Sócrates anuncia folga de 800 milhões nas contas públicas

por RTP

As contas preliminares da execução orçamental de 2010 revelam uma folga de 800 milhões de euros nas contas do Estado. O anúncio destes números foi feito pelo primeiro-ministro José Sócrates, que, acompanhado pelo ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, garantiu que o défice ficará abaixo dos 7,3% e aproveitou a ocasião para rejeitar veementemente a possibilidade de o seu Governo vir a pedir a ajuda do Fundo Europeu e do FMI.

Sem avançar com os números do défice, o primeiro-ministro anunciou três dados que, apesar de preliminares, já estarão practicamente fechados: despesa do subsetor Estado nos 1,7%, abaixo dos 2,5% previstos no Orçamento; o crescimento das receitas em 5,3%, quando o OE previa 4,5% e um saldo nas contas da Segurança Social na ordem dos 720 milhões de euros, face aos 605 milhões inicialmente apontados.

Somadas as parcelas, são 800 milhões de euros de saldo nas contas do Estado que representam 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto),  que leva o primeiro-ministro a considerar que "os dados principais do Orçamento do Estado para 2010 superam as nossas expetativas. O apuramento final não está feito, mas estes dados são reveladores".

No que respeita a valores concretos do défice de 2010, este foi um dado que nem o chefe do Governo nem o titular da pasta das Finanças adiantaram. A referência ficou a cargo de Sócrates: "Partimos para uma boa expetativa para o resultado final do nosso défice, sendo que estes três dados que já estão fechados e que constituem os aspectos principais nos dão claramente a ideia de que o Estado português não só vai cumprir e ficará abaixo da meta orçamental de 7,3, como vai ficar abaixo desse valor quando o valor final do défice for finalmente apurado".

"FMI são rumores e especulações que não ajudam o país"
Quanto a rumores de ajuda externa e recurso ao apoio do FMI, Sócrates apontou três razões para que sejam afastados do cenário português.

Em primeiro lugar, o primeiro-ministro sustentou que "o país está a fazer o seu trabalho e está a fazê-lo bem", considerando que o anúncio destes números será "porventura" o primeiro sinal de estímulo dado pelo Governo aos mercados e aos investidores internacionais.

Por outro lado, Sócrates defende que Portugal "não pedirá ajuda financeira pela simples razão que não é necessária" e garante que "o país tem capacidade para se financiar no mercado".

Por último, o chefe do Governo pediu contenção à utilização do fantasma do FMI pelo contendores políticos, lembrando que se trata de "rumores que não ajudam o nosso país e só ajudam os especuladores que agem contra Portugal".

Em entrevista à TSF, esta manhã, Teixeira dos Santos já havia sublinhado a sua convicção de que não será necessário a Portugal avançar com esse pedido de ajuda externa.

"Não antevejo essa eventualidade", apontou o ministro das Finanças, para juntar que o país está a "fazer o seu trabalho" e o Governo "está motivado para evitar" o recurso ao Fundo de Estabilidade Europeu (FEE).

Europa não está a trabalhar para a estabilidade do euro
"Portugal está a fazer tudo para resolver o desequilíbrio financeiro", deixou Teixeira dos Santos para lançar uma crítica inédita aos organismos europeus: "A Europa é que parece não estar a fazer o seu trabalho para manter a estabilidade do euro".

Para memória futura fica a apreciação de Teixeira dos Santos acerca de uma rota portuguesa a passar pelo auxílio do FEE e do FMI: Causaria "um dano reputacional muito significativo sobre o país (que) levaria anos a recuperar".

Quarta-feira é o dia D mas isso não enerva o ministro
Dentro de 24 horas o Governo lança um leilão de dívida pública com valor de referência entre 750 milhões de euros e 1250 milhões de euros e que está a ser visto pelos especialistas como o momento decisivo para o futuro das finanças portuguesas.

Com a garantia de que a chegada de quarta-feira não o deixa nervoso, Teixeira dos Santos garante não estar nervoso mas não deixa também de sublinhar que "as condições do mercado agravaram-se mas temos tido procura mais que suficiente para colocar a nossa dívida - é certo que a uma taxa de juro elevada".

Teixeira dos Santos assegura no entanto que Portugal ainda tem margem para pagar juros elevados, já que "a taxa média ainda é relativamente baixa".

Hoje, os juros da dívida soberana a dez anos estavam novamente a ser negociados nos 7%, acima da média de ontem (6,979%), mas já abaixo dos máximos históricos então atingidos: pouco antes das 9H00 estavam nos 7,012%.

Nas obrigações a cinco anos os juros estavam nos 6,001%, também acima dos valores de segunda-feira (5,938%).

Silêncio sobre participação chinesa
No arranque da semana o BCE (Banco Central Europeu) foi ao mercado adquirir dívida portuguesa e irlandesa, de acordo com a agência Bloomberg com base em três operadores de mercado.

Questionado sobre a compra mil milhões de euros de dívida pública portuguesa por parte de Pequim, Teixeira dos Santos esquivou-se à pergunta sublinhando que a venda direta de dívida implica um negócio entre duas partes, "operações de natureza bilateral", sendo que muitas vezes os compradores não chegam a revelar a identificação.

Portugal recebe a visita dos especialistas da União
Numa semana que está a ser marcada por um calendário decisivo para o a governação, Portugal recebe hoje a Comissão Especial do Parlamento Europeu para a Crise Financeira, Económica e Social, que deverá abordar com o Governo, parceiros sociais e outros setores a realidade portuguesa.

Esta equipa arranca em Portugal uma série de visitas agendadas aos Estados-membros da União, seguindo na quarta-feira para Madrid, e depois Dublin e Atenas.

Em Portugal, a comissão vai encontrar-se os ministros das Finanças, Teixeira dos Santos, e da Ciência e Ensino Superior, Mariano Gago. Estão também agendadas reuniões com diversas comissões parlamentares, várias PME, o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, e parceiros sociais (UGT, CGTP, CCP, CTP e CAP) e da indústria (CIP, AEP, AIP e ACEGE), de acordo com a listagem da Agência Lusa.

A eurodeputada socialista Elisa Ferreira explicou que esta ronda pela Europa obedece ao objetivo de "conhecer melhor a realidade de cada país".

Na mesma linha de análise de Teixeira dos Santos, e no que pode ser entendido como um recado às autoridades europeias, a eurodeputada socialista insistiu nessa ideia de que a questão portuguesa deve ser enfrentada de forma mais global porque é a própria Zona Euro o que está em perigo nesta crise financeira.

Portugal é "a pedrinha que segura o dique" da estabilidade da Zona Euro, considerava ontem Elisa Ferreira em declarações à Lusa: "Portugal é um elemento relativamente pequeno a nível europeu, mas o seu papel neste contexto ultrapassa a sua dimensão nacional, porque é a última linha de defesa" antes de os mercados se lançarem à Espanha e à Itália.
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