Estudo revela menos água em 50% dos grandes lagos

por Carla Quirino - RTP
NASA

Cientistas afirmam que a quantidade de água armazenada globalmente em grandes lagos diminuiu, nas últimas três décadas, devido a fatores climáticos e excessivo consumo humano. As observações de imagens de satélite, modelos climáticos e hidrológicos ajudaram os investigadores a demonstrar que mais de 50 por cento dos grandes lagos e reservatórios naturais sofreram perda de volume de água.

Os resultados do estudo, publicado esta semana na revista Science, vêm reiterar a importância de uma melhor gestão da água para proteger os ecossistemas essenciais à vida.

O grupo de trabalho liderado por Yao Fangang, do Instituto Cooperativo de Pesquisa em Ciências Ambientais da Universidade do Colorado, analisou os maiores lagos globais de 1972 e comparou três décadas de observações de satélite, dados climáticos e modelos hidrológicos.

A equipa de investigadores encontrou "declínios de armazenamento estatisticamente significativos para 53 por cento desses corpos de água no período de 1992 a 2020”.

As mudanças climáticas e as atividades humanas ameaçam cada vez mais os lagos que armazenam 87 por cento da água doce da superfície líquida da Terra, explicam os especialistas.

Argumentam que “a perda líquida de volume em lagos naturais é amplamente atribuída ao aquecimento climático, ao aumento da evaporação e ao consumo humano de água”. E acrescentam que “a sedimentação domina as perdas de armazenamento em reservatórios”.

A erosão de terrenos que sofreram incêndios ou foram desflorestados irá transportar maior quantidade de sedimentos soltos que se alojarão nestes recintos, retirando espaço à já pouca volumetria de água.

“O resultado da sedimentação verificar-se-á na capacidade de os reservatórios armazenarem menos água, tornando-se menos confiáveis para o abastecimento de água doce e energia hidroelétrica, principalmente para nós aqui nos EUA, visto que os reservatórios de nosso país são bastante antigos”, argumenta Yao.

O estudo deixa claro que à medida que os lagos encolhem aumentam as zonas áridas. Este desequilíbrio contribuí para uma “aridificação” da bacia hidrográfica circundante, que corresponde ao aumento da evaporação e aceleração do declínio dessa bacia.

Com o crescimento da população, os investigadores alertam para a ocupação humana necessitar de mais espaço: “Estimamos que cerca de um quarto da população mundial resida em bacias de lagos secos”.
250 mil imagens de satélite de 1992 a 2020
Embora os lagos cubram apenas cerca de três por cento do planeta, estas áreas retêm quase 90 por cento de superfície líquida de água doce.

Nas leituras feitas pelos investigadores, os níveis de água destes grandes reservatórios flutuam consoante os ciclos naturais climáticos – chuva, neve, temperatura – mas são cada vez mais afetados pela mão humana.

O Mar Cáspio, entre a Ásia e a Europa, conhecido por ser o maior corpo de água interior do mundo – tem revelado um encolhimento de volume de água. Os cientistas apontam o dedo para as mudanças climáticas e o uso da água em excesso.

Ao deslizar a linha vertical, as imagens de satélite da NASA permitem comparar dois momentos do Mar Cáspio. Documentam o recuo do volume de água entre 2006 e 2022.



Noutro exemplo, os cientistas registaram declínios acentuados no Lago Mead, do Rio Colorado, no sudoeste dos EUA. A seca e o uso humano excessivo continuam a ser as principais razões do “drástico recuo” no nível de água.

Com recurso a modelos hidrográficos e climáticos, os investigadores reconstituíram a evolução histórica dos grandes lagos nas últimas décadas.

Descobriram que 53 por cento dos lagos e reservatórios perderam quantidades significativas de água, com “um declínio líquido de cerca de 22 mil milhões de toneladas métricas por ano” – uma quantidade que os autores compararam com “o volume de 17 lagos Mead”.

O relatório revela perdas no armazenamento de água nos lagos globalmente, inclusive nos trópicos húmidos e no frio Ártico. Isso sugere que “as tendências para as áreas de lagos secarem em todo o mundo são mais extensas do que se pensava”, sublinha Yao.

Nas zonas mais frias do mundo, a evaporação do inverno torna-se um problema crescente, porque “as temperaturas mais quentes derretem o gelo que geralmente as cobre, deixando a água exposta à atmosfera”.

Os investigadores trazem também notícia de 180 reservatórios recém-cheios, já que o processo de degelo das zonas geladas encheram os lagos.

“Este estudo realmente destaca o impacto do clima de maneiras que o aproximam de nós – quanta água temos acesso e quais são as opções para aumentar o armazenamento de água?” observa Catherine O'Reilly, professora de geologia da Universidade de Illinois, citada pela estação norte-americana CNN.

“É um pouco assustador ver quantos sistemas de água doce que já não são capazes de armazenar água como antes”, acrescentou.

Comparando as imagens da NASA, visualiza-se a evolução do Lago Mead entre 2000 e 2022.


Dos satélites da NASA chega outro exemplo, agora na Austrália.

Em dezembro de 2016, os lagos Menindee, de Nova Gales do Sul, estavam quase cheios de água. Passados dois anos, esses lagos australianos ficaram quase secos.

As imagens  mostram a diminuição dos níveis de água dos lagos Menindee, uma cadeia de lagos de água doce localizada a 110 quilómetros a sudeste de Broken Hill.O aquecimento global e a seca são alguns dos motivos apontados pelos investigadores.


As temperaturas extremamente altas e baixa precipitação provocaram “fluxos extremamente baixos” de água dos lagos Menindee desde agosto de 2018.

Em fevereiro de 2019, o nível de armazenamento do Rio Lower-Darling era de um por cento. A água parou de fluir em partes do rio perdendo-se muita vida aquática e qualidade da água.

Um aspeto importante que muitas vezes não é reconhecido é a degradação da qualidade da água dos lagos devido ao clima mais quente, o que pressiona o abastecimento de água para as comunidades que dependem deles”, remata Yao. É o “efeito em cascata”.


NASA

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