Ministra da Justiça promete agir contra "expedientes dilatórios"

O Governo está a preparar legislação “para revisitar as prescrições e pôr fim a expedientes dilatórios” nos processos judiciais, indicou esta segunda-feira a ministra da Justiça. Sem querer comentar de uma forma direta o caso de Isaltino Morais, que foi detido e libertado no espaço de 23 horas, Paula Teixeira da Cruz não deixou de afirmar que “os cidadãos não suportam mais processos que se arrastam” e que “muitas vezes prescrevem”. Acabar com “um conjunto infindável de disfunções” é um compromisso assumido pela governante.

RTP /
“Há que revisitar as prescrições, há que revisitar o número de testemunhas nos processos, clarificando a lei nessa matéria” Miguel A. Lopes, Lusa

O “caso concreto” do presidente da Câmara Municipal de Oeiras não merece um comentário direto da ministra da Justiça. Mas foi em resposta a questões dos jornalistas sobre os acontecimentos da semana passada que Paula Teixeira da Cruz adiantou estar em preparação um pacote legislativo do Governo para resolver “disfunções sistémicas”: “Aos tribunais o que é dos tribunais. Ao poder político o que é do poder político. Mas sempre direi que nós temos em preparação legislação para revisitar as prescrições e pôr fim a expedientes dilatórios”.
“Cultura de cidadania”

Restaurar a confiança na Justiça é uma das tarefas que Paula Teixeira da Cruz se propõe levar por diante. O objetivo foi assumido na tomada de posse do novo diretor do CEJ. Todavia, admitiu a ministra, “os tempos que correm não contribuem para isso”.

Para reclamar a confiança, defendeu, é preciso “melhorar o sistema de recrutamento e formação dos magistrados, revitalizando o CEJ como entidade vocacionada para a formação dos diferentes operadores de Justiça”.

Por sua vez, António Pedro Barbas Homem sustentou que a formação dos juízes deve ser construída “pelo cultivo de valores e princípios de responsabilidade partilhados socialmente”, impondo-se uma “cultura de cidadania”.

Barbas Homem sucede na direção do CEJ a Ana Luísa Geraldes, que apresentou a demissão na sequência do denominado “caso do copianço” – todos os elementos de uma turma do CEJ receberam nota dez por via administrativa após terem copiado um teste.

“Não estou a comentar o caso em concreto. Estou a dizer que os cidadãos não suportam mais processos que se arrastam anos e anos e anos e que muitas vezes prescrevem. Portanto, as disfunções sistémicas, que é disso que importa tratar, não são do caso A, B ou C, nem seria correto que o fizesse. As disfunções sistémicas têm que ser encaradas”, insistiu a ministra da Justiça, que falava à margem da tomada de posse de António Pedro Barbas Homem como diretor do Centro de Estudos Judiciários (CEJ).

Paula Teixeira da Cruz evitou falar de prazos. E também não quis esclarecer, nesta fase, “em que sentido é que as reformas do penal e do processo penal irão”.

O processo, resumiu, vai passar “por várias alterações legislativas” e todos os operadores judiciários vão ter uma palavra a dizer.

“Há, de facto, muito a fazer. Há disfunções no sistema que estão identificadas. Há que revisitar as prescrições, há que revisitar o número de testemunhas nos processos, clarificando a lei nessa matéria. Há um conjunto infindável de disfunções que, como digo, estão diagnosticadas e que se pode aperfeiçoar”, rematou.

“Juízo perfeito e cabal”
O Conselho Superior da Magistratura (CSM) escolheu o juiz desembargador Mário Morgado para tutelar a análise do processo que levou à detenção e posterior libertação, decorridas 23 horas, do autarca de Oeiras. O inspetor, explicava ao fim da manhã o vice-presidente do CSM, Bravo Serra, “irá a Oeiras consultar o processo, ver todas as repercussões desse mesmo processo, o que é que se passou em relação àquele recurso interlocutório que, neste momento, está pendente no Tribunal Constitucional”.

“Essa recolha de informação servirá para o Conselho Superior da Magistratura efetuar um juízo e um juízo perfeito e cabal e de toda a situação”, sublinhou o responsável.

Detido às 20h00 da passada quinta-feira, o presidente da Câmara de Oeiras deixou as instalações prisionais da Polícia Judiciária, em Lisboa, cerca das 19h00 do dia seguinte. O Tribunal de Oeiras decidiu-se pela detenção depois de concluir que a condenação do autarca havia transitado em julgado. Contudo, a defesa alegou que havia um recurso pendente, com efeito suspensivo, no Tribunal Constitucional. Uma posição que seria depois aceite pelo Tribunal de Oeiras.

O CSM quer agora perceber se houve uma falha de comunicação entre instâncias. Isto porque alegadamente o Tribunal de Oeiras desconhecia a existência de um recurso pendente no Tribunal Constitucional. Nos termos do despacho da juíza de Oeiras, adiantou Bravo Serra, “o recurso sobre o julgamento de Isaltino Morais subiu em separado e, na primeira instância, foi-lhe atribuído efeito devolutivo”. “Porém, esse efeito foi alterado pelo Tribunal da Relação, passando a ser suspensivo”, apontou.

Isaltino Morais foi condenado em 2009 a sete anos de prisão e a perda de mandato por fraude fiscal, abuso de poder, corrupção passiva para ato ilícito e branqueamento de capitais. A pena seria reduzida para dois anos pelo Tribunal da Relação, o que deu azo a vários recursos. O caso teve início há quase nove anos. O Departamento Central de Investigação e Ação Penal começou, então, a investigar o presidente da Câmara Municipal de Oeiras por suspeitas de ser detentor de contas bancárias não declaradas na Bélgica e na Suíça.
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