Governo insiste em falha de Carlos Costa no colapso do Banif

por Cristina Sambado - RTP
António Cotrim - Lusa

O secretário de Estado adjunto do Tesouro e das Finanças reafirmou na última noite a convicção de que o governador do Banco de Portugal cometeu uma falha grave, ao não informar o Governo sobre as diligências que fez junto do Banco Central Europeu relativamente ao Banif. No Parlamento, Ricardo Mourinho Félix rejeitou mesmo o argumento de que Carlos Costa não podia prestar informações sobre o estado do banco.

“Mantenho. Acho que foi grave que não me tivesse dado conta naquele dia que havia um procedimento em Frankfurt sobre o acesso à liquidez do Banif, quando eu trabalhava numa forma de assegurar a liquidez do Banif até ao final dessa semana”, afirmou o governante na comissão parlamentar de inquérito sobre o processo do banco.

“As explicações que me foram dadas não colhem”, acrescentou Ricardo Mourinho Félix, que recordou que o Tratado Europeu não impedia que se partilhasse informação relativamente ao Banif.

Segundo o secretário de Estado adjunto, “o que está escrito no Tratado da União Europeia não é que eu não posso ser informado, é que eu não posso influenciar uma decisão do Banco de Portugal”.

“Não é ilegal, não é ilegítimo, mas diz bem do grau de independência em que as pessoas se sentem. Independente é quem pensa pela sua cabeça, não é quem oculta informação”, sublinhou.

Perante a comissão de inquérito sobre o Banif, onde foi ouvido durante mais de quatro horas, Mourinho Félix reforçou que, neste caso, “não há violação da lei. Há discussão pública e discussão política. E disso ninguém está livre”. Recapitalização em 2013 foi um erro
Para o governante a injeção de 1.100 milhões de euros no Banif no início de 2013 “não foi uma solução acertada” do anterior Executivo. Mourinho Félix aponta o dedo ao Governo PSD/CDS-PP, que acusa de ter adiado “toda e qualquer decisão” em torno do banco.

“É legítimo que na altura a resolução de um banco afetasse a estabilidade do sistema financeiro”, salientou.

O secretário de Estado adjunto do Tesouro e das Finanças recorda o facto de o país se encontrar à data sob resgate financeiro da troika. No entanto, considerou que dentro do programa de ajustamento financeiro teria sido possível negociar com os credores esta solução.

“A decisão que foi tomada foi a recapitalização pública. Mas devia haver um acompanhamento diferente”, frisou, sublinhando que se pode debater se tal deveria ter ocorrido através de “uma gestão pública do Banif”, (já que o Estado era o maior acionista após a injeção de capital), ou alvo de um acompanhamento mais próximo por parte do Estado. “Os portugueses não estão dispostos a suportar uma nova situação como a do Banif”.

Admitindo que “avançar para a recapitalização do banco é uma opção política”, o membro do Executivo de António Costa realçou que “passado este tempo é nítido que não foi uma solução acertada”.

“Muito mais avisado fazer a resolução do banco e encontrar um comprador para integrar o Banif na Caixa Geral de Depósitos”, acrescentou.

Para Mourinho Félix, “qualquer decisão sobre o Banif teria custos políticos” e isso, admite, “era algo que o anterior Governo não pretendia assumir”, o que “motivou um arrastar da situação”.
Bruxelas bloqueou a compra portuguesa
Ricardo Mourinho Félix revelou, na comissão parlamentar, que o Governo tentou junto da Comissão Europeia que os bancos portugueses participassem no processo de venda do Banif, mas Bruxelas não deu “luz verde”. Caso as autoridades europeias tivessem viabilizado a constituição de um banco de transição, em cenário de resolução, abriram mais oportunidades negociais para o lado português.

“Falámos na possibilidade de deixar os bancos portugueses concorrer, mas não deixaram porque disseram que tinha havido ajudas do Estado há pouco tempo”.

Para o secretário de Estado adjunto do Tesouro e das Finanças, a integração do Banif na Caixa Geral de Depósitos ou a criação de um banco de transição no âmbito da sua resolução eram melhores para Portugal do que a venda em resolução ao Santander.

“Quando estávamos a negociar, podíamos dizer: nessas condições não, porque então criamos um banco de transição. Isso permitiria atrair quem quisesse comprar o banco com tempo, fazendo um due diligence de jeito”, sublinhou.
Proposta do Popular era “muito má”
Mourinho Félix estranhou que, depois de se ter mostrado muito interessado na compra do Banif, o Banco Popular tenha apresentado uma proposta fraca.

“Não houve nenhuma indicação de que fosse o Santander [o comprador do Banif]. O banco que mais se mostrou para um futuro comprador do Banif foi o Popular”, esclareceu.

“A proposta do Banco Popular é uma proposta muito má. Acho muito estranho que alguém trabalhe muito tempo num dossier e depois apresente uma proposta daquelas”.

Depois da má proposta apresentada pelo Banco Popular “restava a JC Flowers e o Santander”, já que “a Apollo não apresentou uma proposta vinculativa, pois queria ter tempo para avaliar os ativos”.

“A proposta da Apollo nunca foi considerada por ninguém como uma proposta binding [vinculativa]”, realçou.

Segundo o governante, “no sábado de manhã [dia 19 de novembro de 2015], depois de se olhar para as propostas, já toda a gente tinha visto que a única proposta viável era a do Santander”. “Se não tivéssemos nem o Popular, nem o Santander, tínhamos um grande molho de brócolos”. 

“O Santander foi o primeiro a apresentar a proposta e durante muitas horas não havia mais nenhuma”. Já “o Popular estava muito interessado e tinha muita gente a trabalhar no assunto, mas não havia maneira de chegar a proposta”, frisou.

O secretário de Estado avançou que nessa altura recebeu uma chamada a dar conta de que “aparentemente o Banco de Espanha estava a levantar problemas aos bancos espanhóis para participar no processo de compra do Banif”.

Mourinho Félix afiançou que a “grande preocupação do Governo era ter o maior número possível de interessados”.

c/ Lusa

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