"Passei várias vezes com um carro mesmo velho". Moradores da Baixa de Lisboa dizem que ZER "não existe"

É como se não existisse: os moradores na Baixa de Lisboa criticam a falta de fiscalização da Zona de Emissões Reduzidas. Sentem que vivem rodeados de trânsito e de ruído.

Gonçalo Costa Martins - Antena 1 /

Maximien Coelho, Cláudia Felício e Rui Barata (da esquerda para a direita) | Fotos: Gonçalo Costa Martins - Antena 1

A Rua da Madalena ficou entupida desde que outra via, a Rua da Prata, fechou o trânsito automóvel. Junto à igreja, Cláudia Felício não se conforma com o "caos" de veículos e ruído permanente.

Depois da igreja, a estrada passa de duas para uma faixa, pelo que "chegam ali e depois encolhem-se", aponta, sem deixar de notar que, pelo meio, "a estrada está toda a abater, não estava preparada para este excesso de carga". 

O som dos motores a subir a estrada torna-se num tormento, um "inferno" até, conta Maximien Coelho, que vive nesta rua.

"Para quem tem o quarto para a rua, a partir das seis e meia da manhã não consegue dormir", conta. 


Cruzamento da Rua com o Largo da Madalena, onde fica a Igreja de Santa Maria Madalena de Lisboa

Passam elétricos, autocarros, camiões e carros, a que se juntam tuk-tuks com música ampliada por colunas de som - enquanto a Antena 1 conversa com os dois moradores, passa um destes veículos ao ritmo de uma versão remix bem audível de Barbie Girl, enquanto o condutor, sem ninguém no banco de trás, tenta puxar pela alegria dos peões. 

Cristina lembra que a rua já foi pior, quando não havia semáforos a regular o trânsito (chegando a ter agentes da Polícia a fazê-lo), e Maximien aponta para o sinal que proíbe virar à esquerda para a Rua da Conceição (a Antena 1 constatou que vários veículos não cumpriram essa regra).


Maximien Coelho aponta para o sinal que vários condutores não seguem
 
"A ZER não existe, não funciona"

Subimos a rua para ir à casa de Maximien para ouvir o dito ruído permanente - um terceiro morador da Baixa, Rui Barata, junta-se a esta visita, ele que mora na Rua da Prata. Ao entrar na sala, o silêncio é quebrado ao abrir a janela, com um ambiente sonoro de veículos a disparar ao passarem ambulância ou camiões.

"Ouve-se muito", comenta Maximien, em especial na sexta-feira e no sábado.
 

Vista da varanda de Maximien

A situação piorou quando, em 2023, a Rua da Prata deixou de ter trânsito automóvel, algo que agradou a Rui Barata - "ficou de facto uma rua muito mais conforável para viver em termos de poluição sonora e atmosférica".

Rui e Maximien começam a rir quando a Antena 1 pergunta se Rui "pediu desculpa pela transferência do trânsito", ao que Rui diz que brincam com essa situação. A Rua da Madalena, da Conceição ou do Comércio são algumas das vias que Rui identifica como penalizadas pela mudança na Rua da Prata. 

Num estudo recente feito pela Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, é identificado que entram na freguesia cerca de 140 mil carros por dia, com a Rua da Madalena a atingir uma média diária superior a 5.800 veículos ligeiros e pesados. 

Os três moradores concordam que falta fiscalização na Zona de Emissões Reduzidas, e, por isso, Maximien fez um teste que leva ele, Rui e Cristina a concluir que a ZER "não existe, não funciona". 

"Fui procurar um carro de um amigo meu que morava em Cascais, um carro mesmo velho, um velho Mercedes, muito bonito, diga-se de passagem", começa por explica Maximien. "Passei várias vezes aqui e nunca houve ninguém que me impedisse de atravessar e de ir para aqui, para a minha casa, com aquele carro", afirma. 

Os três fazem parte da Associação de Moradores e Amigos Santa Maria Maior e não desistem de lutar por uma zona menos barulhenta. Cláudia Felício admite que chegou a procurar casa e, apesar de vários problemas que descreveu de ruído, do comércio ou do espaço público, não hesita: "Gosto muito do centro histórico da cidade".

"Não consigo racionalizar, não consigo dizer, não consigo explicar.", afirma esta moradora na Baixa há quase 20 anos. 

Questionado pela Antena 1 sobre a fiscalização da Zona de Emissões Reduzidas e sobre trânsito na Baixa de Lisboa, o vice-presidente da Câmara Municipal, Filipe Anacoreta Correia diz que a visão do atual executivo passa por limitar o trânsito de atravessamento nesta zona da cidade, antevendo ser possível cortar em 40% na circulação.

No caso da Rua da Madalena, afirma que o objetivo é que esta via seja de trânsito local, requalificando a zona junta à igreja. Para alivar a rua, propõe que a Rua do Ouro ou a Rua dos Fanqueiros passe a ter um sentido ascendente (sul-norte).
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