Rodrigues Bastos, considera que a decisão de redução da pena é "uma solução menos injusta" para o caso.

"É uma decisão que, cumprindo a lei no caso concreto, acaba por permitir uma solução menos injusta", afirmou. "Fico muito contente, muito satisfeito porque já era tempo de ele ser devolvido à liberdade", frisou, adiantando que Armando Vara está, "acima de tudo, aliviado", acrescentou Tiago Rodrigues Bastos.

O advogado defende que a pena que lhe tinha sido aplicada "não era justa" e que o antigo governante já tinha cumprido "tempo suficiente".

A libertação de Armando Vara "protege o Estado de Direito", defendendo o advogado a necessidade de se refletir sobre "a desproporcionalidade da aplicação da justiça (e não da lei) em relação aos crimes económicos", destaca Tiago Rodrigues Bastos.

"A justiça está a perverter aquilo que a própria lei prevê" para este tipo de crimes, argumenta o advogado. 
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