Diretor-adjunto do Público reitera que Relvas fez “pressões ilegítimas”

por RTP
Miguel Relvas vai responder por escrito à Entidade Reguladora da Comunicação Social, que vai também ouvir a direção e dois editores do Público Tiago Petinga, Lusa

O diretor-adjunto do Público Manuel Carvalho reafirmou ontem à noite, na RTP Informação, que “houve pressões ilegítimas” do ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares para “condicionar o trabalho de investigação” do jornal sobre as relações entre Miguel Relvas e Jorge Silva Carvalho, antigo chefe dos Serviços de Informações Estratégicas de Defesa (SIED). Depois de o PSD ter confirmado que se vai opor à audição do ministro no Parlamento enquanto estiverem em curso as averiguações da Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC), o primeiro-ministro quis afiançar que “não é timbre deste Governo fazer qualquer tipo de pressão”.

“Houve pressões ilegítimas” de Miguel Relvas sobre a jornalista Maria José Oliveira, ameaçada com a “revelação de elementos” da sua “vida privada”, e uma responsável editorial da secção de Política do Público. Esta denúncia foi reiterada na última noite por Manuel Carvalho, diretor-adjunto do jornal. Na RTP Informação, o jornalista reafirmou que o ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares fez dois telefonemas para a redação do diário para procurar condicionar a publicação de notícias sobre as secretas.

“Houve pressões ilegítimas, nós já o referimos por duas vezes, publicamente, em comunicado. Houve pressões ilegítimas por parte do senhor ministro Miguel Relvas, que foram exercidas junto de uma editora da secção de Política, no sentido de travar, ou de influenciar, ou condicionar, o trabalho de investigação que estava a ser feito por uma jornalista da mesma secção, que é uma jornalista que acompanha há meses todas as relações que têm sido noticiadas entre o Governo e nomeadamente o ministro Miguel Relvas e o ex-chefe dos serviços secretos Jorge Silva Carvalho”, repetiu o diretor-adjunto do Público.

“Na semana passada, houve objetivamente dois telefonemas, por parte do senhor ministro, dizendo que, se esse trabalho, entre aspas, pidesco, como ele designou, se essas perguntas pidescas continuassem a ser feitas, foi uma expressão que o senhor ministro utilizou, haveria um blackout de todos os ministros do Governo ao Público, que haveria recursos à Entidade Reguladora da Comunicação Social e aos tribunais, o que não é uma forma de pressão, é um recurso legítimo de qualquer cidadão, sempre que ache que o acompanhamento noticioso por parte de um órgão de comunicação social não obedece às regras”, continuou Manuel Carvalho.

“Agora o que é absolutamente ilegítimo é, por um lado, o blackout do Governo a um órgão de comunicação social como é o Público e, por outro lado, a ameaça de revelação de elementos da vida privada dessa mesma jornalista”, concluiu.
Governo “não faz chantagens”
Num comunicado conhecido na passada sexta-feira, o Conselho de Redação do Público denunciava que Miguel Relvas ameaçara pôr em prática um blackout informativo de todos os ministros do Executivo de Pedro Passos Coelho àquele jornal diário e difundir, através da Internet, elementos da vida privada da jornalista Maria José Oliveira, caso fosse publicada uma notícia sobre “incongruências” nas explicações que o governante deu ao Parlamento sobre as suas relações com o antigo diretor do SIED Jorge Silva Carvalho.

Um comunicado subsequente da direção do Público justificava a decisão de não avançar com a notícia com o argumento de que não haveria “matéria publicável”. O gabinete de Miguel Relvas faria sair uma nota a considerar as notícias sobre este caso “totalmente destituídas de fundamento”, já depois de, contactado pela RTP, ter desmentido “categoricamente” as ameaças denunciadas pelo Conselho de Redação do jornal. No mesmo dia, porém, uma outra nota da direção de Bárbara Reis revelava que o ministro pedira desculpa após “um protesto” do diário.

Nos Estados Unidos, à margem do encerramento da cimeira da NATO, o primeiro-ministro voltou ontem a ser questionado sobre o caso. E tornou a sair em defesa de Miguel Relvas, ao insistir na posição de que “não é timbre deste Governo fazer qualquer tipo de pressão, nem muito menos chantagem, sobre membros da comunicação social”.

“Portugal precisa que cada um assuma as suas responsabilidades, que a imprensa seja responsável e a comunicação social em geral seja responsável pelas notícias que avança e o tratamento jornalístico das notícias, que o Governo governe e que os cidadãos possam observar o comportamento de cada um dos agentes sem interferências ilegítimas. Estou certo que esse é o quadro em que este Governo se move e em que todos os membros deste Governo se movem”, sublinhou Passos Coelho em Chicago.
“Quem não deve não teme”
O PSD, pela voz do vice-presidente do grupo parlamentar laranja Luís Menezes, confirmava ontem a intenção de travar os pedidos de audição de Miguel Relvas na Assembleia da República, por entender que o ministro só deve ser chamado a explicar-se perante os deputados após as averiguações da ERC, cujo início está previsto para quarta-feira.
PS e Partido Ecologista “Os Verdes” manifestaram a intenção de chamar Miguel Relvas ao Parlamento. O PEV pretende também pedir a audição de responsáveis editoriais do Público.

Os comunistas consideraram, por sua vez, que, a ser confirmada a existência de pressões, o ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares “não tem condições para continuar a ser membro do Governo”. Uma posição semelhante àquela que foi assumida pelo Sindicato dos Jornalistas.

O Bloco de Esquerda exige que o caso seja clarificado, uma vez que a liberdade de imprensa não pode ser posta em causa com a “opacidade”.

“Nós queremos que seja averiguada toda a verdade. Confiamos inteiramente na Entidade Reguladora da Comunicação Social para fazer essa averiguação e achamos que não é oportuno, neste momento, trazer o assunto para o Parlamento, a não ser por mera jogada de oportunismo político, e com isso nós não pactuaremos”, afirmou Luís Menezes, em declarações à agência Lusa.

O vice da bancada social-democrata teceu ainda elogios ao ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares por ter “tomado a dianteira neste processo, enviando para a ERC uma série de informação e disponibilizando-se para averiguar tudo o que houvesse para averiguar sobre o mesmo”.

O gabinete de Miguel Relvas já fez saber que o ministro vai responder por escrito à Entidade Reguladora, que vai também ouvir a direção e dois editores do Público.

Também o líder parlamentar do PSD, Luís Montenegro, a acompanhar o Presidente da República na visita de Estado a Timor-Leste, defendeu que o Parlamento deveria esperar pelo desfecho das diligências da ERC.

Para a deputada socialista Inês de Medeiros, a argumentação do PSD “não colhe”. Até porque no passado recente decorreram audições parlamentares sobre o caso do espaço de comentário do jornalista Pedro Rosa Mendes na Antena 1 “em simultâneo” com averiguações da ERC.

“A Assembleia da República e a ERC têm competências diferentes e o Parlamento é o local onde se esclarecem os portugueses. A Assembleia da República não pode ficar limitada por causa de processos que correm na ERC, nem a ERC pode ficar limitada com os trabalhos que decorrem no Parlamento”, advogou à Lusa a vice-presidente do grupo parlamentar do PS, que considerou ainda “pouco plausível que a maioria PSD-CDS venha chumbar audições sobre este caso com o jornal Público, porque quem não deve não teme e o ministro Miguel Relvas deve um cabal esclarecimento sobre o que se passou a todos os portugueses, até para que o ministro exerça o seu cargo sem essa sombra de dúvida a pairar”.
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