Os avultados salários fizeram Portugal acordar novamente para a Caixa Geral de Depósitos. No entanto, as críticas e preocupações extravasam a questão salarial, agora que se sabe que os administradores do banco estão isentos de algumas regras de transparência a que estavam sujeitos os seus antecessores. O PS está isolado nos assuntos da Caixa mas apresenta-se difícil uma união de PSD, CDS-PP, BE e PCP para fazer vergar a visão socialista.
O salário de António Domingues divide a maioria parlamentar de esquerda e, em termos teóricos, une o PSD, o Bloco de Esquerda e o PCP. O PS aparece isolado nesta questão, o que não significa que os restantes partidos consigam entender-se para limitar os salários.
Afinal, se todos consideram que 432 mil euros anuais para o gestor da Caixa Geral de Depósitos é um montante elevado, têm visões diferentes do que será um valor justo.
Quanto deve ganhar Domingues?
PSD, PCP e BE apresentam-se a favor da limitação dos salários dos gestores da Caixa Geral de Depósitos, o que totaliza, pelo menos, uma maioria de 123 deputados contra a posição do Governo. Mesmo assim, torna-se difícil que os três partidos consigam unir-se em torno de uma proposta e de um valor.
Afinal, o PCP até já apresentou uma proposta nesse sentido. O projeto comunista passava por limitar os salários na Caixa a 90 por cento do auferido pelo Presidente da República - o que daria um salário próximo dos seis mil euros.
A proposta foi chumbada na passada quarta-feira por PSD e PS na Comissão de Orçamento e Finanças, tendo merecido o voto favorável de PCP, BE e CDS-PP. O projeto comunista passava por limitar os salários na Caixa a 90 por cento do auferido pelo Presidente da República - o que daria um salário próximo dos seis mil euros.
O Bloco de Esquerda deverá apresentar uma proposta para que o salário dos administradores da Caixa Geral de Depósitos esteja alinhado com o do Presidente da República, refere o Jornal de Negócios.
A proposta assemelha-se à que foi apresentada pelo PCP e que foi chumbada por PSD e PS. Para os social-democratas, não faz sentido indexar o salário dos gestores ao salário dos políticos.
"Não entramos em demagogias e achamos que o limite não pode ser para estes casos aquilo que é para os titulares dos cargos políticos, porque quem concorre está a disponibilizar-se e sabe quais são as regras, é diferente do recrutamento", defendeu Duarte Pacheco na quarta-feira.O anterior regime não escapa a críticas: dá lugar a uma grande diferença salarial entre pessoas que podem ter funções equivalentes.
O PSD deverá apresentar um projeto de lei para limitar os salários na Caixa Geral de Depósitos. O regime anteriormente em vigor punha como teto máximo o salário médio auferido por esse mesmo administrador nos últimos três anos.
Este enquadramento permitia ultrapassar a fasquia do salário do primeiro-ministro e contratar administradores, que assim ficavam com um salário igual ou próximo daquele que ganhavam nas funções que exerciam anteriormente.
Mas o anterior regime não escapa a críticas: dá lugar a uma grande diferença salarial entre pessoas que podem ter funções equivalentes.
Costa não arrisca má gestão
O PS apresenta-se como único defensor do atual regime e do fim da limitação dos salários dos gestores da Caixa Geral de Depósitos. O primeiro-ministro diz não querer arriscar a “má gestão”. O deputado socialista João Paulo Correia garante que os valores estão na média dos praticados pelos grandes bancos portugueses e concorrentes da Caixa.
Apesar de ter promulgado o diploma, o Presidente da República apresenta críticas aos salários da Caixa Geral de Depósitos. Marcelo Rebelo de Sousa afirma que “não é possível nem desejável” pagar o mesmo valor que aos administradores de um banco privado e defende que a remuneração deve “atender ao resultado da gestão”.
O Chefe de Estado não deixou de recordar que, quando os bancos privados receberam dinheiros públicos, os vencimentos da administração foram cortados.
Que declarações devem entregar?
O mesmo protagonista, o mesmo negócio, outra polémica. O alerta foi deixado por Marques Mendes no comentário dominical na SIC e pegou na atualidade nacional. O ex-líder social-democrata referiu que o Governo excecionou os dirigentes da Caixa Geral de Depósitos do Estatuto do Gestor Público.
