Covid-19. Governo dá 48 horas a Madrid para alargar restrições a toda a comunidade

O executivo de Sánchez dá 48 horas a Madrid para que torne efetivas as novas limitações, depois de o Governo regional ter anunciado que "não está em rebeldia", mas que vai recorrer aos tribunais para perceber a legitimidade jurídica do plano. Na quarta-feira, o Governo espanhol anunciou ter chegado a um acordo no seio do Conselho Interterritorial de Saúde, "aprovado por uma larga maioria", que estende as medidas de restrição já em vigor em 45 zonas de Madrid a toda a comunidade.

Mariana Ribeiro Soares - RTP /
Jon Nazca - Reuters

O Governo espanhol publicou esta quinta-feira, no Diário Oficial do Estado, uma resolução com as novas restrições sanitárias “para responder a situações de risco especial devido à transmissão descontrolada de infeções causadas pelo SARS-CoV-2”, após ter sido aprovada no dia anterior com 13 votos a favor e seis contra.

No final de uma reunião do Conselho Interterritorial de Saúde, entre o Governo e as comunidades autónomas, o ministro espanhol da Saúde, Salvador Illa, sublinhou que estas novas regras são de “cumprimento obrigatório” por parte de todas as comunidades autónomas, "mesmo que tenham votado contra, se o Estado exercer poderes de coordenação, como é o caso”. O despacho foi comunicado na noite de quarta-feira a todas as comunidades, que passaram a contar com 48 horas para a sua aplicação.

No entanto, o “acordo” anunciado pelo Ministério da Saúde não contou com o apoio das comunidades de Madrid, Catalunha, Galiza, Andaluzia, Múrcia e Ceuta e a comunidade madrilena mostrou, uma vez mais, estar em desacordo com o Governo central. A presidente da comunidade de Madrid, Isabel Días Ayuso, deixa claro que "não está em rebeldia" e que cumprirá o acordo, mas irá recorrer aos tribunais "para defender os legítimos interesses do povo madrileno".

Ayuso considera que o plano carece de “legitimidade jurídica”, argumentando que a decisão deveria ter sido unânime para ser plenamente legal. “Este Conselho [Interterritorial de Saúde] não pode impor nada”, disse a presidente da comunidade.O que diz a lei?
Para perceber de que lado está a razão, é necessário recorrer à Lei 16/2003, de 28 de maio, sobre Coesão e Qualidade do Sistema Nacional de Saúde. No artigo 73.2 está estipulado que “os acordos do Conselho serão concretizados através de recomendações que serão aprovadas, quando for o caso, por consenso”. Esse consenso, por sua vez, significa um “acordo produzido por consentimento de todos os membros de um grupo”, o que, em princípio, parece dar razão à comunidade madrilena.

No entanto, no artigo 65 desta mesma lei é ainda estabelecido que “a declaração de ações coordenadas em saúde pública caberá ao Ministério da Saúde, com aprovação prévia do Conselho Interterritorial do Sistema Único de Saúde, com a audiência das comunidades diretamente afetadas, exceto em situações de necessidade urgente, caso em que serão tomadas as medidas estritamente necessárias que serão informadas de forma urgente”.

É ainda acrescentado que “a declaração de ações coordenadas obriga todas as partes nela incluídas”, quando se trata de “responder a situações de especial risco ou de urgência para a saúde pública”. Por sua vez, é nesta posição “de risco especial” que o Ministério da Saúde espanhol considera que se encontra a comunidade de Madrid, que continua a ser a região mais afetada pela pandemia no país e cuja situação epidemiológica é considerada “preocupante”.

Em suma, de acordo com esta lei, neste caso de “situações de especial risco ou urgência para a saúde pública”, a declaração de ações coordenadas será vinculativa e, portanto, obriga a comunidade de Madrid, assim como as restantes, a colocá-las em marcha. Porém, a legislação também enfatiza que deve haver um acordo prévio entre os Conselhos de Saúde regionais. E é aqui que os dois órgãos divergem: Madrid insiste que o acordo deve ser alcançado por consenso e que, portanto, o atual não é válido nem vinculativo, enquanto o Governo central sustenta que é obrigatório, uma vez que o órgão de saúde aprovou o acordo por “larga maioria”.
Quais as novas regras?O acordo surgiu depois de o Ministério da Saúde não ter conseguido chegar a um consenso com a comunidade de Madrid, com os dois órgãos envolvidos num braço de ferro sobre as medidas a implementar.

O Ministério da Saúde já tinha recomendado, na semana passada, o confinamento de toda a comunidade de Madrid, dado que é o epicentro da pandemia da Covid-19 no território espanhol, com mais de 210 mil casos confirmados de infeção e nove mil óbitos.

No entanto, Madrid ignorou os alertas do Governo central, alargando apenas as medidas de restrição a oito novas regiões sanitárias na área metropolitana de Madrid, passando assim a ser 45 as áreas com restrições à mobilidade dos cidadãos. O Ministério da Saúde considerou estas medidas "insuficientes" e alertou que Madrid corria um "sério risco" sem medidas mais rígidas no combate ao novo coronavírus. O acordo agora anunciado pelo ministro da Saúde estipula que estas restrições serão alargadas, além de a toda a capital, às localidades de Alcalá de Henares, Alcobendas, Alcorcón, Fuenlabrada, Getade, Leganés, Torréjon de Ardoz, Móstoles e Parla.

O ponto mais importante do documento estipula que estes municípios, com mais de 100 mil habitantes, devem “impor medidas para limitar a mobilidade, os contactos sociais e a participação” em eventos, dado que cumprem três critérios: superam a taxa de 500 contágios de coronavírus por 100 mil habitantes num período de 14 dias, assim como apresentam uma taxa de casos positivos superior a dez por cento e uma taxa de ocupação das unidades de cuidados intensivos acima dos 35 por cento.

As medidas preveem, em particular, uma interdição à entrada ou saída da capital espanhola salvo por razões específicas, como deslocações para trabalhar ou para levar crianças à escola.

O documento do Ministério da Saúde não incluiu qualquer limitação aos parques, pelo que, em princípio, não obrigada ao seu encerramento, embora as comunidades autónomas o possam fazer, tal como Madrid já o fez com os parques infantis em zonas sanitárias em confinamento.
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