Para a presidente da Associação Nacional de Professores de Português (Anproport), Rosário Andorinha, "é bem vinda a revisão" do Acordo Ortográfico (AO90) mas lamenta que não se tenham ouvido os alertas lançados desde a sua aplicação.
Revisão do AO90 é bem vinda para Associação Nacional de Professores de Português
Para a Anproport "é bem vinda a revisão naquilo que possa melhorar, mas, paradoxalmente, é lamentável, que passado este tempo todo é que se dê conta, e se tente agora pensar, repensar, e repensar, questões que já haviam sido tocadas por tantas pessoas, algumas de grande dignidade e de grande valor quer académico, quer literário".
Rosário Andorinha falava à agência Lusa a propósito do anúncio feito pela Academia das Ciências de Lisboa (ACL) que vai apresentar ainda este ano um estudo para aperfeiçoar do AO90, sugerindo nomeadamente o regresso à utilização de algumas consoantes mudas.
"Tudo que se puder fazer contra os erros que estavam a ser cometidos em termos de Língua Portuguesa, que é o nosso património, para nós é bem vindo, não sei se será suficiente, e não sei se vamos a tempo de corrigir todo este sistema vocal cada vez mais fechado, sem as consoantes mudas, outras vezes aberto", afirmou a responsável.
Atualmente, disse a presidente da Anproport, repara-se que "nem oralmente, nem por escrito as pessoas conseguem cumprir" o AO90.
"Os alunos estão a colocar acentuação onde não existia", disse a responsável que argumentou que "uma língua não se muda por decreto, nem por lei" e defendeu que "do ponto de vista cívico, da cidadania, uma língua pertence a todos, todos esses que não foram, chamados a dar uma palavra"
A responsável realçou que o AO90 não resultou de "uma alteração e evolução naturais da língua".
"A Anproport tem uma posição de aceitação de tudo o que vier para minorar os efeitos da catástrofe, porque já são muitos, e neste momento estão a cometer-se erros, é bem vindo, mas é muito, muito pouco, porque estas coisas já tinham sido constatadas, até por grandes nomes, de referência", disse.
Rosário Andorinha afirmou que "há que tentar remediar, se é possível, aquilo que não está certo, e não está há muito tempo, e há países que não ratificaram" o AO90.
O presidente da ACL, Artur Anselmo, salientou à Lusa que a instituição não tem qualquer tendência política e que o AO90 é "um problema científico e não político", que deveria ser resolvido definitivamente, e que é utópico impor uma grafia igual em todos os países que falam português.
Ana Salgado, coordenadora do novo dicionário da Academia (que deve estar pronto em 2018), disse também que o acordo não estabelece uma ortografia única e inequívoca, o que permite várias interpretações e, por isso, causa instabilidade. O estudo da Academia pretende acabar com essa instabilidade.
Também em declarações à Lusa, a responsável frisou que a ACL não defende a revogação do AO90, mas sim o seu aperfeiçoamento, sendo que o que propõe são ajustes, como de resto a Academia brasileira já fez também.
A Academia vai, por exemplo, recomendar o emprego do hífen em algumas palavras (fará uma listagem), revelou Ana Salgado, ressalvando que o não emprego do hífen "não quer dizer que seja um erro".
Quanto às consoantes que não se pronunciam a ACL vai defender que elas só caiam nos casos em que há uma grafia única em Portugal e no Brasil (como na palavra `ação`). No entanto, em casos como a palavra `recepção` "a nossa leitura" (da ACL) é que a escrita com o `p` é "legítima no espaço lusófono". Na palavra `optica`, a ACL defende também o uso do `p`.
Ana Salgado lembrou que o AO90 está a ser aplicado no ensino desde 2011 e que muitas crianças poderiam não entender a reposição de consoantes, pelo que o trabalho da Academia é abrir essa possibilidade, uma "via para uniformizar", e deixar que depois a língua evolua.
Artur Anselmo também admite todas as críticas e diz que não faz sentido "abrasileirar" a ortografia do português, como não faz sentido moldá-lo à ortografia de qualquer outro país lusófono.