Promessas de Donald Trump: o que vai mudar nos Estados Unidos?

por Christopher Marques - RTP
Kevin Lamarque - Reuters

Durante meses a fio, Hillary Clinton e Donald Trump protagonizaram a mais violenta campanha presidencial de que há memória nos Estados Unidos. Surpreendentemente, Trump ganhou as eleições e já limou algumas arestas ao seu discurso. Hillary Clinton não deverá ir parar à prisão e o Obamacare até tem medidas positivas. Há imigrantes que são mesmo para deportar e o muro é para avançar.

No entanto, o muro que Donald Trump quer erguer na fronteira com o México poderá ser constituído parcialmente por vedações. No caso da deportação de imigrantes há também mudanças.

O candidato quer expulsar “imediatamente” dois a três milhões de clandestinos que terão cometido crimes e deixa em aberto o que acontecerá aos restantes.
Deportação de imigrantes
Ao longo dos últimos meses, Donald Trump adotou muitas vezes um discurso xenófobo, prometendo deportar todos os imigrantes ilegais – grupo que poderá chegar aos 11 milhões.

Eleito sucessor de Barack Obama, o próximo chefe de Estado dos Estados Unidos prometeu deportar para já dois a três milhões de imigrantes ilegais. O número vem somar-se às deportações que já ocorreram nos últimos anos.

A própria Administração Obama, entre 2009 e 2015, deportou mais de 2,5 milhões de pessoas. Segundo a ABC News, foi mesmo sob a presidência de Barack Obama que mais imigrantes foram deportados, tendo sido privilegiada a deportação de criminosos e deixando de fora crianças e famílias.

"Expulsá-los do país ou detê-las"

Na entrevista concedida ao “60 Minutes” da CBS News, Donald Trump manteve o objetivo de deportar imigrantes ilegais, num mecanismo aparentemente semelhante ao que tem sido privilegiado por Barack Obama.

“Vamos pegar nas pessoas que são criminosas e têm cadastro, membros de gangs, traficantes de droga. Há muita gente dessa, provavelmente dois milhões, poderão até ser três milhões. Vamos expulsá-las do país ou detê-las”, frisou o Presidente eleito.

Sérgio Vicente, Luís Vilar - RTP

No entanto, Donald Trump não especificou que medidas tomará em relação à maioria dos imigrantes ilegais - contra os quais Barack Obama pouco fez. Em 2015, mais de 90 por cento dos imigrantes ilegais deportados tinham sido já previamente condenados.

Na entrevista à CBS, Donald Trump não esclareceu que medidas tomará. O Presidente eleito referiu apenas que uma decisão será anunciada “depois de a fronteira estar segura e de tudo estar normalizado”.

A quantidade de imigrantes ilegais a serem deportados por Donald Trump está ainda dependente do que, numa primeira fase, será abrangido na categoria “criminoso”.

Que crimes?


A imprensa norte-americana dá conta de que a máquina de deportações de Obama era já eficiente, apontando-se que houve clandestinos deportados por terem cometido pequenos crimes como a venda de cartões telefónicos ilegais. Barack Obama chegou mesmo a ser apelidado de "Deporter in chief".

Donald Trump poderá fazer uso da política de Barack Obama para aumentar a quantidade de imigrantes clandestinos deportados, podendo mesmo aliá-la a táticas da era Bush como, por exemplo, operações policiais em empresas onde trabalhem clandestinos.


As recentes movimentações de Donald Trump não deixam bom augúrio para os 11 milhões de clandestinos que vivem nos Estados Unidos.

O Presidente eleito nomeou Kris Kobach para a sua equipa de transição, um republicano conhecido pelas suas controversas medidas de combate à imigração ilegal. A equipa do próximo Presidente conta ainda com Stephen Bannon, associado a posições racistas e antissemitas.

Donald Trump iniciou também contactos com a extrema-direita europeia, nomeadamente com a francesa Marine Le Pen e o britânico Nigel Farage.
O muro do México
É uma das promessas mais simbólicas de Donald Trump e uma das que mais ecoaram durante a campanha. O Presidente eleito garantiu que irá construir um muro na fronteira entre o México e os Estados Unidos, tendo ainda sublinhado que seria o México a pagar a obra.

Eleito Presidente, o magnata não muda de opinião mas adapta o discurso. Na primeira entrevista televisiva concedida depois da eleição, Donald Trump admitiu que parte do muro seja afinal uma vedação, da qual já se tem ouvido falar no Congresso.

“Em algumas zonas, eu aceitaria [uma vedação]. Mas há certos locais em que o muro é mais apropriado. Sou muito bom nisso, chama-se construção”, frisou o Presidente eleito na entrevista à CBS.

A ideia de construir um muro na fronteira entre o México e os Estados Unidos não é nova, e uma barreira já separa parte dos dois países.

A fronteira entre os Estados Unidos e o México tem 3.201 quilómetros, havendo já barreiras em cerca de mil quilómetros. Mesmo assim, a ter em conta as declarações iniciais de Donald Trump, estas barreiras seriam substituídas por um “verdadeiro muro”.

