Apartheid em Israel. Organizações palestinianas apoiam relatório da Amnistia Internacional
O governo israelita encontra-se em plena cruzada contra o relatório da Amnistia Internacional que acusa Israel de ter montado um sistema de apartheid contra a população palestiniana. Mas o relatório, conhecido esta terça-feira, tem o respaldo de muitas organizações de Direitos Humanos e de defesa dos direitos dos palestinianos que não engolem o argumento derradeiro de que impera no estudo um sentimento anti-semita. Falámos com duas organizações que sublinham este facto: a BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções) e a Breaking The Silence.
Em resposta à RTP, Omar Barghouti, activista palestiniano e co-fundador da BDS, movimento de resistência pacífica ao que considera ser a ocupação israelita e ao regime de apartheid imposto nos territórios, sublinhou que “o relatório da Amnistia [Internacional] confirma o que os defensores dos direitos dos palestinianos vêm dizendo há décadas: Israel é um regime de ocupação militar, colonialista e de Apartheid contra todo o povo palestiniano”.
Quando há dois anos falámos com Omar Barghouti em Lisboa, por ocasião da sua participação no ciclo de conferências subordinado ao tema “Resistências” do Lisbon & Sintra Film Festival de 2019, o engenheiro nascido no Qatar (onde a família se exilou após a expulsão da Palestina) mas a viver na cidade israelita de Acre, encontrava-se ele próprio sob vigilância do Estado israelita, que condicionava a sua deslocação para fora e regresso ao país.
Em causa, o seu activismo pelos Direitos Humanos e o facto de ser um dos co-fundadores, em 2005, do BDS, precisamente um movimento que encontrou inspiração na luta negra contra a supremacia branca na África do Sul.
Esta tarde, numa reacção ao relatório da Amnistia Internacional, Barghouti sublinhava que “o movimento BDS tem apelado à intensificação dos boicotes académicos, culturais e económicos, direccionando as sanções contra Israel para desmantelar o seu regime de Apartheid, como foi feito para o Apartheid na África do Sul”.
O relatório documenta apreensões de terras dos palestinianos, assassinatos, expulsões, restrições da liberdade de circulação e negação de nacionalidade e cidadania, o que para a Amnistia é no direito internacional um sistema de Apartheid.
Omar Barghouti deixou ainda um apelo “ao povo português para pressionar o Parlamento e o governo a aprovarem as exigências da Amnistia. Isto começa com o corte das negociações com Israel no sector militar e da segurança, a proibição da importação de bens com origem nos colonatos ilegais, o desinvestimento em empresas incluídas na base de dados das Nações Unidas de empresas que beneficiam dos colonatos e o apoio a uma investigação das Nações Unidas sobre o Apartheid israelita”.
“Isto constituiria um primeiro passo eficaz para desmantelar este regime de Apartheid", sublinhou.
Falámos também com a Breaking The Silence (BTS), uma voz singular na denúncia do mecanismo de ocupação israelita. A organização oferece aos antigos militares israelitas uma plataforma para contarem as experiências nos territórios da Palestina enquanto membros das forças armadas (IDF – Israel Defense Forces), funcionando “como um espelho para os israelitas”, a imagem crua daquilo que os israelitas pedem às forças no terreno.
A posição face ao relatório desta terça-feira está detalhada numa série de mensagens na conta da organização no Twitter.
Firstly:
— Breaking the Silence (@BtSIsrael) February 1, 2022
Like many thousands of other Israelis who spent their military service in the occupied territories, we know the undeniable facts: We've been holding millions of Palestinians under a military regime, without granting them basic rights, for almost 55 years now.
“Anti-semitismo”. Israel aponta o dedo à Amnistia
O relatório resulta de quatro anos de investigação no terreno e documenta apreensões de terras, assassinatos, expulsões e restrições da liberdade de circulação, além da negação de nacionalidade e cidadania, o que para a Amnistia é no direito internacional um sistema de Apartheid.
“Este sistema é mantido por violações que a Amnistia Internacional considera constituir crime de apartheid contra a humanidade, conforme definido no Estatuto de Roma e na Convenção do Apartheid”, refere a Amnistia. Num texto que não se fica por meias medidas, a AI apela a que o Tribunal Penal Internacional considere aqui o crime de Apartheid, pedindo que os culpados sejam levados perante a Justiça.
Em resposta, Israel puxa de um argumento antigo perante os detratores: são anti-semitas e tendenciosos. Numa mensagem deixada na página da Embaixada em Lisboa, o embaixador em Portugal Dor Shapira partilha um vídeo com a resposta do ministro dos Negócios Estrangeiros, Yair Lapid.
Antes do vídeo, surge a resposta do próprio embaixados, que faz eco dos argumentos de Lapid, chefe da diplomacia e primeiro-ministro em rotação com o actual ocupante do cargo Naftali Bennett. Dor Shapira considera ser “lamentável que enquanto Israel está ocupado a promover a paz com os seus vizinhos, Organizações Internacionais na Europa estejam ocupadas a promover puro ódio e mentiras”.
“O Estado de Israel é uma democracia forte e vibrante, que garante a todos os seus cidadãos direitos iguais, independentemente da religião ou raça”, defende o embaixador.