Encontrado em África fóssil de dinossauro com espigões "estranhos" ligados ao esqueleto

por Inês Moreira Santos - RTP
Jose Luis Gonzalez - Reuters

Os investigadores do Museu de História Natural de Londres estão intrigados com o fóssil de um dinossauro, achado em Marrocos, que apresenta uns espigões "completamente estranhos" pertencentes ao esqueleto do animal. Segundo as conclusões dos especialistas, trata-se do mais antigo anquilossauro, um dinossauro com uma carapaça ou uma "armadura de espinhos", e o primeiro da espécie a ser encontrado no continente africano.

Denominado por Spicomellus afer, este dinossauro deve ter habitado o planeta há mais de 150 milhões de anos e, provavelmente, é um um dos mais antigos anquilossauros já descobertos. A recente descoberta foi feita nas montanhas do Médio Atlas de Marrocos, no mesmo local onde os investigadores do Museu de História Natural descobriram, anteriormente, o estegossauro mais antigo já encontrado.

Até agora só se tinham encontrado fósseis de anquilossauros na América do Norte, sendo este o primeiro encontrado em África. Mas há mais uma particularidade que está a chamar a atenção da comunidade científica: normalmente, a carapaça protetora desta espécie de dinossauro era projetada da própria pele; porém, no caso do Spicomellus afer as pontas defensivas estão ligadas às costelas, à zona dorsal, do animal – característica nunca antes observada, não só em anquilossauros como na maioria dos dinossauros que apresentavam algum tipo de proteção ou "armadura".

"O anquilossauro é um ramo diversificado de dinossauros 'blindados' cujos membros foram importantes constituintes de muitas faunas do Cretáceo", explica o documento divulgado na revista científica Nature Ecology and Evolution, onde foram reveladas as recentes conclusões.

Espécies de dinossauros com "armaduras de espinhos" ou outros tipos de proteção, como carapaças semelhantes às das tartarugas, não são uma novidade para os especialistas: os estegossauros, por exemplo, tinham fileiras de pontas defensivas ao longo do dorso; os paquicefalossauros tinham uma espécie de "armadura" na cabeça que usavam tanto para se defenderem como para atacarem; e os tricerátops tinham uma espécide de hastes. Já os anquilossauros conhecidos até à data tinham uma espécie de carapaça externa, sendo este novo fóssil um achado inédito.

"Esta espécie apresenta uma costela com uma armadura dérmica ligada à superfície dorsal, uma morfologia nunca antes vista em vertebrados extintos ou existentes", continua o texto.
Fóssil "totalmente estranho" intriga cientistas

"É totalmente estranho", disse ao Guardian a paleontóloga Susannah Maidment, especialista do Museu de História Natural de Londres.

"Normalmente, quando analisamos uma armadura em estegossauros e anquilossauros, a armadura dérmica está embutida na pele, não presa ao esqueleto. Neste caso, não está apenas em contato com o esqueleto, está fundido nas costelas".

Esta descoberta inédita intrigou os cientistas a ponto de os levar a questionarem se o fóssil podia ser falso. Mas após uma análise específica com um tomógrafo - aparelho de tomografia, também conhecida por planigrafia e estratigrafia, através de um exame radiológico que permite visualizar as estruturas anatómicas - não foram encontrados sinais de que tivesse sido construído ou adulterado.

"Quando o fóssil chegou à nossa equipa, pensávamos que seria uma parte de um estegossauro, visto que também encontramos um no mesmo local. Mas, visto mais de perto, percebemos que o fóssil era diferente de tudo o que já tinhamos visto", contou Maidment. "Não há estegossauros com este tipo de armadura".

A tomografia computadorizada mostrou um padrão de "hachura cruzada" no osso, o que é exclusivo dos anquilossauros.

"É completamente inédito e diferente de tudo o que sabemos do reino animal".
Segundo a investigação, este fóssil será do período Jurássico, há mais ou menos 168 milhões de anos, sugerindo que este animal terá sido um dos primeiros anquilossauros a habitarem a Terra. Além de ser considerado o fóssil de anquilossauro mais antigo conhecido até agora, Maidment garante que é também o primeiro a ser encontrado em África .

De acordo com a paleontóloga, esta espécie agora descoberta pode ter sido um dos primeiros anquilossauros a partir do qual os outros tenham evoluído, ou então pertence a uma linhagem ainda desconhecida.

"O espécime revela uma diversidade morfológica não detetada em dinossauros blindados durante a sua evolução inicial e implica a presença de um registo fóssil de Gonduana [o supercontinente], importante, mas ainda não descoberto", lê-se ainda no documento.

A descoberta deste fóssil pode ajudar a comunidade científica a preencher uma lacuna importante sobre a evolução dos dinossauros e sugere que os anquilossauros podem ter-se espalhado globalmente. Além disso, explicou a paleontóloga, este fóssil põe em causa uma teoria anterior de que os anquilossauros contribuiram para a extinção dos estegossauros, uma vez que a recente descoberta sugere que os dois grupos coexistiram durante mais de 20 milhões de anos e, por isso, a extinção dos estegossauros pode ter sido causada por outras razões.

Os anquilossauros, cujo nome significa "lagarto rígido", eram dinossauros grandes e herbívoros, próximos dos estegossauros. Os cientistas descrevem-nos como seres vivos que ostentavam crânios normalmente duros e com algum tipo de proteção, corpos pontiagudos e caudas tortas. Podiam atingir até sete metros de comprimento e pesar quatro toneladas.

Estes tipos de dinossauro, até agora conhecidos como "fósseis americanos e canadianos", terão existido há mais 74 milhões de anos. Contudo, este novo fóssil sugere que muito antes já existiam anquilossauros.

Este "estranho" fóssil já faz parte da coleção do Museu de História Natural, onde os investigadores vão continuar a analisar os restos mortais. Segundo Maidment, a esperança dos cientistas é que, ao trabalharem com os colecionadores de Marrocos e especialistas da Universidade de Fez, se consigam encontrar informações mais detalhadas sobre os fósseis das montanhas do Médio Atlas.
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