Donald Trump participa na jornada pró-vida em Washington

por Graça Andrade Ramos - RTP
Um aspecto da marcha pela vida de 2017, em Washington, EUA Reuters

Pela primeira vez, um Presidente norte-americano em exercício prevê estar ao vivo na marcha anual em defesa da vida e contra o aborto, em Washington. Apesar da participação se dar em ano eleitoral, os organizadores da jornada celebram o que acreditam ser um "ponto de viragem".

"Nunca vimos um Presidente dos Estados Unidos vir em pessoa à marcha pela vida", escreveu  Jeanne Manicini, presidente do movimento organizador do encontro que junta centenas de milhares de pessoas vindas de todos os Estados Unidos.
Trump, na sua rede social favorita, aproveitou o entusiasmo e respondeu num tweet, escrevendo "Agora veem! Até já Jeanne".

Marjorie Dannenfelser, presidente da Susan B. Anthony List, uma poderosa organização anti-abeorto, vê na presença do Presidente uma verdadeira "reviravolta".

A Casa Branca anunciou a participação do Presidente quinta-feira dia 23 de janeiro, véspera da jornada e galvanizou os particpantes.

"Estamos profundamente honrados em receber o Presidente Trump na 47.ª Marcha pela Vida", reagiu Jeanne Mancini, em comunicado.

"Desde a nomeação de juízes pró-vida", acrescentou "até à redução do financiamento dos contribuintes para o aborto, nos EUA e no exterior, e até à denuncia sobre o aborto tardio, o Presidente Trump e o seu Governo têm sido defensores constantes da vida". O Presidente deverá discursar a meio do dia, após o que o habitual cortejo irá subir a avenida junto ao Mall até à colina do Capitólio, junto ao edifício que alberga o Supremo Tribunal.

Já em 2019, Donald Trump havia manifestado o seu apoio à proteção de toda a vida humana, mas dessa vez fê-lo através de uma mensagem transmitida através de écrans gigantes.

Na altura, Trump prometeu opor-se a toda a legislação que "enfraquecesse a proteção da vida humana".

O Presidente defende que o aborto só deve ser permitido em caso de violação de ou incesto.

Este ano, a marcha coincide com o processo de destituição do próprio Trump, a decorrer no Senado, a poucos metros da marcha.

Esta será por isso uma montra perfeita para o Presidente colher frutos eleitorais, e espera-se que tanto o julgamento como os democratas, que defendem o impeachment, sejam alvos do discurso presidencial.
Leis restritivas
Vinte anos depois de se afirmar muito "pró-escolha" [da possibilidade de uma mulher escolher o aborto], o milionário parece determinado a inscrever o seu nome como o Presidente mais "pró-vida" de sempre, tendo em atenção a sua base de apoio, sobretudo os cristãos evangélicos, que terão votado esmagadoramente a seu favor em 2016.

Nos Estados Unidos, é permitido a uma mulher pedir a morte do feto até ao final da gestação, podendo mesmo tirar-se a vida de um feto plenamente desenvolvido e sem quaisquer problemas médicos, durante o seu parto natural.

Nos últimos anos têm-se multiplicado as denúncias públicas de casos de falta de socorro clínico a mulheres, cujos abortos, efetuados em clínicas alegadamente especializadas, correram mal.

O escândalo da venda de restos humanos resultantes das IGV, por parte da rede de clínicas da Planned Parenthood, PP, a maior provedora de "cuidados de saúde da mulher" dos Estados Unidos, deu ainda mais argumentos aos pró-vida.
Donald Trump defendeu a diminuição de apoios federais às atividades da PP, tanto dentro como fora dos Estados Unidos.

Apesar de enormes protestos, vários Estados da América do Norte passaram nos últimos anos leis locais muito restritivas à interrupção voluntária da gravidez.

Em março próximo o Supremo Tribunal deverá pronunciar-se sobre uma dessas leis, adotada em 2014 no Louisiana, Estado do sul dos EUA.
Acabar com as clínicas
Essa legislação impõe aos médicos, voluntários para realizar abortos, a necessidade de licença para exercer num hospital situado a menos de 50 quilómetros do lugar onde se realize a intervenção.

Os defensores do texto a ajuizar alegam que, só assim fica garantido o socorro necessário e atempado à mulher, em caso de complicações que impliquem a sua hospitalização.

Os detratores do texto afirmam que estas condições são demasiado drásticas e que só um medico e uma clínica poderiam continuar a praticar as IGV em todo o Estado, algo manifestamente insuficiente para os 10 mil abortos que ali se praticam anualmente.
Em agosto de 2016, seis meses antes da tomada de posse de Donald Trump, o Supremo Tribunal considerou ilegal uma lei semelhante adotada pelo Texas.
As nomeações de Neil Gorsuch e de Brett Kavanaugh desequilibraram o Tribunal a favor dos conservadores e a lei do Louisiana poderá passar, dando aos pró-vida oportunidade de festetejar mais uma vitória.

A questão do aborto sempre dividiu a opinião pública norte-americana desde a decisão histórica do Supremo Tribunal dos EUA no processo "Roe vs Wade", a 22 de janeiro de 1973, que legalizou a IVG em todo o país.

A sexta-feira mais próxima desse dia, 22 de janeiro, é por isso tradicionalmente escolhida para a realização da marcha de protesto e "pró-vida" em Washington, que procuram reverter a decisão.
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