Crise é "obstáculo a ultrapassar" na demolição do Aleixo

por RTP
No lugar do Bairro do Aleixo, com vista privilegiada para o Rio Douro, deverá nascer uma urbanização de luxo José Coelho, Lusa

O presidente da Câmara do Porto reconhece que a atual crise é um “obstáculo a ultrapassar” para fazer desaparecer o Bairro do Aleixo, embora mantenha como meta concluir a demolição até ao termo do seu mandato, em 2013. Entre dúvidas da oposição e a contestação de moradores, Rui Rio assistiu esta sexta-feira à implosão da Torre 5 do Bairro com “uma certa ansiedade” e “respeito pelas pessoas” que ali moravam. Derrubado o primeiro de cinco edifícios a apagar do horizonte portuense, houve confrontos entre populares e polícia.

Rui Rio desvaloriza as críticas da oposição ao andamento do processo de demolição do Bairro do Aleixo. Tão-pouco revela grande inquietação com a investigação em curso a Vítor Raposo, empresário ligado a Duarte Lima e um dos participantes no Fundo Especial de Investimento Imobiliário (FEII) instituído para a realização do projeto. O que preocupa o presidente da Câmara do Porto é a “situação financeira do país e a escassez de crédito e liquidez bancária”. Esse é “um obstáculo a ultrapassar”, reconheceu o autarca social-democrata em declarações aos jornalistas, pouco depois da implosão da Torre 5.

No dia em que completou dez anos à frente do executivo camarário, Rio não quis deixar cair, a par do edifício, o compromisso de concluir “a demolição integral do Bairro e o realojamento das pessoas” até 2013, ano em que termina o seu mandato. “O projeto completamente concluído nem sequer será no meu tempo”, admitiu o autarca, citado pela agência Lusa. Para sustentar que “era impossível fazer tudo no horizonte de 2013”: “A demolição pode acontecer até lá. É isso que eu quero. Mesmo que no fim falte qualquer coisinha, não se poderá voltar atrás”.

Confrontado com as críticas da Oposição à demora na construção de habitações para o realojamento dos moradores do Aleixo, o presidente da Câmara argumentou que “ter as casas prontas era impossível”. “A construção já se podia ter iniciado, há algum atraso aí. Mas estarem prontas era impossível”, insistiu Rui Rio, que tratou de reprovar o PS por ter votado contra a demolição e estar agora “preocupado porque o processo não está a andar da forma como gostariam”.

“Uma certa ansiedade”
Faltavam 15 minutos para as 12h00 quando a Torre 5 do Bairro do Aleixo veio abaixo. O edifício caiu no espaço de cinco segundos, depois da detonação de mais de 500 cargas de explosivos colocadas nos primeiros três e no oitavo pisos. Outros 25 quilos de explosivos foram espalhados por dez tanques de água em redor da Torre para absorver detritos.



À reportagem da RTP, o comandante da Proteção Civil Rebelo Carvalho disse-se satisfeito com o desfecho da operação. “O planeamento contemplava que o edifício caísse ou entrasse em colapso, rodasse e tivesse este tipo de comportamento. A projeção de qualquer resíduo confinou-se apenas ao edifício e ao perímetro que nós tínhamos previsto de 15 a 20 metros”, apontou.

Após a implosão, dezenas de populares furaram o perímetro de segurança, envolvendo-se em confrontos com as forças de segurança. Foram destruídas barreiras de proteção e os moradores chegaram a atirar partes de destroços à polícia, que seria acusada de utilizar gás pimenta. Em declarações à RTP, Leitão da Silva, comandante da Polícia Municipal do Porto, considerou inaceitáveis os acontecimentos que se seguiram à queda da Torre 5: “Existe emoção à volta de uma operação destas, principalmente porque houve pessoas que viveram nesta torre durante trinta e muitos anos. Agora, não podemos compreender, nem podemos aceitar, que se ponha em causa uma operação com o arremesso de pedras contra a autoridade. Isso é uma demissão absoluta do Estado de Direito e a polícia tem a obrigação e o dever de repor a tranquilidade e a ordem pública”.

Rui Rio, que acompanhou a implosão sobre as águas do Douro, a bordo de uma embarcação do empresário Mário Ferreira, não escondeu “uma certa ansiedade”. E fez questão de salvaguardar “algum respeito” pelos moradores da Torre 5. “Está certo que havia o perímetro de segurança, mas é sempre um momento de uma certa ansiedade e de algum respeito pelas pessoas que moraram ali. Podem ter tido vivências aborrecidas ou deprimentes, mas foi a casa delas”, declarou.

“Uma declaração vã”

O concurso público desencadeado pela Câmara da Invicta para a composição do Fundo Especial de Investimento Imobiliário teve como vencedor o Grupo Espírito Santo, através da Gesfimo. O FEII deveria ser criado com um capital de seis milhões de euros, tendo como participantes a Espart – Espírito Santo Participações Financeiras S.A., a autarquia e Vítor Raposo.

Na passada terça-feira, o vereador socialista Manuel Correia Fernandes dava conta da apresentação de vários requerimentos relacionados com o projeto de demolição do Bairro do Aleixo. O PS pediu o acesso, designadamente, à “cópia do contrato assinado para a constituição do Fundo Especial de Investimento Imobiliário” e informações relativas às datas do visto do Tribunal de Contas, da constituição do FEII e da aprovação deste mecanismo pela Comissão de Mercado de Valores Mobiliários.

Os socialistas solicitaram também uma “cópia do contrato de permuta de imóveis que deverá ser assinado com o Fundo” e “informação detalhada sobre o desenvolvimento de cada um dos processos de construção ou reabilitação de imóveis previstos”.

Por seu turno, o vereador da CDU Pedro Carvalho instou Rui Rio a detalhar os custos da demolição, tendo posteriormente indicado que o presidente da Câmara Municipal redarguiu que seriam “assumidos pelo FEII ainda em 2011”. Levando em linha de conta que os terrenos do Bairro “estão avaliados em 15 milhões de euros e que o capital do Fundo não está integralmente constituído”, o edil comunista disse temer que a resposta de Rio não passasse de “uma declaração vã”.

À Lusa, a Câmara atestaria que os custos da demolição seriam garantidos pelo FEII. Todavia, indicou não ter presente o valor inerente à implosão da Torre 5. A 17 de novembro, segundo dados então apurados pela agência de notícias junto da autarquia, o Fundo era detido em 57,7 por cento pela Espart, em 19,3 por cento pela Câmara Municipal e em 23 por cento por Vítor Raposo. “No final do processo, a repartição deverá evoluir de forma a que o capital fique distribuído da seguinte forma: Espart 30 por cento, Câmara dez por cento e Vítor Raposo 60 por cento”, afiançava à data a autarquia.
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