Amnistia Internacional alerta para défice de justiça na República Centro-Africana

por Mário Aleixo - RTP
Os dias são difíceis na República Centro-Africana Reuters

A Amnistia Internacional alertou para o facto de os "senhores de guerra" da República Centro-Africana continuarem em liberdade, apelando às autoridades do país para assegurarem a responsabilização dos perpetradores de crimes e abusos cometidos desde 2002.

"Apesar de algumas investigações e julgamentos nestes últimos anos, muitos perpetradores de horríveis violações e abusos dos Direitos Humanos na RCA não foram levados à justiça dois anos depois da inauguração do Tribunal Penal Especial (SCC, em inglês)", refere a AI numa nota que acompanha o relatório "Em julgamento, esses senhores de guerra baixaram os olhos: A busca da justiça pela República Centro-Africana", hoje divulgado.

De acordo com a diretora da AI para a África Central e Ocidental, Samira Daoud, o sistema judicial da RCA "dispõe de recursos insuficientes".

"Com grupos armados ainda a realizar ataques regulares contra civis, é claro que é preciso fazer mais para acabar com o ciclo de impunidade que continua a causar tanto sofrimento", diz a responsável da AI.

O relatório divulgado resulta de um trabalho realizado por investigadores da AI que, de forma remota, conduziram entrevistas a juízes, procuradores, advogados e ativistas, tendo analisado também mais de 100 documentos legais.

"Embora as investigações tenham sido iniciadas em 2019 e os julgamentos estarem previstos para começar em 2021, a operacionalização do Tribunal Penal Especial enfrenta sérios desafios, que impedem o seu bom funcionamento. Entre estes estão o recrutamento de juízes internacionais e a demora no estabelecimento do sistema de apoio jurídico do tribunal", acrescenta o relatório.

A AI alerta para a interrupção dos trabalhos dos tribunais, destacando que o número de sessões organizadas por ano está "abaixo do mínimo exigido por lei", registando que em 2019 apenas foram concluídos 20 processos-crime.

Junto das autoridades da RCA, a AI pede que sejam realizadas investigações e julgamentos justos perante todos os alegados perpetradores de crimes contra a lei internacional ou violações e abusos cometidos desde 2002 e a suspensão de cargos públicos ou militares de cidadãos alvo de investigação.
Teor dos pedidos de ajuda
A AI reforçou também o apelo para a abolição da pena de morte na RCA.

Ao SCC, a AI pede que este assegure investigações e julgamentos de violações à luz da lei internacional, uma maior transparência das suas atividades, assim como uma aceleração dos seus trabalhos, entre outros.

Já às Nações Unidas e parceiros internacionais, a AI apela que estes assegurem o cumprimento da lei, assim como doações adicionais para o SCC, de forma a que este cumpra o seu mandato inicial de cinco anos.

A RCA caiu no caos e na violência em 2013, depois do derrube do então Presidente da RCA, François Bozizé, por grupos armados juntos na Séléka, o que suscitou a oposição de outras milícias, agrupadas sob a designação anti-Balaka.

Desde então, o território centro-africano tem sido palco de confrontos comunitários entre estes grupos, que obrigaram quase um quarto dos 4,7 milhões de habitantes da RCA a abandonarem as suas casas.
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