Governo exclui riscos para saúde pública com mudança na fiscalização alimentar

por RTP
“A ASAE deixou de fazer a recolha das amostras, mas isso não significa que ninguém as faça. Significa que há uma outra entidade, que é a Direção-Geral de Veterinária, que está a fazer essa recolha” José Sena Goulão, Lusa

A ministra da Agricultura confirmou esta segunda-feira, na Assembleia da República, que a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária passou a ter a seu cargo, desde o início do ano, a recolha de amostras de alimentos que anteriormente cabia à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, nomeadamente da carne que sai dos matadouros. Uma alteração, afiançou Assunção Cristas, que se destina a “racionalizar recursos humanos e financeiros”, mas que não coloca “nenhum problema para a saúde pública”. A mensagem é repetida pelo diretor-geral de Veterinária. À agência Lusa, Nuno Vieira e Brito admitiu, porém, que de 2009 a 2011 foram consumidos alguns alimentos em Portugal antes da obtenção de resultados de análises.

“Não existe nenhum problema para a saúde pública nem há nada que esteja a ser descurado nesta matéria”, afiançou a ministra da Agricultura perante a comissão parlamentar de Agricultura e Mar, depois de o Jornal de Notícias ter revelado que a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) deixou de recolher amostras de produtos de origem animal antes da chegada aos pontos de comercialização, a pedido da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV).“Garantias”Questionado sobre a redistribuição de tarefas até agora confiadas à ASAE, o primeiro-ministro procurou também afirmar que “o Estado tem, embora com intervenção de tipo diferente, respondido à necessidade de dar garantias de controlo alimentar e fitossanitário”.

“Não existe, desse ponto de vista, nenhuma razão para alimentar quaisquer polémicas ou deixar nos portugueses qualquer insegurança”, enfatizou Pedro Passos Coelho, no termo de uma deslocação à Unidade Especial da PSP, em Belas.

“Sobre a questão da ASAE e da inspeção alimentar não acrescentarei nada àquilo que a senhora ministra do Ambiente, da Agricultura e do Ordenamento do Território já disse. Não existe qualquer perda de intervenção nem de regulação”, concluiu.


“O que houve foi, no início deste ano, um entendimento entre a Direção-Geral de Veterinária e a própria ASAE no sentido de racionalizar recursos humanos e financeiros”, prosseguiu Assunção Cristas, para depois resumir o que mudou na distribuição de tarefas em matéria de fiscalização alimentar: ficou acertado que “onde a ASAE prestava um serviço à Direção-Geral de Veterinária, recolhendo amostras, pudesse ser a Direção-Geral de Veterinária” a fazê-lo, dado que “tinha elementos técnicos nos locais”.

“Portanto, a ASAE deixou de fazer a recolha das amostras, mas isso não significa que ninguém as faça. Significa que há uma outra entidade, que é a Direção-Geral de Veterinária, que está a fazer essa recolha das amostras”, reforçou a governante.

Cristas insistiu na ideia de que “não há nenhum vazio” e de que “o trabalho da recolha das amostras está a ser feito”.

“Há amostras que têm sazonalidade. Só podem ser recolhidas em determinada altura do ano. Portanto, a distribuição não é regular ao longo de todo o ano e o nosso objetivo é chegar ao final do ano com o Plano [Nacional de Controle de Resíduos] cumprido, quer ao nível da recolha das amostras, quer ao nível das análises efetivamente realizadas”, asseverou.
Dois planos
Os esclarecimentos de Assunção Cristas surgem depois de o inspetor-geral da ASAE ter confirmado que a recolha de amostras de alimentos de origem animal deixou de ser realizada pela entidade que lidera no “final do primeiro trimestre do ano”. António Nunes admitiu ainda que o controlo de “alguns produtos” na origem não esteja a ser  completamente acautelado.

