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IST SAT-1. O nanosatélite português totalmente feito no Instituto Superior Técnico

Portugal vai poder ver esta terça-feira mais um nanosatélite a ostentar as cores da bandeira nacional. De nome IST SAT-1, acrónimo de Instituto Superior Tecnico Satelite-um, este pequeno cubo electrónico segue hoje, por volta das 17h00 em Lisboa, para órbita à boleia do novo lançador europeu Ariane 6, a partir da guiana francesa, e tem por missão testar a capacidade de deteção da presença de aviões em zonas remotas.

É um Cubesat, de 10cm por 10cm (1U), totalmente desenvolvido em Portugal e que nasceu de uma ideia tecnológica e inovadora, decorria o ano de 2008, de conversas entre alunos e professores do Instituto Superior Técnico, ali no antigo café Império, na Alameda.


Dezasseis anos passados, e muita mudança na concepção inicial, está pronto para entrar em órbita para ficar a ver os aviões passar, localizado a mais de 500 quilómetros da superfície terrestre.

Nanosatélite português a bordo do novo lançador europeu - Ariane 6

Não são só os engenheiros e criadores do IST Sat-1 que estão com "nervoso miudinho" à flor da pele. É também hoje, dia 9 de julho, que está programado o primeiro lançamento do mais recente lançador europeu - Ariane 6 - dando finalmente um passo importante na questão dos lançamentos de cargas para o espaço.

Depois de um longo periodo de espera, devido a testes do novo lançador,  a que se juntou a anulação de muitos contratos para os lançamentos feitos pela Russia e com o enorme sucesso dos Falcon da Space X, a ESA tinha pressa em ter este novo foguete ativo.

"Este é um grande momento para a Europa", pode ler-se no site oficial da Agência Espacial Europeia (ESA). A agência espacial faz ainda referência à importância no regresso de um lançador europeu que vai permitir o "acesso garantido e autónomo ao espaço – e toda a ciência, observação da Terra, desenvolvimento de tecnologia e possibilidades comerciais que ele envolve. Com muitos recursos, totalmente novos no Ariane 6, seremos capazes de transportar mais e levar mais longe, ao mesmo tempo que descartamos de forma sustentável o estágio superior do lançador para evitar que ele se torne lixo espacial", sublinha.

Assista aqui em direto ao lançamento do Ariane 6, através da ESA Web TV, previsto para esta terça-feira, 9 de julho de 2024, com uma janela de lançamento das 15:00 às 19:00, horário local, no Porto Espacial Europeu na Guiana Francesa (19:00 às 23:00 BST, 9 de julho, das 20:00 às 00:00 de 10 de julho CEST).

 
Um espaço cada vez mais português
Certamente ouviu, há bem pouco tempo, que Portugal tinha construído e enviado para o espaço um satélite. Verdade, mas esse satélite, designado MH-1, lançado em março, foi construído por duas empresas nacionais de renome internacional, entre outras parcerias, com recurso a componentes adquiridos quer em Portugal, quer no estrangeiro. Em contraponto, o IST SAT-1, foi totalmente construído com material existente no nosso território e com recurso a mão-de-obra estudantil e nacional, refere o antigo professor Moisés Piedade, aposentado, mas ainda ligado ao projeto.

A RTP Notícias esteve à conversa com o antigo professor e um dos criadores desta peça tecnológica, que nos explicou no que consiste este nanosatélite e o porquê de, nós portugueses, embarcarmos nesta aventura espacial.


“Eu sou radioamador. E já aqui no Técnico, em 1968, 69, 70 nós tínhamos um grupo de estudantes que se reuniam ali no Café Império, na Alameda, lá em baixo, e aos sábados e domingos as nossas discussões eram sobre rádio, sobre emissoras e televisão, e na altura também áudio e alta fidelidade. Aparelhos que estavam aparecer e que eram muito caros e que depois nós construíamos aqui - algumas réplicas - muito mais baratos”. Um trabalho amador de grupo de estudantes e professores que se autodenominava de gangue de VHF, explica com um sorriso de saudade.

Finalizado o curso, de muitos destes curiosos, “uns foram para a indústria, outros ficaram na universidade. A ideia não se ficou pelas intenções e em 2004, quando foi criado um novo curso do IST no Tagus Park, passou-se à prática". E os conhecimentos de uns e de outros deu origem ao nascimento de um centro de rastreio de satélites. “Foi o professor Afonso Barbosa que teve essa, digamos, coragem de nos dar dinheiro que ainda era bastante na altura. A partir daí, houve uma associação de rádio amadores, que é a AMRAD, que também tinha alguns daqueles elementos que nós conhecíamos já dos anos 70 aqui, das discussões no Café Império, e voltámos a juntar-nos."

Em 2008, este projeto pioneiro foi apresentado às rádios e televisões. E se esta ideia funcionou, “primeiro uma estação de rastreamento, por que não um satélite, não é?”, pergunta Moisés Piedade.

