Ciclismo, futebol, massa e amor à camisola

O futuro próximo explicará se o ciclismo lucra com o regresso de Porto e Sporting (e eventualmente o do Benfica) ao pelotão. Os entusiastas do SIM afirmam que a modalidade ganhará capacidade de captar patrocínio, muito maior retorno mediático e mais público.

Alimenta-lhes o sonho um presente sufocado pelo financiamento. Feito de ordenados mascarados de subsídios de sobrevivência, muitos deles apenas prometidos e mal cumpridos. Ou seja: otimismo movido a necessidade de sobreviver.


Todos sabem que há muita massa no ciclismo. Dividida em géneros: para os que pedalam é aquela que se vende nos supermercados. Consome-se logo. Os responsáveis das equipas e organizadores contam ao cêntimo os trocos para existir.

Para estes, existir é vencer. Durante anos até ouvi falar da engenharia financeira de um ano vivido em pensões amigas e, se preciso fosse, de carros em ponto morto nas descidas. Para esticar o investimento efetivo dos patrocinadores.

Vamos então à massa dos patrocinadores.

No ciclismo destes dias é comum que os que colam as suas marcas aos corredores façam um negócio que parece vantajoso. Dizem-me que não andarei longe da verdade se afirmar que um investimento total de 150 ou 200 mil euros/ano dos patrocinadores já paga um ano de vida de uma equipa inteira. Campeã. E que esses 150 ou 200 mil euros/ano garantem às marcas um retorno mediático, só na Volta a Portugal, de mais de… 3 milhões de euros. Se não forem 4.

A ser verdade, temos finalmente dados que aproximam tecnicamente uma Volta a Portugal de um negócio de futebol: a taxa de rentabilidade para quem investe fica parecida com aquela que os fundos de investimento retiram da venda de certos jogadores. Resta que me provem que os atletas – os tais corredores que geram a tão admirada capacidade de sofrer – recebem à proporção do que produzem. Não consegui encontrar um caso, provavelmente por incompetência minha.

Talvez Porto e Sporting tragam essa justiça… assim consigam hoje no ciclismo captar para as camisolas os tais novos patrocinadores “fornecedores de riqueza” que, no futebol, tão tarde asseguraram nesta temporada. 

Talvez desta feita, eventualmente regressando, o Benfica consiga também fazê-lo, apesar de no último regresso – ainda no tempo das “vacas gordas” – a Lagos não ter conseguido captar um para a camisola daquele Benfica que venceu a Volta com Plaza.

Nas segredadas conversas que tive antes de escrever esta crónica percebi quanto “medo de não resultar” está por trás dos sorrisos otimistas que vamos ver já na Volta ao Algarve.

Quero imaginar que seja mentira que o último vencedor da Volta pelo Tavira, em 2011, tenha ganho por mês os 500 euros que me contaram ter auferido o último vencedor da Volta pelo Sporting. Em 1986. Um tal de Marco Chagas. Curiosamente, também ele o último vencedor da prova pelo Porto, em 83. Que já contou em direto como, desde essa altura, ainda tem a receber alguma “massa” que ganhou… Sim, desejo ardentemente que a chegada das camisolas dos clubes ao ciclismo lhes traga desta vez mais do que… amor à camisola. 

Eles já tentaram ir comprar massa com amor à camisola, mas não havia troco. Que a suam, está garantido.

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