Diplomata americano abandona comissão sobre Rohingya por ser "uma fachada"

por RTP
Bill Richardson disse que a principal razão pela qual se demitiu é porque "este painel de conselheiros é uma fachada" Jason Lee - Reuters

O diplomata norte-americano Bill Richardson demitiu-se da comissão de assessores criada pela Nobel da Paz e líder do governo civil de Myanmar para resolver a crise dos refugiados Rohingya. Bill Richardson acusou Aung San Suu Kyi de não ter capacidades de “liderança moral”.

O diplomata norte-americano, antigo conselheiro da Administração de Bill Clinton e ex-governador do Novo México, renunciou ao cargo que ocupava num painel criado pela líder de Myanmar para aconselhar o seu Governo sobre a crise dos refugiados Rohingya.

Sob o argumento de que o painel é uma "fachada de branqueamento" do que tem estado a acontecer no país, em particular no Estado de Rakhine, onde a minoria étnica muçulmana vive concentrada, Bill Richardson acusou Aung San Suu Kyi de não ter capacidades de "liderança moral".

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Aung Suu Kyi - Nobel da Paz e líder do governo civil de Myanmar

Em entrevista à agência Reuters, Bill Richardson disse que a principal razão pela qual se demitiu é porque "este painel de conselheiros é uma fachada" e porque não quer "integrar um esquadrão de apoio ao governo" de Suu Kyi.

Recorde-se que o painel que o diplomata integrava foi criado para aplicar as recomendações da comissão liderada pelo antigo secretário-geral das Nações Unidas Kofi Annan, no sentido de responder à violência em Rakhine e à discriminação que ali atinge os Rohingya.

De acordo com a BBC, as recomendações foram apresentadas um dia antes do assalto armado de um grupo rebelde Rohingya e da resposta do exército birmanês, que levou mais de 700 mil pessoas desta minoria a procurar refúgio no Bangladesh. Um ato que as Nações Unidas classificaram como uma "limpeza étnica".
Suu Kyi ficou "furiosa"
O diplomata explicou ainda que entrou numa discussão com a líder do governo birmanês durante um encontro na segunda-feira, por ter tentado discutir o caso dos dois jornalistas da Reuters que foram presos durante uma investigação aos acontecimentos dos últimos meses em Rakhine e que vão ser julgados por alegada violação de segredos de Estado.

De acordo com o relato de Bill Richardson, Aung San Suu Kyi ficou "furiosa" e disse que esse assunto "não é do pelouro do painel". O diplomata disse ter ficado "chocado com o vigor" com que a líder do governo civil de Myanmar "rebaixou" os jornalistas, as Nações Unidas, os grupos de Direitos Humanos e a comunidade internacional ao longo dos três dias de encontros.

"Ela não está a ter bons conselhos da sua equipa", explicou o diplomata à agência Reuters, acrescentando que conhece a atual líder civil de Myanmar desde 1980. "Gosto muito dela e respeito-a, mas não tem demonstrado qualquer liderança moral na questão de Rakhine nem face às alegações tecidas, algo que eu lamento”.

Aung San Suu Kyi está atualmente numa visita oficial à Índia e ainda não respondeu à saída de Bill Richardson. O painel integrava dez pessoas, cinco delas estrangeiros, incluindo Roelof Meyer, o ex-ministro da Defesa da África do Sul, que na quarta-feira viajou com os restantes parceiros da comissão até Rakhine.
Sugestões "falsas e injustas"
Contudo, em entrevista à agência Reuters, Roelf Meyer disse que a visita foi "muito construtiva” e garantiu que quaisquer sugestões de que o painel "é apenas uma fachada ou um megafone do governo são completamente falsas e injustas".

O Bangladesh, que recebeu perto de um milhão de refugiados rohingyas na fronteira sudeste, atualmente o maior campo do mundo, está a pressionar o Governo birmanês de Aung San Suu Kyi para lançar o processo de repatriamento dos refugiados.

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Uma grande parte dos refugiados rohingyas, contactados pela France Presse, no interior dos campos, afirmou que não queria regressar a casa, onde as suas aldeias foram queimadas e as propriedades confiscadas e consideraram que o Estado de Rakhine não oferece garantias de segurança.

Vítimas de discriminação, os rohingyas não têm identificação e não podem viajar ou casar sem autorização. Não têm acesso ao mercado de trabalho nem a serviços públicos, como escolas e hospitais.

Num país marcado por um forte nacionalismo budista, os muçulmanos rohingyas são a maior população apátrida do mundo, desde que a nacionalidade birmanesa lhes foi retirada em 1982, durante o regime militar.

c/ agências
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