Acender uma vela a um santo com o telemóvel

por Nuno Patrício, Sara Piteira - RTP
Sara Piteira - RTP

Acender uma vela numa igreja, com um fósforo ou mesmo um isqueiro, pode já ser coisa do passado. Isto porque uma aplicação para telemóveis de última geração – os smartphones – consegue dar ordem para que, do outro lado, se acenda uma luz.

A ideia surgiu há uns anos, quando dois dos três elementos que desenvolveram a aplicação estavam em Nova Iorque, numa igreja católica, e pensaram como seria engraçado poderem acender uma vela a determinado santo mesmo fora do seu espaço físico.

A ideia luminosa ganhou asas e, já em Portugal, foi dada a conhecer a uma startup da Universidade de Aveiro. Foi assim desenvolvido e criado um protótipo."Através do aplicativo, eu consigo acender uma vela real, neste velário, quer esteja aqui na igreja, quer esteja noutro ponto do planeta", refere José Manuel Pimenta, um dos mentores da Candla.

Nascia a primeira vela acesa através de uma ordem dada por um telemóvel, como explicou à RTP João Manuel Pimenta.

"Ao regressar apresentámos esta ideia a engenheiros da Universidade de Aveiro e foi quando desenvolvemos um pequeno protótipo, como uma caixa, com uma pequena lâmpada e que essa lâmpada se acendia através de um aplicativo muito rudimentar".

O sistema encontra-se já implementado em 16 igrejas em Lisboa, mas para se chegar a este acordo houve primeiro conversações com membros da Igreja Católica, principalmente com o padre Mário Rui, que ajudou não só à implementação mas também na melhoria do próprio sistema de utilização.

E tudo funciona de forma muito simples, explica José Manuel Pimenta: "Através do aplicativo, eu consigo acender uma vela real, neste velário, quer esteja aqui na igreja, quer esteja noutro ponto do planeta. Por exemplo, posso, como atualmente acontece fazer compras através do telemóvel ou do tablet, acender uma vela aqui na igreja, mas se eu for emigrante ou turista e voltar para a minha terra poder voltar a acender uma vela".

Um sistema moderno que não espanta os mais crentes entre os crentes, como frei Francisco Sales, reitor do Santuário de Santo António, em Lisboa.

"Para mim não é estranho porque vivemos na época digital e hoje podemos dizer que se inventa tudo e mais alguma coisa. (…) Nós recebíamos via correio, muita gente que nos enviava dinheiro para missas e até para promessas e etc. a Santo António, acho que é um meio muito bom, ótimo que as pessoas possam, onde estiverem, pagar a sua promessa".

Uma vela acesa e uma oração
Quando dá ordem para acender uma vela a aplicação informa que o processo foi bem sucedido. Após essa informação, dá-lhe ainda uma oração para poder rezar.

Se julga que por falta de luz, ou por avaria do sistema, a ordem para acender a vela ficou pelo caminho, desengane-se. O sistema informático está programado para eventualidades como a quebra de energia ou mesmo a avaria do velário.

Todos os pedidos ficam registados. E o programa informático concretiza mais tarde todas as ordens de acendimento, após as condições normais serem restabelecidas.
Uma vela sem cera ou pavio
Como é que um telemóvel consegue acender uma vela dita real? É aqui que entra a tecnologia e a modernidade. Isto porque estas velas já não são de cera e pavio, também designadas por coutos, que pontualmente ainda se usam quando falta a luz em casa.

São na verdade velas cilíndricas e acrílicas. O pavio é substituído por dois fios elétricos e a chama, essa, é representada por uma lâmpada led de baixo consumo.

"Este projeto é a terceira via, ou uma terceira maneira de acender velas. A primeira era a tradicional vela de cera, que se acendia com um fósforo. A segunda foi uma vela elétrica com uma moeda e esta é a terceira via, ou seja, é um novo dinamismo que se cria através da vela que se acende através do aplicativo".

Um património a proteger
O abandono progressivo das tradicionais velas de cera e pavio, em que a chama representa a luz a Deus, tem-se registado ao longo dos anos em todas as igrejas a nível mundial. Portugal não é exceção.

Esta opção decorre não só de questões de economia, mas também do perigo das velas tradicionais.

Em conversa com a RTP, frei Francisco Sales, reitor do Santuário de Santo António, em Lisboa, explica que as igrejas são portadoras de obras de arte únicas e muitas delas em madeira, um material inflamável.

Frei Sales alerta ainda que, para além das estatuetas, muitos dos frescos existentes nas paredes ficariam danificados pelo fumo proveniente das velas e a solução para manter esta coabitação da luz sem riscos, as velas elétricas, são elementos naturais para continuar a expressar a fé.

"A palavra aleluia significa precisamente luz, é o cântico das luzes. As pessoas, na sua tradição cristã católica e não só, sempre ligaram a sua relação com Deus através da luz, através da vela, através da iluminação, porque isto vem de Deus. Agora eu penso que este sistema é ótimo e foi por isso que nós aqui na igreja optámos por substituir os sistemas antigos por este".

Mais de mil luzes em três meses
Apesar de estar em funcionamento há pouco mais de três meses, este sistema já acendeu mais de um milhar de velas.




De nome Candla, a aplicação pode ser descarregada da Internet e instalada num smartphone. Permite ao utilizador acender uma ou mais velas, à hora e dia que quiser, nas igrejas onde o sistema está implementado.

São já 16 as igrejas que aderiram a este sistema inovador, para já só em Lisboa, mas João Manuel Pimenta explicou à RTP que ainda este semestre estes velários elétricos, com 60 velas cada, vão estar presentes em Braga e no Porto.


A internacionalização também faz parte do futuro da Candla. Madrid, Roma e América Latina são os destinos em discussão. Espera-se que a exportação aconteça ainda este ano.

A aplicação pode ser descarregada gratuitamente e oferece a possibilidade de acender três velas. As restantes têm um custo de 99 cêntimos.

Acender uma vela verdadeira passa a ser quase tão simples como fazer uma chamada de telemóvel.
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