"Finalmente, a vitória! Arrumei-os a todos!"

Foi o primeiro Presidente civil eleito diretamente pelo povo na História de Portugal. Tomando posse a 9 de março de 1986, Soares inaugura um novo estilo político. As célebres “presidências abertas” levam-no a percorrer o país e a contactar de perto com os problemas locais. A 13 de janeiro de 1991 foi reeleito Presidente da República, logo à primeira volta, tendo obtido a maior votação de sempre: mais de 3,4 milhões de votos.

Mário Soares teve o apoio de independentes e do PS, na primeira volta, e de toda a esquerda, na segunda volta. Autointitulou-se o “Presidente de todos os portugueses”.

Renunciou então aos cargos de secretário-geral dos socialistas e de deputado, mas antes disso, em dezembro de 1985, confessou que percorreu o país todo, tendo o seu staff desaparecido "em bicos de pés".
"Trágico é abandonar, deixando-se intimidar"
"Desliguei-me do partido, percorri quase todo o país a inaugurar sedes. Fiz um esforço tremendo, discursos, artigos, entrevistas, mas a campanha não arranca, na verdade só eu, ou quase, a faço (...) O meu staff mais próximo desaparece em bicos de pés (...) Devo então desistir? Essa é a minha tentação e ao mesmo tempo a minha angústia. Se for até ao fim ninguém me pode acusar de nada. Cumpri. Não é trágico em democracia perder uma eleição".


Programa Mário Soares, o meu século XX e a Transição do Mil Memórias do Portugal Futuro - 24/11/2011 - Diário escrito no dia 8 dezembro 1985

"No dia dos resultados, meti-me no meu escritório. Estava sozinho. Quer ganhe quer perca, tenho de prever as duas hipóteses. Portanto, comecei por perder. Fiz um texto para a hipótese de perder. Um texto curioso porque eu achei que se perdesse não estava vencido", contou à RTP Mário Soares em novembro de 2011.

E acrescentou: "Para mim a derrota é que eu passava a ser o grande líder da oposição da esquerda em Portugal. A outra hipótese era a hipótese de ganhar. E na hipótese de ganhar eu tinha um problema: é que se eu ganhasse era por muito poucos votos. O país estava dividido em duas metades e uma metade, que era a minha, queria engolir os outros e isso eu não podia fazer porque, se eu fizesse isso, a curto prazo eu estava destruído como Presidente da República".

Programa Mário Soares, o meu século XX e a Transição do Mil Memórias do Portugal Futuro - 24/11/2011

De facto, a primeira volta das eleições presidenciais de 1986, realizada a 26 de janeiro, foi inconclusiva. Freitas do Amaral obtém 46,31 por cento dos votos (2.629.597 votos), Mário Soares 25,43 por cento (1.443.683), Salgado Zenha 20,88 por cento (1.185.867) e Maria de Lurdes Pintasilgo 7,38 por cento (418.961).

Já na segunda volta, após a realização de um Congresso Extraordinário do PCP em que é aprovado o apelo ao voto em Mário Soares, os resultados eleitorais de 16 de fevereiro de 1986 foram os seguintes: Mário Soares 51,18 por cento (3.010.756 votos) e Freitas do Amaral 48,82 por cento (2.872.064).
"Animal político"
"Finalmente, a vitória! Inesperada, tremendamente difícil, incrível em muitos aspetos, mais saborosa por tudo isso. Com ela a consagração como corredor de fundo, animal político, super campeão e outras amabilidades que têm aparecido nos jornais portugueses e nos estrangeiros, sobretudo franceses. Com efeito, venci o Eanes, Cunhal. Zenha e Pintasilgo foram apenas epifenómenos. Cavaco, a Igreja, a direita arrogante e saudosista, a que Freitas e Proença de Carvalho deram o nome. Arrumei-os a todos, como disseram. E agora, que fazer com a vitória? Como encaminhar Portugal para uma nova fase de estabilidade e prosperidade? Eis a questão!"
Programa Mário Soares, o meu século XX e a Transição do Mil Memórias do Portugal Futuro - 24/11/2011

O então Presidente da República diferencia-se assim do antecessor, optando por não assumir demasiados protagonismos em termos políticos. Privilegia o diálogo e a mediação moderadora e tem a preocupação de não hostilizar o Executivo e Cavaco Silva.

