Deputados de Macau reclamam responsabilização de titulares de cargos públicos

por Lusa

Deputados de Macau questionaram hoje o secretário para a Administração e Justiça do território sobre a responsabilização dos titulares de cargos públicos, lembrando a impunidade em casos recentes, como no escândalo do empréstimo à companhia aérea Viva Macau.

André Cheong, que está hoje na Assembleia Legislativa (AL) para apresentar as Linhas da Ação Governativa (LAG) para 2021 quanto aos assuntos da área que tutela, defendeu que a reforma da Administração Pública constitui "o ponto mais importante da ação governativa".

Durante a apresentação, o secretário referiu que o Executivo já iniciou estudos para "aperfeiçoar o regime jurídico relativo à responsabilização dos titulares de cargos públicos" e às "responsabilidades disciplinares do pessoal de direção e chefia, criando assim uma base aquando da alteração das relevantes leis na próxima fase".

O deputado pró-democracia Sulu Sou lamentou que as LAG sejam omissas quanto à calendarização destas leis, apontando a impunidade de dirigentes no passado, como no caso do tufão Hato, que há três anos fez dez mortos, ou no escândalo do empréstimo público à companhia aérea `low cost` Viva Macau, já extinta.

"Desde o estabelecimento da RAEM [Região Administrativa Especial de Macau], nunca houve responsabilização de altos dirigentes", acusou o deputado. "Houve o escândalo do empréstimo da Viva Macau e até agora ninguém assumiu responsabilidade", apontou.

O deputado Leong Sun Iok evocou igualmente o caso da Viva Macau, denunciando lacunas "quer ao nível da responsabilização [penal], quer ao nível dos processos disciplinares".

O deputado lembrou que o chefe do Executivo prometeu que, em relação à imputação de responsabilidades em questões de fundos públicos, algo seria feito no próximo ano.

"Mas nas LAG para 2021, quanto à responsabilização dos dirigentes, não vejo em nenhuma passagem referência a esse aspeto no relatório [do Governo]", acusou Leong Sun Iok. "Afinal, como é que isto vai ser levado a cabo?", questionou.

O secretário para a Administração e Justiça, que foi anteriormente Comissário contra a Corrupção (CCAC) de Macau, afirmou que os prazos de prescrição constituem um limite à ação penal, tanto no caso da Viva Macau como noutros processos.

"Quando trabalhei no CCAC, conseguimos investigar e apurar a responsabilidade [de vários casos], mas devido à prescrição do prazo, não se pôde efetivar a responsabilização", apontou, sublinhando que o processo penal "não afasta a responsabilidade disciplinar".

"São duas vias paralelas", precisou.

O governante admitiu, no entanto, que "não há um processo disciplinar [para os dirigentes]", lembrando que já "em abril, no debate sobre as anteriores LAG", o Governo abordou a questão.

"É um trabalho que merece muita atenção da nossa parte. Em abril disse que é preciso definir bem as regras para a responsabilização e enumerar bem as responsabilidades, poderes e competências", apontou.

"Existe este problema, e estamos a estudar esta questão, e precisamos de aprofundar estes estudos para depois propor alterações aos diplomas legais", concluiu, sem adiantar datas para a apresentação.

Em 12 de outubro, a Associação Novo Macau, de que o deputado Sulu Lou é vice-presidente, já tinha dado entrada de uma petição na AL a pedir mudanças na lei para prevenir e punir responsáveis de casos como o "escândalo do empréstimo Viva Macau".

Um relatório do CCAC divulgado em 17 de setembro apontou falhas de supervisão no processo da companhia aérea, que faliu em 2010 e não pagou um empréstimo milionário ao Governo, mas não crimes intencionais, de burla ou corrupção.

O caso remonta a 2010, quando, em março desse ano, a transportadora deixou de operar, depois de as autoridades terem anulado a licença por dívidas e cancelamento de voos.

Em novembro do mesmo ano, o Executivo de Macau avançou com uma ação judicial contra a companhia aérea para recuperar o empréstimo, concedido pelo Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização (FDIC), devido às dificuldades financeiras alegadas pela companhia.

O Tribunal Judicial de Base determinou em 2018 o arquivamento do processo de falência, por os bens da Viva Macau serem insuficientes para pagar as dívidas, e decidiu não "haver necessidade de continuar a venda de ações detidas pela sua avalista", a Eagle Airways Holdings Limited de Hong Kong.

No relatório, publicado em setembro deste ano pelo CCAC, apontavam-se várias irregularidades na concessão do empréstimo, mas afirmava-se também que não se apurou que "alguém tivesse violado dolosamente disposições penais nos respetivos processos" e que sócios e administradores da empresa estivessem envolvidos em "burlas, emissão de cheques sem provisão, falência não intencional, frustração de créditos, de favorecimento de credores ou de corrupção ativa".

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