Covid-19. Criação de vacina para o vírus terá vários obstáculos

por RTP
Reuters

Os testes em pessoas estão prestes a começar. O novo coronavírus, ou Sars-CoV-2, tem colocado o mundo em suspenso devido à rápida propagação que já infetou mais de 200 mil pessoas em todo o mundo. Várias instituições e farmacêuticas apressam-se para tentar criar uma vacina que possa fazer frente à pandemia mas os obstáculos são numerosos. Quando uma vacina for criada e testada de forma positiva em pessoas é possível que o vírus já tenha sido contido mundialmente.

Da mesma maneira que a propagação foi rápida a passar o centro da pandemia da China para a Europa, muitas são as organizações, de saúde e académicas, que tentam criar um protótipo de vacina para combater aquele que é comprovadamente um dos maiores problemas de saúde pública mundial dos nossos tempos.

Os chineses, os primeiros afetados pelo novo coronavírus, conseguiram descodificar o material genético presente no vírus. No início de janeiro, foi conhecida a sequência genética dando a grupos de investigação de todo o mundo a possibilidade de estudar o vírus, conhecendo a maneira como invade as células humanas e faz os humanos ficarem doentes.

A rapidez com que estas tentativas estão a ser realizadas em muito prende-se com outros coronavírus e investigação feita para travar esses vírus que antes afetaram o mundo. Apesar disso, muitos poucos estariam à espera que uma pandemia com a escala do Sars-CoV-2 poderia provir de um coronavírus, que comummente é conhecido como uma gripe.

As incidências com a SARS e a MERS podem explicar o porquê de se tentar tão rápido um protótipo de vacina para o vírus que causa o Covid-19. Muito trabalho foi realizado para criar a vacina mas que mais tarde foram colocados na prateleira quando as epidemias foram controladas.

Em Maryland, a empresa Novavax voltou a pegar nesses trabalhos para tentar estudar uma maneira de parar o novo coronavírus e garante que existem vários candidatos humanos para entrar em testes ainda esta primavera. O mesmo está a acontecer com a Moderna.

O Sars-CoV-2 partilha entre 80 a 90 por cento do material genético com o vírus que causou a SARS, já que ambos consistem numa porção de ácido ribonucleico (RNA) dentro de uma proteína esférica que está coberta de picos. Esses picos prendem-se a recetores na superfície de células nos pulmões, o que permite ao vírus entrar nas células pulmonares. Uma vez dentro, o vírus copia o sistema reprodutivo das células para criar mais cópias do vírus.

As vacinas funcionam de acordo com o mesmo princípio. Apresentam parte ou o total do patogénico ao sistema imunitário (na forma de uma injeção) e numa dose pequena tem como objetivo que o corpo crie anticorpos ao patogénico. Os anticorpos são uma espécie de memória no corpo humano que voltam a esta em ação caso uma pessoa tenha o vírus na sua forma natural.

Alguns projetos estão a usar este tipo de testes mas outros tentam utilizar novas tecnologias para inovar na criação de uma vacina. A Novavax está a tentar utilizar o código genético na proteína do Sars-CoV-2, que é a parte do vírus que mais provavelmente provoca reações imunitárias em humanos, para tentar lutar contra o vírus quando instalado num hospedeiro.

As tentativas da CEPI (Coligação para Inovações de Preparação de Epidemias) estão a ser influenciadas por estes novos projetos e já garantiu fundos monetários para se juntar à Novavax e a uma universidade de Oxford.
No entanto, há que contar com contratempos. “A nossa experiência mostra que o desenvolvimento de uma vacina é que não podemos antecipar onde vamos falhar”. Palavras de Richard Hatchett, diretor da CEPI.

Os testes clínicos em pessoas decorrem normalmente em três fases. A primeira envolve uma dúzia de voluntários saudáveis que testa a vacina para tentar encontrar efeitos adversos. A segunda já envolve centenas de pessoas, que estão num local do mundo que está a ser severamente afetado pela doença e tenta perceber a eficácia da vacina. Algo que é igualado na terceira mas testado em milhares de pessoas. No entanto, há que contar com grandes níveis de atrito durante estas fases e é por isso que os testes clínicos não podem ser apressados.

A aprovação pode ocorrer caso os reguladores já tenham dado parecer favorável a outros produtos similares. No entanto, o Sars-CoV-2 é novo em humanos e muitas das tecnologias utilizadas para criar vacinas ainda não foram testadas. Nenhuma vacina criada a partir de ácido ribonucleico foi alguma vez aprovada e por isso todos os testes realizados para tentar combater o Covid-19 têm de ser tratados como protótipos de vacinas completamente novas, sendo importante não atalhar nenhuma fase nestes projetos.

Isto porque existem exemplos de testes que acabaram por agravar os sintomas das doenças e é por isso que criar protótipos novos de vacinas e levá-los a reguladores podem levar uma década ou mais. Outro problema que se coloca é que quando a vacina for aprovada, vai ser necessário criar vastas quantidades e a maioria das organizações que estudam o Covid-19 não têm essa capacidade.

Escalar unidades de produção quando ainda não se sabe a eficácia da vacina não É comercialmente viável. A CEPI está a tentar desenvolver uma vacina para combater o Covid-19 mas ao mesmo tempo tentará ter os fundos disponíveis para manufaturar as quantidades necessárias e para isso pediu um investimento de dois mil milhões de dólares para fazer face a esse problema.

Assim que uma vacina contra o Covid-19 seja aprovada colocam-se ainda mais problemas. “Vírus biológicos e tecnologias para a vacina podem limitar a comercialização mas a política e economia vão ser ainda mais limitativas”, explicou Jonathan Quick, da Universidade de Duke, especialista em saúde global.

Outro grande problema é conseguir fazer chegar a vacina onde realmente é necessária já que durante uma pandemia, os países vão competir entre si para conseguir ter medicação. As pandemias têm tendência a atacar com maior proeminência países mais pobres e com sistemas de saúdes mais frágeis pelo que há um desequilíbrio entre a necessidade e o poder de compra. Por exemplo, durante a pandemia da gripe das aves, as reservas de vacinas foram compradas pelas nações mais abastadas, deixando os países mais pobres sem grandes possibilidades de ter a vacina.

Apesar de todo o trabalho que está a ser realizado, o mais provável é que uma vacina seja criada numa altura em que o pico da pandemia já passou e a propagação do vírus esteja praticamente contida. No entanto, uma vacina contra o Covid-19 pode salvar muitas vidas, caso o vírus se torne endémico.
pub