PS chama secretário de Estado ao Parlamento após abalo das pensões

A aparente dissonância no seio do Governo face às notícias da imprensa sobre subtrações permanentes às pensões, a partir de “fonte oficial” das Finanças, levou nas últimas horas o PS a manifestar a vontade de chamar à Assembleia da República o secretário de Estado da Administração Pública, exigindo que José Leite Martins explique “quais são os cortes provisórios que se tornam definitivos”. Críticos de um Governo que não fala “a uma só voz”, os socialistas sublinham que “os portugueses merecem outro respeito e outra dignidade no exercício das funções públicas”.

RTP /
“É preciso esclarecer estes cortes, agora e rapidamente, depois de toda esta incerteza, desta espiral de incerteza e de contradições”, afirmou o deputado do PS António Gameiro Rafael Marchante, Reuters

“O importante é que o Governo fale verdade aos portugueses”, abreviou o deputado do PS António Gameiro, a voz escolhida pelo braço parlamentar do maior partido da oposição para orientar holofotes na direção de José Leite Martins, secretário de Estado da Administração Pública e responsável pela coordenação do grupo de trabalho que está a preparar a reforma dita estrutural dos sistemas de pensões.

Também ouvido pela agência Lusa, o mesmo deputado do PS frisou que “os portugueses precisam que esta espiral de medo e de incerteza pare”. E que o Governo torne claro “que rendimento os portugueses podem esperar ter para o ano 2014 e para o ano 2015”.

Em declarações à Antena 1, António Gameiro enunciou as “três ou quatro coisas muito simples” que os socialistas querem ver aclaradas em audição parlamentar: “Que cortes vão acontecer, quais são os cortes provisórios que se tornam definitivos, que outras medidas vão tomar e qual é o momento em que os portugueses ficam a saber a verdade para poderem ter estabilidade na sua vida, saberem com o que contam para o seu dia-a-dia”.

“Porque para nós, para o PS, é importantíssimo que os portugueses saibam como é que podem pagar mensalmente a sua casa, o seu carro, a sua água, a sua alimentação, a sua luz”, reforçou o parlamentar socialista.

Associando assim o nome de José Leite Martins às notícias ontem publicadas pela generalidade da imprensa portuguesa e pela Lusa, António Gameiro acentuaria que “é preciso esclarecer” o escopo dos eventuais cortes a aplicar nos próximos anos: “Agora e rapidamente, depois de toda esta incerteza, desta espiral de incerteza e de contradições”.
“Organizem-se”
Foi durante um “encontro informal” no Ministério das Finanças - segundo uma nota entretanto difundida pelas direções dos jornais Diário Económico, Público, Diário de Notícias, Jornal de Notícias, Correio da Manhã, da publicação eletrónica Dinheiro Vivo e da agência Lusa – que, a coberto do anonimato, um elemento da equipa de Maria Luís Albuquerque deu conta dos cenários que estariam já sobre a mesa do Conselho de Ministros de segunda-feira para cortes permanentes nas pensões da Caixa Geral de Aposentações e da Segurança Social.
A rádio Renascença noticiou ontem que foi do secretário de Estado da Administração Pública que partiram as informações disseminadas pelos jornais. Uma iniciativa, lê-se na edição online daquela emissora, que “apanhou de surpresa o Governo”.

Na sequência desse encontro, o que surgiu nas páginas da imprensa foi a possibilidade de o Governo vir a indexar os montantes das pensões de reforma a fatores económicos e demográficos, já com números inscritos no Documento de Estratégia Orçamental que o Governo discutirá em reunião extraordinária.

Ao início da tarde, a meio da visita oficial a Moçambique, o próprio primeiro-ministro saía a público para negar que o Executivo tivesse “em cima da mesa”, nesta fase, qualquer discussão de cortes adicionais de salários e pensões. Também para enfatizar que o debate em Portugal “podia ser mais sereno e mais informado”. E expressar a expectativa de que “os membros do Governo contribuam também para isso”.

Para o PS, impõe-se que os membros do Executivo intervenham no espaço público “a uma só voz”. Para que se perceba, nas palavras do deputado António Gameiro, se a maioria está mesmo disposta “a fazer depender os rendimentos de cada um da evolução da economia, quando as contribuições mensais também não dependem dessa evolução, dependem sempre de uma taxa fixa, prevista em lei, de descontos”.

“Mas veremos se isso é verdade, porque o senhor primeiro-ministro aparentemente desmentiu que isso fosse verdade, que era apenas um rumor, e portanto mandou recados para o próprio Governo, no sentido de calem-se. Nós dizemos deste lado: organizem-se, porque de facto os portugueses merecem outro respeito e outra dignidade no exercício das funções públicas”.
“Sigilo sobre a fonte e não sobre o assunto”

Na nota ontem assinada, as direções dos jornais em questão e da Lusa quiseram também rebater afirmações do ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares de que as notícias de cortes permanentes nas pensões seriam exercícios de manipulação.

“Se os jornalistas entenderam transformar uma conversa em off sobre um ponto de situação num dado adquirido, eu não chamaria a isso fuga de informação, chamaria, quando muito, manipulação de informação”, reagiu Luís Marques Guedes em conferência de imprensa, após a reunião semanal do Conselho de Ministros.

Os responsáveis pelos órgãos de comunicação social salientam, na nota conjunta, ter sido “convidados para um encontro informal no Ministério das Finanças”, rejeitando “as afirmações a propósito deste tema do porta-voz do Governo, o ministro Marques Guedes”.

“O tema da reunião seria a convergência de pensões. Durante o encontro, foi referido que os temas abordados e discutidos poderiam ser noticiados, mas sem serem atribuídos a nenhum responsável, apenas a fonte do Ministério das Finanças. Os temas tratados, com embargo de divulgação até à meia-noite de quarta-feira, acabaram por fazer a manchete da maioria dos títulos de imprensa de quinta-feira”, refere o texto.

As direções sustentam ainda que “cumpriram todas as regras da profissão, bem como o acordo feito, em coletivo e na presença de todos, com o membro do Governo que convidou os jornalistas”.
PUB