Marcelo veta fim de sigilo bancário e devolve diploma a Costa

por RTP
Nuno Fox - Lusa

O Presidente da República decidiu não promulgar o Projeto de Decreto-Lei “que regula a troca automática de informações financeiras no domínio da fiscalidade”, devolvendo-o “ao Governo” de António Costa. Marcelo fala de “inoportunidade política” da medida, com efeitos negativos para a economia, e lembra que o acesso às contas já se faz havendo “indícios de prática de crime”.

Numa nota no site da Presidência, Marcelo Rebelo de Sousa fez saber a meio da tarde que decidiu vetar o decreto do Governo que obriga os bancos a informar a Autoridade Tributária sobre as contas bancárias de residentes em território nacional com saldo superior a 50 mil euros.

Trata-se de uma das medidas do executivo Costa que mais tinta fez correr nas últimas semanas. O decreto-lei foi aprovado em Conselho de Ministros a 8 de setembro, dando entrada em Belém há uma semana.

O diploma implementa um acordo com os Estados Unidos e transpõe legislação comunitária sobre troca automática de informações financeiras de não-residentes, mas o Governo decidiu estender essas regras aos residentes em território nacional, portugueses ou estrangeiros.
“Patente inoportunidade política”
Marcelo invoca ainda a questão da “confiança dos portugueses, essencial para o difícil arranque do investimento, sem o qual não haverá nem crescimento nem emprego”.Nesta parte, relativa à transposição de regras europeias ou do acordo com os Estados Unidos da América, Marcelo aceita que se trata de matéria “indiscutível”. O Presidente explica o veto, “antes do mais, na sua patente inoportunidade política”.

E lembra que “existem já numerosas situações em que a Autoridade Tributária e Aduaneira pode aceder a informação coberta pelo sigilo bancário, sem dependência de autorização judicial, nomeadamente quando existam indícios de prática de crime em matéria tributária, de falta de veracidade do declarado, de acréscimos de património não justificado”.
João Vasco - Antena 1

Mas não, só. Também os “efeitos negativos” sobre a actividade económica levaram o Presidente da República a pender para o veto. Acrescenta Marcelo que “vivemos num tempo em que dois problemas cruciais, entre si ligados, dominam a situação financeira e económica nacional. O primeiro é o de que se encontra ainda em curso uma sensível consolidação do nosso sistema bancário. O segundo, com ele intimamente ligado, é o da confiança dos portugueses, depositantes, aforradores, e investidores, essencial para o difícil arranque do investimento, sem o qual não haverá nem crescimento nem emprego, nem sustentação para a estabilização financeira duradoura”.
O caminho do sigilo
O Ministério das Finanças salientava que tinham sido acatadas as recomendações da CNPD “no sentido de vedar o acesso por terceiros, qualquer que seja a sua natureza jurídica aos dados detidos pela Autoridade Tributária”.Um anteprojeto do Governo sobre esta matéria foi apreciado em agosto pela Comissão Nacional de Proteção de Dados.

Entendeu a CNPD que havia “restrição desnecessária e excessiva dos direitos fundamentais à proteção de dados pessoais e à reserva da vida privada, em violação clara do n.º 2 do artigo 18.º da Constituição”.

Esta norma da Constituição determina que “a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”.

Por outro lado, a CNPD considerou que a legislação sobre matéria deve passar pela Assembleia da República: “A forma de decreto-lei não será suficiente para regular restrições e condicionamentos de direitos, liberdades e garantias, aqui especificamente direito à proteção de dados pessoais e à reserva da vida privada”.


c/ Lusa
Tópicos
pub