"Cheio de mentiras". O livro que está a abalar a Casa Branca já foi publicado

por Andreia Martins - RTP
Jonathan Ernst - Reuters

A publicação estava prevista para a próxima semana, mas o livro “Fire and Fury: Inside the Trump White House”, de Michael Wolff, acabou mesmo por ser lançado já esta sexta-feira, com o propósito de fintar a tentativa legal do Presidente norte-americano em conter a polémica. Donald Trump desmente e desvaloriza as revelações de um livro onde se inclui a controversa entrevista de Steve Bannon, antigo estratega e conselheiro do presidente.

O livro que agitou o início do ano na Casa Branca acabou por ser publicado alguns dias antes da data prevista, depois de dois dias de polémica com a divulgação de excertos na imprensa e da tentativa dos advogados de Trump em interporem uma ação legal contra o autor Michael Wolff.  

Um dia depois de terem sido conhecidos os primeiros excertos, o advogado do Presidente Charles Harder endereçou um aviso legal exigindo a Michael Wolff e à editora Henry Holt & Co. que cessassem “imediatamente” ou desistissem “de qualquer publicação, divulgação ou disseminação posterior” do livro, ou mesmo a disponibilização de “excertos e resumos”. 

Charles Harder enviou também uma carta a Steve Bannon, acusando o antigo conselheiro de Trump de difamação do Presidente. O advogado requereu ainda à editora o acesso a uma cópia do livro, cuja publicação estava prevista para terça-feira, dia 9 de janeiro, mas que acabou por ser publicado hoje. 

Na quinta-feira, um porta-voz da Henry Holt & Co. esclareceu que a publicação em todos os formatos seria antecipada para sexta-feira “devido a pedidos [do livro] sem precedentes”. 

“A Henry Holt confirma que recebemos uma carta de cessação de um advogado do Presidente Trump.  Consideramos que o “Fogo e Fúria” constitui uma contribuição extraordinária para o debate nacional e vamos prosseguir com a publicação do livro”, acrescentou a editora em comunicado. 

Também na quinta-feira, o autor Michael Wolff, antigo colunista do jornal The Guardian, anunciava no Twitter: “Aqui vamos nós. Podem comprá-lo (e lê-lo) amanhã. Obrigada, senhor Presidente”. 


Horas depois, o Presidente norte-americano reagia na mesma rede social. “Dei acesso Zero à Casa Branca (na verdade recusei-o muitas vezes) ao autor deste livro falso. Cheio de mentiras, falsas declarações e fontes que não existem. Olhem para o passado deste rapaz e vejam o que acontece com ele e com o descuidado do Steve”, escreveu.


Polémica com Bannon
Donald Trump refere-se especificamente a Steve Bannon, braço direito durante a candidatura à presidência e nos primeiros meses da Administração, até ter sido destituído em agosto do ano passado. 

Antigo conselheiro e confidente próximo, polémico pela sua ligação ao jornal de extrema-direita Breitbart News, Bannon ocupou um lugar de destaque entre os homens do Presidente, mas agora denuncia o comportamento de “traição” e “antipatriótico” do então candidato republicano.  

Em causa está o encontro polémico que terá ocorrido na Trump Tower entre Donald Trump Jr, filho de Donald Trump, e elementos russos, ainda durante a campanha, um dos pontos nevrálgicos da investigação do FBI ao presumível conluio com o Kremlin.

“Os três membros seniores da campanha pensaram que era uma boa ideia encontrar-se com um governo estrangeiro dentro da Trump Tower, na sala de conferências no 25.º andar, sem advogados. Eles não tinham nenhum advogado (…) Mesmo que se pensasse não se tratar de traição, ou [atitude] antipatriótica, ou uma merda má (sic), e acontece que eu acho que foi tudo isso, deveriam ter chamado o FBI imediatamente”, afirma Bannon num excerto da entrevista, divulgado pelo The Guardian na passada quarta-feira.  

