Fundos de resgate podem vir a comprar dívida espanhola e italiana

Os dois fundos de resgate da Zona Euro podem vir a ser autorizados a comprar dívida dos países em dificuldades nos mercados secundários. A proposta, avançada pelo primeiro-ministro italiano durante a reunião do G20, foi bem aceite pela França e não foi completamente rejeitada pela Alemanha, que até agora se opunha a soluções desse tipo. Alvo de muitas pressões durante a cimeira de Los Cabos, Angela Merkel deu sinais de que pode estar disposta a ceder, num esforço desesperado para baixar os custos de financiamento da Espanha e da Itália e evitar a desintegração da moeda única.

António Carneiro, RTP /
Barack Obama com Angela Merkel no G20: O presidente dos Estados Unidos foi um dos vários chefes de Estado que pediu à Alemanha para ir mais longe no combate à crise da Zona Euro Peer Grimm,EPA

Fontes do G20 dizem-se convencidas de que os líderes da Zona Euro podem vir a anunciar publicamente uma decisão nos próximos dias, mas deixaram claro que não conhecem nem o momento nem o exato conteúdo da mesma.

O comunicado final da cimeira de Los Cabos não menciona os passos concretos a tomar pelos países da moeda europeia, mas declara que estes se comprometem com o objetivo de reduzir os custos que Madrid e Roma têm de suportar atualmente para se financiarem nos mercados.
Fundos de resgate poderiam substituir os esforços do BCE
A proposta italiana prevê que o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE), que em julho será o fundo permanente de resgate da Zona Euro, possa adquirir obrigações de dívida nos mercados secundários, tomando para a si o papel que até agora tem vindo a ser desempenhado, a contragosto, pelo Banco Central Europeu.

Se a ideia avançar, isso significa que os cerca de 500 mil milhões de euros do fundo permanente de resgate poderão somar-se aos 250 mil milhões que ainda restam no Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF, o fundo provisório) para, através da compra de obrigações espanholas e italianas, fazer baixar os juros que estes países enfrentam nas suas operações de financiamento.

A ideia de que o MEE poderá servir para comprar obrigações de dívida, em vez de se ver limitado aos resgates formais das economias em dificuldades, sempre contou com a oposição da Alemanha, cujo Governo tem vindo a recusar qualquer solução que enfraqueça os condicionalismos rígidos associados aos tradicionais resgates. Berlim teme que quaisquer "facilidades" possam vir a enfraquecer o ímpeto reformista nos países visados.
Berlim dá alguns sinais de flexiblização
Mas desta vez a chanceler alemã poderá estar disposta a mostrar mais flexibilidade. Segundo várias fontes, Angela Merkel deu sinais em privado de que poderia estar disposta a considerar essa solução, se a crise se agravar. No entanto, Merkel não deu quaisquer garantias nem se comprometeu com nenhum curso de ação.

“Nada foi ainda decidido”, disse um porta-voz da chefe do Governo alemão.

Responsáveis italianos disseram que a ideia poderá ser discutida já esta semana numa reunião dos ministros europeus das Finanças. Entretanto, a proposta do primeiro-ministro italiano recebe desde já um acolhimento favorável por parte do Presidente francês.

No final da reunião do G20, François Hollande tinha considerado inaceitável a subida em flecha dos juros da dívida de Espanha, pouco depois de ser anunciada a ajuda europeia aos bancos espanhóis.
Hollande quer discutir "com seriedade" a proposta de Monti
O Chefe de Estado francês confirmou que Mário Monti tinha pedido que os fundos europeus de resgate sejam usados para reduzir as taxas de juro das dívidas soberanas nos mercados secundários, pelo menos nos países que já tiverem colocado em ordem a sua situação fiscal.

“A Itália avançou com essa ideia”, disse Hollande, “e devemos examiná-la com seriedade”.

Segundo Hollande, tanto o atual fundo provisório de resgate (FEEF) como o fundo permanente (MEE), que será lançado em julho, devem ser utilizados para combater o que disse ser a “especulação” no mercado das dívidas soberanas.

“O FEEF já existe. O MEE vai existir em breve”, disse o Presidente francês, “devemos usá-los no momento certo e da forma certa (…) para conseguir acalmar as coisas da forma certa”.

Já a chanceler Angela Merkel não fez comentários, em público, sobre os planos que estaria disposta a aceitar para reduzir as pressões sobre as dívidas soberanas da Espanha e da Itália, mas afirmou compreender a gravidade da situação.
Merkel: "Estamos determinados a agir"
“É óbvio que temos problemas na Zona Euro e que é necessário atuar”, disse Merkel, “Mas o importante é que nós, [os europeus] deixámos claro [no G20] que estamos determinados em agir”.

Se a Alemanha decidir levantar a sua oposição à compra de obrigações pelo fundo de resgate europeu, isso pode ser encarado como um tímido primeiro passo para uma espécie de mutualização da dívida entre os 17 países-membros do euro, embora fique muito aquém da emissão coletiva de dívida, os tão badalados eurobonds defendidos por François Hollande e pelo presidente da Comissão Europeia Durão Barroso e liminarmente rejeitados pela Alemanha.

Significa também que os países que forem beneficiários desta intervenção poderão escapar às estritas condições de resgate que já foram impostas à Grécia, a Portugal e à Irlanda.
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