A concretização do muro apresenta-se como uma obra megalómana, cujo preço final é muito variável. O Washington Post prevê uma fatura que pode chegar aos 25 mil milhões de dólares, mas o custo poderá ser ainda superior.

Há que ter em conta as dificuldades em construir um muro em alguns dos locais que a fronteira atravessa – montanha, deserto, rios – e a compra de terrenos ou eventuais custos com expropriações. Afinal, a fronteira entre os dois países é incrivelmente extensa: é quase como se fosse construído um muro à volta de toda a Península Ibérica para a separar do mar.

Em julho, uma sondagem da Gallup indicava que a maioria dos norte-americanos (66 por cento) se opõe à construção de um muro na fronteira. No entanto, a maioria dos republicanos inquiridos apresentava-se favorável à construção.
Hillary Clinton para a cadeia?
A campanha foi longa e o ataque a Hillary Clinton foi cerrado. A polémica dos emails foi um dos cavalos de batalha usados por Donald Trump no ataque à adversária democrata. O candidato republicano afirmou que nomearia um procurador especial para investigar a situação, dizendo mesmo que Clinton seria presa caso fosse eleito.

O discurso de Donald Trump sobre Hillary Clinton moderou-se logo depois de ter sido confirmada a vitória do republicano nas eleições. O magnata até elogiou a ex-secretária de Estado, tendo mantido os elogios na entrevista à CBS.

Questionado sobre se realmente nomeará um procurador especial, Donald Trump disse que pensaria no assunto, referindo querer agora focar-se na criação de emprego e na política migratória.

Confrontado pela jornalista Lesley Stahl, o Presidente eleito manteve que Clinton cometeu erros mas não especificou se cumpriria a promessa de prender Hillary Clinton, um objetivo que tanto fazia delirar os seus apoiantes durante a campanha. Por enquanto, Donald Trump nada promete fazer contra a família Clinton.

“Não quero magoá-los. Eles são boas pessoas, não quero magoá-los. Dar-lhe-ei uma resposta muito, muito boa e definitiva da próxima vez que fizermos o '60 Minutes' juntos”, referiu o candidato.
Obamacare
Durante a campanha, Donald Trump não se ficou por meias palavras. No que diz respeito à reforma de saúde levada a cabo por Barack Obama, o candidato republicano garantiu tratar-se de um “desastre total”, prometendo pedir a sua anulação ao Congresso quando chegasse à Casa Branca.

Quando chegar à Presidência, Trump encontrará um terreno favorável para acabar com o Obamacare: lidera a Casa Branca e os republicanos controlam a Câmara dos Representantes e o Congresso.

Mas Donald Trump apresenta agora um discurso mais brando. O 45º Presidente dos EUA admite manter algumas das medidas do programa de saúde promovido pela Administração Obama.

Entre elas está a obrigatoriedade de as seguradoras aceitarem pacientes que já têm doenças prévias. “É uma das mais-valias mais fortes” da reforma, afirma o Presidente eleito.

O próximo chefe de Estado da primeira potência mundial aponta ainda outro aspeto do Obamacare com o qual concorda: a possibilidade de os filhos poderem usufruir do seguro de saúde dos pais até aos 26 anos.

Donald Trump promete também que não haverá nenhum período de transição sem que um programa como o Obamacare esteja em vigor. Ou seja, a reforma de Obama só será anulada quando o seu substituto estiver pronto.

O Obamacare – oficialmente Affordable Care Act – instaurou o seguro de saúde universal. O sistema coloca o Estado a financiar as famílias com menos recursos e que não têm acesso a um seguro de saúde público, permitindo-lhes aceder à oferta privada. O Governo torna ainda obrigatório a subscrição de um seguro de saúde, privado ou público.

O programa não está, no entanto, isento de críticas. Empresários e responsáveis de pequenas empresas queixam-se de não conseguirem obter apoios públicos e de se verem confrontados com o aumento de preços na oferta privada.
Ambiente, aborto e armas
O tema não foi abordado na entrevista ao “60 Minutes”, mas a Reuters avança que Donald Trump quer que os Estados Unidos se desvinculem do Acordo de Paris antes do fim do período de quatro anos que Washington está forçado a cumprir.

A agência noticiosa cita fonte próxima da equipa de transição de Trump, que afirma ter sido “imprudente” a entrada em vigor do novo acordo ambiental antes das eleições presidenciais.

O Acordo de Paris pretende conseguir manter o aumento da temperatura média mundial abaixo de 2°C, estando destinado a ser o sucessor do Protocolo de Quioto.

No entanto, Donald Trump sempre se apresentou cético em relação às alterações climáticas. Para o republicano, trata-se de um “mito” inventado pelos chineses para prejudicar a competitividade da economia norte-americana.

Pedro Oliveira Pinto - RTP

Oposto também num outro aspecto à política de Barack Obama, o presidente eleito dos Estados Unidos declarou que vai nomear, para o Supremo Tribunal, juízes contra o aborto e favoráveis à posse de armas de fogo.

Donald Trump garantiu que não pretende recuar no princípio do casamento homossexual, considerando a questão fechada.
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