Para o cidadão comum, pouco familiarizado com estas coisas do espaço, certamente iria imaginar um Centro de Controlo e de Rastreio de Satélites, um enorme espaço, semelhante às imagens fornecidas pela NASA aquando os lançamentos dos foguetões. Mas por cá, o projeto IST SAT apenas vai ocupar uma sala de aproximadamente 40 m2, no número 0.77 do complexo Campus TagusPark do Técnico, em Oeiras.

Uma sala de controlo de missão do IST Sat-1, explica Rui Rocha, coordenador do projeto e professor do Departamento Engenharia Eletrotécnica e de Computadores, numa entrevista dada ao podcast do IST. “Se tudo correr bem, será controlado a partir desta sala onde estamos agora”.

O projeto IST SAT-1, iniciado em 2017, faz parte do programa espacial Fly Your Satelite, destinado a equipas universitárias. Entre as 13 propostas iniciais, apenas quatro projetos chegaram à fase final, sendo o IST Sat-1 o único a desenvolver toda a estrutura do satélite internamente. “Quando começámos a idealizar o nanosatélite, um dos nossos objetivos era realizar todo o processo aqui no Técnico. A nossa principal motivação era sermos capazes de construir um satélite do zero pela primeira vez em Portugal”, explica o ex-professor Moisés Piedade, do mesmo departamento e um dos responsáveis pelo projeto.

E, aproveitando o centro de rastreio no Tagus Park em Oeiras desde 2005, surgiu com maior facilidade o projeto Nanosat. 


Mas faltava a missão, um objetivo para o satélite com que tanto sonharam desde os tempos das tertúlias no café Império.

Um fator determinante que não era só destes engenheiros electrónicos que nasceram no Técnico. “Houve até uma visita, lá ao Tagus Park, à estação de rastreio… acho que era o vice-presidente da Câmara de Oeiras, e ele ficou muito entusiasmado. Colocou-nos em contato com investigadores de um instituto da Gulbenkian, ITQB, lá de Oeiras, e a missão que nos sugeriram era uma coisa que era impossível. Eles tinham um projeto de investigação que era usar matéria orgânica de resíduos para gerar eletricidade, através de transformações químicas. Mas a eletricidade gerada era uma coisa extremamente pequenina, logo era inviável”.

Ao início, revela o professor à RTP, até houve um certo entusiasmo, pois do bom do ponto de vista cientifico era inovador, mas do ponto de vista prático não funcionava. “Tinha que ter muitos quilos de porcaria para dar uma pequena potência eléctrica, que não dava para alimentar nada. Além de que depois se punha um problema, porque nós não podemos levar materiais biológicos para o espaço, não é?”.

“Para mim é um desafio de engenharia ao mais alto nível que se faz no Técnico. Foi basicamente isso que nos motivou”, diz Moisés Piedade. “Mesmo que o cubo seja posto no espaço e não funcione, nós já ganhámos porque já aprendemos imenso, criámos entusiasmo entre os alunos e aprendizagens para além daquilo que lhes proporcionamos no curso. E isto é uma aventura”.

PoSat-1, MH1 e IST Sat-1. Três satélites (diferentes) portuguêses
É um nanosatélite “totalmente desenvolvido a partir de uma folha em branco”, explica o antigo professor do Departamento Engenharia Eletrotécnica e de Computadores e agora colaborador ativo no projeto.

Para este viajante espacial “não se comprou, nem se ajustou nada. Foi tudo feito aqui no Técnico” - e dá exemplos da comparticipação portuguesa na construção dos vários satélites: “No PoSat não fizemos nada. Compramos quase tudo. Fizemos apenas uma aplicação. No ‘Infante’, um satélite que nem saiu do estaleiro, fez-se muita coisa, mas não saiu nada. O MH-1 e o AEROS são compromissos diferentes. Por exemplo: o professor Verhoeven foi o primeiro a fazer um satélite na Holanda. Comprou tudo. Eu sou apologista de que só se aprende a fazer aqui no Técnico”.


“Eu tive vários professores excelentes, excecionais do ponto de vista de falar. Mas eu escolho nas minhas duas mãos aqueles, que eu acho, que é capaz de fazer aquilo que está a ensinar. E para mim isso é que é saber e conseguir fazer as coisas. Foi o que nós provámos aqui e que era possível fazer, remata o professor”.

Equipa de lançamento do ISTsat-1

Um projeto que tem por finalidade dar um contributo fundamental à ciência aeroespacial e desenvolvimento local e nacional, entre o Técnico, o município de Oeiras e a CEiiA, através da assinatura de um protocolo para a construção de novos nanosatélites num programa denominado “Lança Oeiras”, que servirá também como forma de celebração do lançamento deste novo satélite português, o IST Sat-1.


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Fotos: Instituto Superior Técnico | Imagem e edição: Nuno Patrício - RTP