Gama antecipa "negociação aturada" na XI Legislatura
A tomada de posse dos 230 deputados eleitos a 27 de Setembro e a recondução do presidente da Assembleia da República selaram esta quinta-feira a abertura da XI Legislatura. Reeleito com os votos favoráveis de 204 parlamentares, Jaime Gama fez a antevisão de "um Parlamento mais vivo", ao passo que a oposição instou José Sócrates a "ouvir" o hemiciclo.
"Isenção, equilíbrio, equidistância, objectividade e bom senso" formam o compromisso de Jaime Gama para a XI Legislatura, que terá como teatro central um hemiciclo "eminentemente plural" e potenciador de uma "negociação aturada".
"Esta será uma legislatura eminentemente plural, o que significa necessariamente um Parlamento mais vivo. E um Parlamento mais vivo é sempre um Parlamento mais forte. Haverá ocasião para afirmação robusta de pontos de vista", antecipou o presidente reeleito da Assembleia da República. Para logo passar a uma descrição das "três funções essenciais" do Parlamento, que "serão exercidas em pleno nesta legislatura": "A fiscalização do executivo, indispensável à vida parlamentar e à vitalidade da democracia, o debate político absolutamente essencial para o aprofundamento da vida democrática e a função legislativa, indispensável para a recondução dos interesses do Estado".
Gama colocou ainda a tónica nas circunstâncias de uma legislatura "profundamente renovada" quer no "plano político", quer na "composição dos parlamentares", salientando o "número significativo de mulheres no Parlamento português e um vasto número de jovens e de políticos que obtiveram neste último sufrágio o seu primeiro mandato nacional". Face à composição do hemiciclo na anterior legislatura, há 105 novos deputados: 35 dos 97 eleitos pelo PS, 48 dos 81 eleitos pelo PSD, dez dos 21 eleitos pelo CDS-PP, oito dos 16 eleitos pelo BE e quatro dos 15 eleitos pela coligação entre PCP e Partido Ecologista "Os Verdes".
"A hora do Parlamento"
Entre as bancadas parlamentares da oposição, o desaparecimento da maioria absoluta socialista foi a nota dominante em todas as intervenções, da direita à esquerda do hemiciclo.
Pelo PSD, o deputado Montalvão Machado lembrou que "os portugueses falaram nas urnas, retirando a maioria absoluta a quem a tinha", pelo que "não basta" ao primeiro-ministro indigitado "anunciar uma tolerância que nunca teve" e uma "simpatia que nunca demonstrou". Na primeira iniciativa parlamentar, os sociais-democratas acusaram o Governo cessante de ter criado um "regime de excepção" para a distribuição de fundos comunitários, tendo em vista "desviar verbas" das "regiões mais pobres" para Lisboa e Vale do Tejo.
Em seguida, o líder parlamentar do CDS-PP renovaria as declarações deixadas na véspera pelo líder do partido, após a reunião com José Sócrates em São Bento. A bancada dos populares, reiterou Pedro Mota Soares, fará uma "oposição leal e convicta", levando sempre em linha de conta "o caderno de encargos do CDS".
"Obrigatoriamente a maioria terá que encontrar compromissos políticos", sublinhou o deputado.
A intervenção dos bloquistas coube a Luís Fazenda, que se referiu à abertura da XI Legislatura como "a hora do Parlamento". Para o líder cessante da bancada parlamentar do BE, a ausência de uma maioria absoluta "devolve centralidade" à Assembleia da República.
Bernardino Soares, pelo PCP, vincou a esperança de que a "situação de maioria relativa" obste à "continuidade das políticas da anterior legislatura". Para "testar" as intenções do PS, a bancada comunista apresentou já esta quinta-feira nove iniciativas legislativas sobre matérias como o Código do Trabalho e a avaliação dos professores.
Os parceiros dos comunistas na CDU, pela voz da deputada Heloísa Apolónia, vaticinaram que o Parlamento vai ter "um papel mais relevante, em que as vozes serão mais plurais e terão mais força".
O socialista Alberto Martins, que em breve será rendido por Francisco Assis na liderança da bancada do PS, devolveu aos partidos da oposição a exigência de "uma nova responsabilidade" face à distribuição de forças do Parlamento: "O país não lhes perdoaria se não fossem capazes de pôr o bem comum acima dos interesses partidários".
Em linha análoga, o ministro dos Assuntos Parlamentares, Augusto Santos Silva, argumentou que "não é a dimensão das maiorias" aquilo que determina o funcionamento da Assembleia da República, antes a "qualidade dos protagonistas e as convicções".
Renúncia, suspensões e substituições
Na sessão de instalação do novo Parlamento, foi ainda aprovado por unanimidade o relatório sobre os poderes e a substituição de deputados, incluindo os 22 membros eleitos do Executivo cessante.
Do lado do PSD, o presidente do Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim, é substituído por Hugo Velosa. Invocando motivos pessoais, o antigo comissário europeu João de Deus Pinheiro renunciou ao mandato de deputado à Assembleia da República, cedendo o lugar ao presidente da JSD, Pedro Rodrigues. António Preto, acusado de falsificação de documento e fraude fiscal qualificada no processo conhecido como "caso da mala", avançou para a suspensão temporária do mandato.
Nenhum dos deputados do CDS-PP, do BE, do PCP e do PEV solicitou a suspensão de mandato.
Deputados elegem vice-presidentes, secretários e vice-secretários
Todos os candidatos a vice-presidentes, secretários e vice-secretários da mesa da Assembleia da República foram também eleitos por maioria absoluta.
O candidato socialista à vice-presidência do Parlamento, Vera Jardim, foi eleito com os votos de 182 dos 230 deputados e 42 votos em branco. O social-democrata Guilherme Silva obteve 165 votos a favor e 55 em branco. A candidata do CDS-PP à vice-presidência, Teresa Caeiro, foi eleita com 169 votos a favor e 55 abstenções. O candidato do BE, Luís Fazenda, colheu a votação menos expressiva, com 137 a favor e 87 em branco.
Foram ainda eleitos secretários da mesa Celeste Correia (PS), Duarte Pacheco (PSD), Abel Baptista (CDS-PP) e Pedro Filipe Soares (BE). Os vice-secretários são Rosa Albernaz e Miguel Coelho, ambos do PS, e Paula Cardoso e Paulo Santos, do PSD.