“Das duas uma: ou isto é um lapso e tem de ser corrigido, ou isto é intencional e é gravíssimo”.
Uma exceção que poderá ser explicada pelo objetivo de isentar os gestores do banco público dos limites de remuneração previstos, mas que abre alas a outra polémica: os dirigentes ficam também isentos de um conjunto de obrigações de transparência.
“Das duas uma: ou isto é um lapso e tem de ser corrigido, ou isto é intencional e é gravíssimo”, afirmou Marques Mendes. A alteração iliba os gestores da Caixa de entregarem uma declaração de património e rendimentos na Procuradoria-Geral da República e na Inspeção-Geral de Finanças.
Marques Mendes mencionou também que, com esta legislação, os gestores não precisam de entregar declarações no Tribunal Constitucional, mas o Público recorda que uma lei obriga todos os gestores públicos em empresas do Estado a entregarem a declaração de rendimentos no Palácio Ratton.
BE e PSD querem mais transparência
O Bloco de Esquerda, pela voz da coordenadora Catarina Martins, já disse que está contra esta alteração, uma posição também partilhada com o PSD. Na segunda-feira, o Expresso avançou que os social-democratas já preparam uma iniciativa legislativa para que esta situação seja corrigida.
A edição de terça-feira do Público dá mais alguns pormenores, com os social-democratas a quererem avançar com alterações a grande parte da legislação. A proposta do PSD deverá avançar com uma nova limitação dos salários, avançar com um período de nojo para ex-administradores e reforçar as obrigações de transparência.
Reportagem de João Vasco - Antena 1
O diário avança que o partido quer que os gestores tenham de especificar que participações têm em empresas concorrentes. Em aberto, a possibilidade de António Domingues ter participações no BPI, banco no qual esteve 27 anos e do qual saiu para assumir a liderança da Caixa Geral de Depósitos.
Capitalização e informação privilegiada
A trilogia da Caixa Geral de Depósitos conta ainda com a troca de declarações entre Pedro Passos Coelho e António Domingues. Em causa a preparação do processo de capitalização da Caixa Geral de Depósitos quando o atual líder da Caixa ainda estava no BPI e o eventual acesso a informação privilegiada.
A novela começa com a entrevista de Pedro Passos Coelho ao jornal Público. O ex-primeiro-ministro critica a forma como o processo da Caixa Geral de Depósitos foi gerido e reprova que o Governo siga "um processo de reestruturação preparado por quem nem era ainda administrador do banco”.
O líder social-democrata acusa ainda António Domingues de ter tido acesso a “toda a informação privilegiada” do banco público, antes de ter qualquer vínculo com a instituição.
“Ou o plano de recapitalização não teve informação adequada e é uma mistificação política” ou António Domingues “teve acesso a informação e não está a desmentir o que eu disse”.
A entrevista de Pedro Passos Coelho merece resposta escrita do presidente da Caixa, revelada na sexta-feira.
Na missiva, António Domingues acusa o líder do PSD de faltar à verdade, afirmando que nunca teve acesso a informação privilegiada antes de assumir a liderança do banco.
O administrador garante que a “informação pública disponível era suficiente para a elaboração do plano”. A resposta de Domingues não convence Passos.
No sábado o ex-primeiro-ministro insiste que o plano de recapitalização não pode ser desenhado apenas com informação pública e apresenta duas possibilidades.
“Ou o plano de recapitalização não teve informação adequada e é uma mistificação política” ou António Domingues “teve acesso a informação e não está a desmentir o que eu disse”, explicou.
O presidente do PSD pede ao Executivo que dê “explicações cabais” sobre o plano de recapitalização e mantém a crítica. “Se é para andar a atirar areia para a cara das pessoas, não valia a pena estar a pagar aos novos administradores o dobro do que pagavam aos outros administradores”, frisa.
António Domingues vai ao Parlamento na quarta-feira para um encontro com o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues. De momento, a Comissão Parlamentar de Inquérito à Caixa Geral de Depósitos segue suspensa devido à discussão do Orçamento do Estado.