EUA. Crianças migrantes de vários países estão a ser enviadas para o México

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Lucas Jackson - Reuters

Estima-se que mais de 200 crianças migrantes da América Central tenham sido enviadas para o México nos últimos oito meses. As expulsões ocorrem ao abrigo da política implementada pela Administração Trump de fecho das fronteiras em contexto de pandemia, mas violam algumas das políticas.

Desde o início da pandemia que as autoridades fronteiriças dos EUA têm enviado para o México crianças migrantes de outros países. A confirmação foi dada pelo chefe assistente da Patrulha de Fronteiras dos EUA ao New York Times, que sublinha ainda que consistem numa clara violação da política dos EUA.

A deportação de crianças ocorre ao abrigo da política de fecho de fronteiras implementada em março pela Administração Trump, que pressupõe o envio de todas as pessoas que cruzem ilegalmente as fronteiras dos EUA para os seus países de origem. Na altura, Donald Trump justificou a medida com a pandemia de Covid-19, argumentado ser necessária para evitar a propagação do novo coronavírus.

No entanto, a expulsão destas crianças entra em conflito com o acordo assinado com o Governo mexicano, que estipula que apenas crianças mexicanas e outras sob supervisão de um adulto sejam impelidas de volta para o México depois de tentarem cruzar a fronteira.

De acordo com os acordos diplomáticos existentes e as políticas dos EUA, crianças de outros países que não o México devem ser colocadas em voos operados pela Immigration and Customs Enforcement (ICE) para o seu país de origem, onde se podem reunir com suas famílias.

Recentemente, identificámos vários casos suspeitos em que menores desacompanhados oriundos de outros países que não o México foram expulsos pelos portos de entrada, em vez de serem encaminhados para Operações Aéreas da ICE para voos de deportação”, escreveu Eduardo Sanchez, chefe assistente da Patrulha de Fronteiras dos EUA, numa carta enviada ao New York Times.

Referindo-se ao estatuto federal de saúde pública sobre o qual se implica a política de encerramento de fronteiras do Governo dos EUA, Sanchez sublinhou: "Por favor, observe que, se não corrigidas, estas ações colocarão as operações do Título 42 em risco significativo e devem ser interrompidas imediatamente. Para reiterar, sob nenhuma circunstância deve um menor, sem acompanhamento de um adulto, de um país diferente do México, ser expulso intencionalmente para o México”.
Mais de 200 crianças enviadas para o México
Estima-se que mais de 200 crianças, oriundas de países como Guatemala, Honduras e El Salvador, tenham sido deportadas, sem nenhum adulto a acompanhar, para um país onde não têm qualquer laço familiar
. A maioria destes menores, pelo menos no início, foi entregue aos cuidados de autoridades mexicanas de assistência social.

A pandemia veio, desta forma, criar uma oportunidade para a Administração Trump tornar as restrições já implementadas nas fronteiras ainda mais rígidas.

Milhares de crianças passaram a ser rapidamente expulsas para os seus países de origem depois de cruzarem a fronteira com os EUA – uma prática que vai contra as estabelecidas anteriormente, segundo as quais crianças que viajassem sem um tutor adulto eram transferidas para um sistema de acolhimento do Governo norte-americano, onde eram posteriormente designadas para assistentes sociais enquanto os seus pedidos de asilo eram analisados em tribunal.

Ao contrário dessa política, as crianças expulsas durante os últimos meses foram apenas mantidas brevemente em instalações da Patrulha de Fronteiras dos EUA, ou em hotéis, antes de serem enviadas para os seus países de origem, muitas vezes sem qualquer notificação prévia às suas famílias.
Mais de 500 crianças ainda não se reuniram com a família
Desde 2018, após a implementação da política “tolerância zero” de Donald Trump em relação à entrada de migrantes ilegais nos Estados Unido, que várias famílias migrantes estiveram separadas durante meses, sem conseguirem comunicar. Centenas de crianças continuam separadas, sem conseguir voltar a ver os seus pais.

Um relatório publicado recentemente da União Americana pelas Liberdades Civis denuncia centenas de casos de pais de crianças migrantes separados nas fronteiras que não conseguem ser localizados. Embora as buscas para encontrar os pais destas crianças decorram há vários anos, o número de pais considerados “inacessíveis” é muito maior do que aquele que se conhecia.

O relatório da organização não-governamental para os direitos humanos concluiu que pelo menos 545 das crianças que foram separadas dos pais continuam longe das suas famílias. Os documentos demonstram que cerca de 60 destas crianças tinham menos de cinco anos na altura em que foram separadas.

"Reportámos ao tribunal que não se conseguem encontrar os pais de 545 crianças - separadas à força pela cruel prática de separação de famílias da Administração Trump", anunciou a União Americana pelas Liberdades Civis. Os investigadores presumem que cerca de dois terços dos pais que não foram encontrados tenham já regressado ao seu país de origem.

Ao New York Times, algumas destas famílias separadas admitiram que decidiram que os seus filhos estão mais seguros nos EUA do que no país de origem, deixando-os com amigos e familiares. Apesar de nenhum destes pais ter feito a viagem para os EUA com a intenção de se separarem dos seus filhos, a maioria diz ter sido forçada a fazer escolhas difíceis. Alguns vivem em condições precárias no país de origem, outros dizem correr perigo de vida.
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