O príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, suspeito de ter encomendado o assassínio do jornalista Jamal Khashoggi, manifestou a sua satisfação com os resultados da conferência conhecida como "Davos no deserto". O clamor internacional não impediu o capital de afluir à Arábia Saudita.
A conferência de investidores saldou-se em negócios calculados para já em cerca de 50 mil milhões de dólares. Segundo noticiou a televisão estatal, só a empresa saudita de energia Aramco assinou 15 contratos num valor de mais de 34 mil milhões de dólares. Entre as contrapartes que assinaram os contratos destacam-se a empresa sul-coreana do sector automóvel Hyundai, a francesa do sector petrolífero Total e a norte-americana de equipamentos para a exploração petrolífera Schlumberger.
O príncipe herdeiro, considerado provável mandante do assassínio do jornalista crítico em Istambul, foi recebido na conferência com os investidores a aplaudi-lo em pé. E, no final, manifestou a sua satisfação pela forma como decorreu a conferência.
Entre os dirigentes internacionais que cancelaram a sua participação na conferência, devido às suspeitas de envolvimento do príncipe, contam-se a directora do FMI Christine Lagarde, o ministro das Finanças dos Estados Unidos Steven Mnuchin, bem como os ministros correspondentes do Reino Unido, da França, da Holanda.
Na arena política internacional, o apoio mais importante de que tem continuado a beneficiar o príncipe Mohammed bin Salman é o de Vladimir Putin, sempre com o argumento de que não deve haver uma condenação precipitada.
No que diz respeito às grandes empresas, o presidente da Siemens, Joe Kaeser, deixara para o último instante
uma decisão sobre a sua própria participação e acabou por cancelar
também a viagem. Com a viagem, ficou adiada a assinatura de um contrato
relativo a uma central elétrica que, segundo a agência noticiosa
Bloomberg, poderá atingir o valor de 20 mil milhões de dólares.
Tal como a Siemens, também o presidente do Deutsche Bank, Christian Sewing, decidiu faltar à conferência.
A questão das exportações de armamento
Em vários países ocidentais reanimou-se um debate sobre o fornecimento de equipamentos militares à Arábia Saudita. Esse debate voltava a emergir regularmente com a notícia de atrocidades cometidas pela força aérea saudita contra civis iemenitas. Com o assassínio de Khashoggi, os maiores fornecedores de Riade tiveram de voltar a pronunciar-se sobre a continuidade dos seus fornecimentos.
Nos Estados Unidos, de longe o maior fornecedor militar de Riade, o presidente Donald Trump sublinhou com muita veemência que, no caso de ser preciso sancionar a Arábia Saudita, essas sanções não deveriam consistir em recusar-lhe encomendas militares - e cifrou-as em 110 mil milhões de dólares, o que alguns analistas consideram exagerado. Mas Trump poderá ainda ver-se confrontado com moções no Congresso e no Senado que proponham um embargo de armas a Riade.
No Reino Unido e em França, os fornecedores que se seguem por ordem de importância, o debate encontra-se ainda num estádio mais incipiente.
Em Espanha, quarto maior fornecedor, o Governo socialista de Pedro Sánchez opôs-se a que fosse cancelada uma encomenda saudita para fabricar corvetas nos estaleiros de Cádiz, e foi buscar à direita apoios para essa recusa. O partido da esquerda "Podemos" tem insistido em que seja aprovado um embargo às exportações de armas que massacram populações civis do Iémen, mas deverá ficar em minoria.
Na Alemanha, o acordo de coligação negociado no início deste ano compromete o Governo de Merkel a impedir vendas de armas para o Iémen, por este se encontrar em guerra. Mas não prevê que as impeça para a Arábia Saudita, embora seja esta que, desde há três anos, faz a guerra no Iémen.
Agora, com o escândalo em torno do assassínio de Khashoggi, o SPD pressionou para que não se assinem mais contratos de exportação de armamento com Riade e Merkel deu o seu acordo a essa travagem. Mas o Partido da Esquerda e os Verdes pressionam mesmo para que encomendas em execução sejam suspensas.