“O que falta fazer é essa pequena parte, que não é da nossa responsabilidade, que é controlar alguns produtos que são colocados no mercado antes de eles serem comercializados. Na comercialização nós temos controlado. Por isso eu disse e volto a afirmar que, no que diz respeito à fiscalização dos produtos, ou melhor, à fiscalização dos operadores que põem à disposição no mercado esses produtos, ela está a ser feita aos níveis a que estava a ser feita nos anos anteriores e até me atrevo a dizer que há algumas situações acima dos anos anteriores”, afirmava ontem António Nunes, em declarações emitidas pela Antena 1.

À Lusa, António Nunes sublinhou que os inspetores da ASAE se limitam a analisar alimentos “como hambúrgueres, chouriço, carne picada, leite ou ovos que estão nos pontos de venda”. Ou seja, após transformação.

A fiscalização alimentar em Portugal tem decorrido ao abrigo do Plano Nacional de Controlo de Resíduos, sob a alçada da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária, que funciona na tutela do Ministério da Agricultura e Ordenamento do Território, e do Plano Nacional de Colheita de Amostra, a cargo da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, tutelada pelo Ministério da Economia.

“O Plano Nacional de Controle de Resíduos analisa os alimentos na origem e pesquisa, por exemplo, a presença de antibióticos ou anti-inflamatórios”, explicava no domingo o inspetor-geral da ASAE.
Consumidos alimentos com análises incompletas
Também o diretor-geral de Alimentação e Veterinária foi rápido a garantir, ontem, que os alimentos de origem animal estão a ser analisados e que a saúde pública não corre riscos, mesmo depois de a ASAE ter deixado de participar no processo de recolha de amostras por uma questão de “racionalização de recursos”. Ouvido esta segunda-feira pela agência Lusa, Nuno Vieira e Brito reconheceu, contudo, que alguns dos alimentos controlados pela DGAV entre 2009 e 2011 foram consumidos antes de serem obtidos os resultados das análises.

Previa-se que o tempo entre a recolha de amostras e a chegada de resultados fosse “o mais curto e célere possível”. Todavia, admitiu Vieira e Brito, “isso não estava a acontecer”. “Nós tínhamos alguns resultados que, às vezes, demoravam um e dois anos”, ilustrou o responsável, assinalando de imedidato que tais atrasos não significam que os produtos em causa fossem inseguros para consumo. Isto porque existem “outros métodos e planos de controlo”.

“O facto de haver um atraso nalguns produtos e nas análises não implica que estejam não seguros, até porque a percentagem de não conformidades é muito reduzida”, frisou o diretor-geral de Alimentação e Veterinária, lembrando que, em 2011, só quatro de 7800 amostras analisadas tinham substâncias ilegais.

A par do Plano Nacional de Controle de Resíduos, frisou ainda Nuno Vieira e Brito, existem outros “planos de condicionalidade” para controlo de explorações de pecuária, ações de inspeção sanitária para controlo de matadouros e lotas e planos para a recolha de análises de géneros alimentícios e outros, verificando-se neste caso as condições higiénico-sanitárias de estabelecimentos.

Nuno Vieira e Brito enfatizou que o conjunto destes planos “protege, assegura e valida” o que é consumido em Portugal e “assegura a qualidade do produto”.

No início de 2011 a Comissão Europeia enviou uma equipa a Portugal com a missão de avaliar a implementação do Plano Nacional de Controle de Resíduos desde 2009. Nas suas recomendações, que não foram ainda publicadas, os peritos de Bruxelas sinalizaram, segundo a Lusa, que as amostras não estavam a ser analisadas em tempo útil, apontando ainda a ausência de certificação dos métodos aplicados nos laboratórios portugueses. A DGAV está atualmente a trabalhar com laboratórios estrangeiros. Nuno Vieira e Brito indicou que “o laboratório de referência está a tentar acreditar os seus métodos”.

O diretor-geral de Alimentação e Veterinária assegura, por outro lado, que “não há nenhum interesse por parte de Bruxelas em fazer qualquer embargo” à carne portuguesa. “Tem havido contactos regulares com Bruxelas e com a missão que nos acompanha no sentido da fiscalização e não há, nem nunca houve, nenhuma abordagem próxima, nem teórica nem prática, sobre o assunto. Portanto, não me parece que deva ser equacionada”, declarou.
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