Companhia mala voadora reflete sobre verdade e ficção em nova peça

por Lusa

O dramaturgo Jorge Andrade estreia no dia 26, em Lisboa, uma peça performativa como um filme de ficção sobre uma revolução encenada, a partir de imagens de arquivos de Portugal, no Estado Novo e em Democracia.

O espetáculo de Jorge Andrade, pela companhia mala voadora, intitula-se "25 de Abril de 1974" e é interpretado pelo ator José Neves, no papel de um realizador que está a fazer um filme sobre uma revolução.

Em cena está apenas José Neves, numa mesa de trabalho, e apoiado por um ecrã onde são projetadas imagens que vai comentando e narrando.

Num encontro com jornalistas, numa fase ainda de montagem do espetáculo, Jorge Andrade explicou que um dos pontos de partida para esta produção foi uma curta-metragem feita nos anos 1970 pelo artista vanguardista britânico John Smith, intitulada "The Girl Chewing Gum" ("Rapariga a mastigar pastilha elástica").

No filme surge a vida mundana e banal numa rua em Londres, com carros e pessoas a circularem, mas John Smith acrescentou-lhe uma narração dessas imagens, como se desse indicações de cena do que se está a passar.

"Achámos que seria pertinente fazer isto com o 25 de Abril. Não só aquela coisa mais imediata da possibilidade utópica de a revolução ser feita por um artista, mas proporcionarmos uma oportunidade de olharmos para estas imagens que distam de há 50 anos e o que significam hoje", explicou Jorge Andrade.

Para o seu espetáculo, o encenador procurou imagens em arquivos como os da Cinemateca e da RTP, contando com consultoria do jornalista Joaquim Furtado, para construir uma narrativa sobre o que foi Portugal antes e depois da Revolução de Abril de 1974.

A montagem inclui imagens de crianças na Mocidade Portuguesa, de militares portugueses mobilizados para a Guerra Colonial e de demonstrações de poder do regime de Salazar, mas também filmagens de arquivo do dia da `revolução dos cravos`, das celebrações civis nas ruas e de alguns dos protagonistas do período revolucionário, do capitão Salgueiro Maia ao político Mário Soares.

Enquanto essas imagens são mostradas ao público, José Neves, no papel do realizador, vai dando indicações de cena, como se fosse o responsável de toda esta revolução encenada. A dada altura até diz que vai precisar de fazer um `casting` de milhares de pessoas para gritarem na rua "O povo unido jamais será vencido!".

Entre imagens projetadas -- que são verdadeiras - e a narração de José Neves, que é ficcional, numa conjugação por vezes marcadamente humorística e sarcástica, o encenador Jorge Andrade quis refletir sobre a História recente do país, e pensar também sobre verdade, desinformação e o que é que isso contribui para a construção de uma realidade.

"Tentamos ser factuais sobre a História que contamos. E acho que não estamos a subverter a História", esclareceu o encenador que, por outro lado, quer saber o que é que o espetáculo pode suscitar sobre a História, sabendo que hoje "existem tantas ferramentas" para a manipular.

O espetáculo "25 de Abril de 1974" tem pouco mais de meia hora de duração e vai estrear-se no dia 26 no Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT), sendo a primeira sessão para escolas, para um público-alvo entre os 12 e os 18 anos.

"25 de Abril de 1974" faz parte do programa "Odisseia Nacional" e do ciclo ciclo "Abril Abriu", programado pelo Teatro Nacional D. Maria II.

A partir de outubro, este espetáculo da mala voadora estará em digressão pelo país, com apresentações em Borba, Campo Maior, Sever do Vouga, Fundão, Carrazeda de Ansiães e Idanha-a-Nova.

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