Um dos momentos do primeiro mandato presidencial fica marcado pela assinatura, a 26 de dezembro de 1986, do Decreto de Ratificação do Tratado que institui o Acto Único Europeu, concluído no Luxemburgo e na Haia a 17 e a 28 de Fevereiro de 1986.

Mário Soares tomou posse e prestou juramento no dia 9 de março de 1986. O seu discurso de tomada proferido perante a Assembleia da República é marcado pelo tom da conciliação e unidade nacionais.

“Unir os Portugueses, Servir Portugal” seria o mote para um mandato presidencial, que marcava um novo estilo presidencial.

Documentário "Os Presidentes" - 31-10-2011

Em inícios de abril de 1987 Soares tem de gerir a primeira crise política, na sequência de uma moção de censura ao Governo de Cavaco Silva, apresentada pelo PRD, e que o PS acaba por votar favoravelmente, levando à queda do Governo.

Pouco recetivo a nomear um governo chefiado pelo segundo partido com representação parlamentar com o apoio do PCP, Soares mostra-se desfavorável à disponibilidade manifestada por Vítor Constâncio, invocando a necessidade de uma maioria parlamentar absoluta.

Assim, após uma reunião do Conselho de Estado, a 28 de abril de 1987, opta por convocar eleições legislativas antecipadas, que se realizam a 19 de julho de 1987 e se saldam pela vitória do PSD com maioria absoluta.

A 17 de agosto Soares confere posse ao XI Governo Constitucional, chefiado por Cavaco Silva.

Mário Soares promove as chamadas “presidências abertas”, que o levam a percorrer o país e a conviver com as populações. Um sucesso que se repetirá no segundo mandato presidencial.

A 13 de janeiro de 1991 foi reeleito Presidente da República, logo à primeira volta, tendo obtido a maior votação de sempre: 3.459.521 votos (70,40 por cento dos sufrágios validamente expressos), tendo terminado o segundo mandato a 9 de março de 1996.

Programa Mário Soares, o meu século XX e a Transição do Mil Memórias do Portugal Futuro - 24/11/2011

"Quero garantir a todo o povo português que serei em absoluto fiel aos meus compromissos, isto é, que serei o Presidente de todos os portugueses como fui no passado (...) Nos últimos dias tenho tido uma sensação de angústia, coisa rara em mim. Não sei bem explicar. O stress da campanha eleitoral, a ressaca dos impiedosos ataques que me foram dirigidos, o facto de a minha vitória eleitoral ter sido abafada pela Guerra do Golfo, com todas as incertezas que contem. Direi que tudo isso e ainda o cansaço, a idade, 66 anos, podem explicar um certo torpor, um certo sentimento indefinido de perigo, daí a angústia ou de insegurança quanto ao futuro. É preciso reagir. A campanha foi dura e para mim esforçada, mas não foi como terei desejado uma campanha alegre, apesar da participação numerosa da juventude. Não houve debate de ideias, houve insultos e calúnias, que me deixaram um visco amargo e muita ambiguidade. Urge passar adiante, respirar fundo e começar de novo".
Diário - 3 julho 1991

Mário Soares confere posse ao XII Governo Constitucional chefiado por Cavaco Silva a 31 de outubro de 1991.

Na mensagem de fim de ano de 1993 assume uma posição crítica perante a situação sócioeconómica do país e sobre o Governo. Ganham corpo as divergências entre o Presidente da República e o poder executivo.

Mário soares já não podia ser eleito outra vez e dava eco à contestação com as presidências abertas: mostrava a fome, a pobreza e as graves carências de habitação nas áreas metropolitanas.

Documentário "Os Presidentes" - 31-10-2011

Cavaco Silva perdeu popularidade, enquanto que Mário Soares manteve índices elevados de simpatia nos inquéritos de opinião. Alheio às críticas que lhe apontavam, como o excesso de viagens, Soares terminará o mandato com uma visita oficial às Ilhas Seychelles, em novembro de 1995, onde se sentou sobre uma tartaruga.

No último dia como Presidente da República, Mário Soares despediu-se dos funcionários e passou o testemunho a Jorge Sampaio.

Um dos últimos atos de destaque do segundo mandato presidencial é a mensagem que dirige ao Parlamento a 6 de fevereiro de 1996, na qual recomenda uma amnistia para os arguidos no processo das Forças Populares 25 de Abril (FP-25).