Foram “apagados” ou “destruídos” documentos sobre incêndio de Pedrógão Grande

por RTP
Reuters

Uma auditoria interna da Proteção Civil revelada esta quarta-feira pelo jornal Público aponta falhas ao combate inicial ao incêndio de junho em Pedrógão Grande e revela que não existem provas documentais. O documento terá sido entregue ao Governo em novembro, mas não foi tornado público. O Ministério da Administração Interna nega ter "escondido" o documento e argumenta que ele foi entregue ao Ministério Público e está abrangido pelo segredo de justiça.

O relatório da auditoria feita pela Direção Nacional de Auditoria e Fiscalização da ANPC, a que o PÚBLICO teve acesso, revela que os auditores se depararam com a inexistência de provas documentais sobre o trabalho de combate ao fogo. Documentos que são produzidos no posto de comando, como planos de situação e planos estratégicos de ataque, essenciais numa fase posterior a uma avaliação da responsabilidade disciplinar e criminal.

"Não foi possível aceder a um único SITAC [quadro de situação tática], a um único Quadro de Informação de Células, ou a um PEA [Plano Estratégico de Ação]", lê-se no documento. "Todos estes documentos haviam sido apagados dos quadros das VCOC e VPCC [viaturas de comunicação], ou destruídos os documentos em papel que os suportaram", cita o jornal Público.
De acordo com o relatório, o primeiro posto de comando foi uma mesa com quatro cadeiras e um computador pessoal emprestado por um bombeiro, com o Google Earth aberto.
De acordo com comandantes ouvidos pelo jornal, isso decorre da falta de meios num posto de comando, já que os planos são desenhados e redesenhados conforme o evoluir da situação. Os auditores consideram ser necessário um investimento informático para que seja possível guardar informação. Alguns comandantes vão tirando fotos do trabalho, mas em Pedrógão isso não aconteceu, diz o relatório.

O relatório da Direção Nacional de Auditoria e Fiscalização da ANPC não tem dúvidas de que houve uma total desorganização no combate inicial ao incêndio. Nas primeiras três horas é descrita uma situação caótica, adianta o Público, revelando ainda que houve uma ausência do comandante de operações, que voltaria a ter uma “ausência inesperada” mais tarde.

O relatório revela que houve atrasos na aplicação das fases do Sistema de Gestão de Operações que condicionou o trabalho dos outros comandantes que acabou por ser “reativo” e sempre a andar atrás do prejuízo.

O relatório volta a frisar falhas de comunicação, como anteriores relatórios de entidades externas.

"Perante este atraso irrecuperável, com problemas de comunicações, sem planeamento anterior atempado e sem um conhecimento do perímetro do incêndio, a própria gestão reactiva é prejudicada. Acode-se onde pedem e onde os meios chegam. O incêndio deixa de ser combatido", descrevem os auditores.

Com a mudança do comandante, pelas 22h00, os auditores dizem encontrar melhorias na organização e na estratégia, apesar de referirem que este se concentrou mais no socorro do que no combate. É a altura em que se sabe que há vítimas mortais, que chegam os primeiros responsáveis políticos, "obrigando o comandante a fazer 11 briefings em poucas horas, desviando-o de outras tarefas".

O relatório terá sido entregue ao Governo em Novembro, mas não foi tornado público. O jornal Público, depois de ter em mãos o documento que há meses tem vido a pedir ao Ministério da Administração Interna, voltou a questionar o gabinete do MAI, mas revela não ter tido qualquer resposta até ao momento.

Num curto comunicado enviado a meio da manhã desta quarta-feira, o Ministério da Administração Interna vem dizer que é falsa a informação de que o Governo tenha “escondido” o relatório desde novembro. O Ministério diz que os documentos “foram remetidos ao Ministério Público, junto da Comarca de Leiria, no dia 20 de novembro, para efeitos de investigação, estando assim abrangidos pelo segredo de justiça”.
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