Arecibo. Um dos maiores radiotelescópios do mundo em risco de colapsar

Ainda conhecido mundialmente por ser o maior radiotelescópio do mundo, a parabólica gigante do observatório de Arecibo, com 305 metros de diâmetro, voltou a sofrer no fim de semana um forte golpe estrutural, depois da rutura de um segundo cabo ligado ao sistema de sustentação (recetor) desta colossal obra científica.

Nuno Patrício - RTP /
Foto: Observatório de Arecibo/DR

Já era do conhecimento público que o estado de degradação da antena, construída em 1963 e instalada numa dolina (depressão circular) natural cársica, é evidente.

Inicialmente construído para estudar a ionosfera terrestre, é atualmente a principal ferramenta na busca de vida extraterrestre, através do projecto SETI, operado pela Universidade Metropolitana em Porto Rico, Estados Unidos. Mas também é este prato gigante que rastreia vários asteróides que circundam a órbita terrestre.


A falta de investimento na velha estrutura tem levado os investigadores a alertarem para a necessidade de uma manutenção profunda. Contudo, a diminuição da espectativa de encontrar sinais de rádio de vida extraterrestre e até o avanço tecnológico de descobrir exoplanetas a partir do espaço terão levado a uma quebra das injeções de capital.

No passado sábado, acabou mesmo por se comprovar essa quebra, quando um dos 12 cabos de suporte principal se partiu e rasgou o prato principal do radiotelescópio.

Créditos: Observatório de Arecibo/DR

O incidente ocorre apenas três meses após a rutura de outro cabo. Os investigadores estão muito preocupados, pois temem que o aumento da tensão nos restantes cabos possa levar a quebras em cascata e ao colapso da plataforma da antena.

Joanna Rankin, radioastrónoma da Universidade de Vermont, diz mesmo que "não é uma imagem bonita. Isto é muito sério".

Também o ex-diretor Donald Campbell, agora a trabalhar na Universidade Cornell, considera, "sem dúvida", que este é o pior acidente alguma vez ocorrido na longa história do observatório.Observatório de Arecibo obsoleto?
Apesar dos seus quase 60 anos, este radiotelescópio, construído numa depressão nas colinas de Porto Rico, ainda é valorizado pelos investigadores.

É ainda um dos poucos observatórios terrestres com a capacidade não apenas de receber ondas de rádio, mas também de emiti-las, na forma de feixes de radar, o que ajuda os investigadores a seguir os asteróides que possam ameaçar a Terra.

Mas este olho artificial gigante para o espaço também sofre os efeitos da concorrência e do avanço tecnológico.

Kepler, Cheops, Spitzer, Plato, Tess. são cada vez mais os satélites colocados em órbita que permitem ir mais longe no universo e descobrir muitos dos seus segredos. E se estes fazem concorrência ao velhinho e ainda potente Arecibo, dois outros olhos são já uma realidade e vão sem margem de dúvida colocar o observatório em segundo ou mesmo em terceiro destaque.

Um deles, já em funcionamento desde janeiro, é o FAST (Five-hundred-meter Aperture Spherical Telescope). Um radiotelescópio chinês com um prato espelhado virado para o céu, com um diâmetro de 500 metros.

Créditos: Ou Dongqu/Xinhua/DR

O FAST, de acordo com os construtures, possui uma sensibilidade 2,5 vezes maior do que outros radiotelescópios disponíveis atualmente.


Estima-se que o alcance seja quatro vezes maior que o do segundo maior radiotelescópio do mundo, o que significa que os astrónomos podem ter a capacidade de descobrir novos pulsares ou outros corpos celestes em áreas do Universo que ainda por explorar.

Mas se o FAST é uma já realidade e concorrência direta na Terra, em breve o espaço terá um outro olho e com uma capacidade quase inimaginável: O James Webb Space Telescope (JWST), da NASA.

Creditos: NASA/DR

Com um grande um espelho primário de 6,5 metros e leitura por infravermelhos, o telescópio espacial, percursor do Hubble, tem previsto o lançamento já para o próximo ano.



O telescópio Webb será o principal observatório da próxima década e estudará todas as fases da história do nosso Universo, desde os primeiros brilhos luminosos após o Big Bang até à formação de sistemas planetários capazes de sustentar a vida em planetas como a Terra, até mesmo à evolução de próprio Sistema Solar.

Uma evolução natural da humanidade e que se reflecte nos instrumentos ao seu dispor.Um olho da Terra para o espaço
O radiotelescópio de Arecibo ainda é considerado como uma das maiores maravilhas tecnológicas construídas pelo Homem.

Estando instalado na Terra, o observatório está exposto aos efeitos meteorológicos e, em 2017, sofreu vários danos, quando o furacão Maria devastou Porto Rico.

Foram efetuadas várias reparações após um dos cabos auxiliares, de 13 centímetros de espessura - um dos seis amarrados entre três torres de suporte e a plataforma da antena suspensa, instalados em 1994 -, se desprendeu da plataforma.

No passado mês de outubro, a Universidade da Florida Central, que lidera um consórcio que administra o observatório, solicitou cerca de nove milhões de euros para reparações de emergência solicitada pela atual proprietária de Arecibo, a Fundação Nacional de Ciência (NSF, na sigla em inglês).

Em comunicado, a NSF refere estar a acompanhar a situação: "Considerando todas as opções possíveis para acelerar a estabilização da estrutura, a nossa maior prioridade é a saúde e segurança dos funcionários da Arecibo".

Créditos: Observatório de Arecibo/DR

A NSF ainda não disse se vai pagar pelos reparos solicitados pela UCF, ou quaisquer custos adicionais causados pela última rutura do cabo. Mas a impressão geral é que a NSF tem sido "muito favorável desde a primeira rutura do cabo".

O ex-diretor da Arecibo Robert Kerr diz que tem havido muitas acusações e sugestões de que os gestores não acompanharam a manutenção das instalações antigas. Os instrumentos adicionados em 1994 criaram tensões acrescidas, para as quais a estrutura não foi projetada originalmente, refere. "Foram várias as etapas até onde estamos agora".

Arecibo é fundamental para muitos campos e seria uma "grande perda" se não fosse reparável, diz a radioastrónoma Joanna Rankin. "A sua sensibilidade é muito maior do que qualquer outro instrumento e é muito mais flexível", explica.

Também o ex-diretor Donald Campbell vem em "defesa" desta estrutrura e explica que o observatório de Arecibo tem uma gama espetacular de capacidades, com uma visão "da estratosfera aos confins do Universo. Seria uma vergonha tremenda se isto se perdesse".
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