Em resposta, Donald Trump emitiu um comunicado considerando que o antigo conselheiro enlouquecera depois de ter abandonado a Casa Branca e negando a afinidade com o antigo conselheiro aquando dos primeiros meses de presidência.  

“O Steve Bannon não tem nada a ver comigo nem com a minha presidência. Quando foi despedido ele não perdeu apenas o emprego, também perdeu a sanidade”, considerou, acusando-o ainda de ter tido um papel na recente derrota de Roy Moore no Alabama, o ex-senador republicano acusado de abuso de menores. 

A porta-voz da Casa Branca, Sarah Sanders, referia na quinta-feira que o Presidente estava "furioso e repugnado" com os ataques de Bannon. 
“Três televisões e um cheeseburguer”
Num primeiro momento, a imprensa norte-americana deu destaque às revelações de Bannon sobre as eventuais ligações da equipa de Donald Trump a Moscovo. Um dos excertos do livro cita palavras de Donald Trump sobre James Comey, o antigo diretor do FBI que Donald Trump destituiu em maio do ano passado, após o início das investigações sobre a influência da Rússia nas eleições presidenciais de 2016.

"Comey era um rato. Havia ratos em todo o lado e tinhamos que nos livrar deles. John Dean, John Dean. Sabem o que John Dean fez ao Nixon?", repetia o Presidente, em referência ao antigo conselheiro despedido pela presidência durante o Watergate.

Mas o livro destapa muito mais sobre a vida, família e os bastidores do 45º Presidente norte-americano, a poucos dias de se completar o primeiro ano como Presidente dos Estados Unidos.  

Segundo o autor, o livro baseia-se em “mais de 200 entrevistas” e sustenta teses polémicas como o “choque” e a “horror” da equipa quando soube da vitória na noite eleitoral, sobretudo da mulher e futura Primeira-Dama, Melania Trump, que estaria “de rastos” e "em lágrimas" após a vitória. 

Ivanka Trump tinha aspirações bastante diferentes. Segundo a publicação que chegou hoje às livrarias, a filha de Trump fez um acordo com o marido, Jared Kushner, sobre qual deles seria um futuro candidato à Casa Branca.  

“A primeira mulher Presidente não seria Hillary Clinton, seria Ivanka Trump”, segundo os planos conjeturados pela filha do Presidente.

Entre várias declarações que o livro apresenta e que suportam a tese de um Presidente em conflito com o seu círculo próximo, ou de nomes próximos do Presidente que o desvalorizam e desacreditam - incluindo o bilionário Thomas Barrak Jr, que terá declarado que “ele não é apenas maluco, ele é estúpido” – outros pormenores sobre a vida e os hábitos de Trump emergem do livro com 336 páginas. 

A publicação sugere que o Presidente terá tido dificuldades em adaptar-se à Casa Branca durante o primeiro ano. Segundo as declarações reunidas por Michael Wolff, Donald Trump pediu uma fechadura no quarto quando chegou à Casa Branca e assumiu-se protetor dos seus pertences, desde a roupa à escova de dentes. 

O autor do livro acrescenta que Donald Trump pediu duas novas televisões no quarto, que acresciam a uma televisão já existente. Com base nas entrevistas, sustenta que o Presidente muitas vezes se deitava por volta das 18h30, a ver as três televisões, a comer um cheeseburguer e a telefonar a amigos próximos.

Segundo a publicação, os quartos do Presidente e da Primeira-Dama são separados, a primeira vez que tal acontece desde os Kennedy.  

As dificuldades de locução de Donald Trump também são abordadas por Michael Wolff. Segundo o livro publicado hoje, os conselheiros do Presidente pediram-lhe que este pensasse em Xi Jinping “como se de uma mulher” se tratasse.  

Isto porque o novo Presidente aparentava não dizer corretamente o nome de família do Presidente chinês e seria útil recorrer à expressão “She” (Ela, em inglês) durante o primeiro encontro entre os dois chefes de Estado, em abril do ano passado. 
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