Ex-diretor do FBI vai investigar ligações entre Trump e Rússia

por Graça Andrade Ramos - RTP
Robert Mueller na despedida do FBI em 2013 Jonathan Ernst - Reuters

Chama-se Robert Mueller e esteve à frente do Federal Bureau of Investigation, o FBI, entre 2001 e 2013, primeiro sob George W. Bush e depois sob Barack Obama. Agora, foi nomeado pelo Procurador-geral dos Estados Unidos para liderar a investigação da alegada interferência russa na campanha eleitoral dos EUA e as ligações a elementos próximos do atual Presidente.

O objetivo, diz a Procuradoria-geral dos EUA, é garantir um maior distanciamento e independência. A nomeação foi feita em nome das "circunstâncias únicas" e do "interesse público", afirmou o Procurador-geral.

A missão de Mueller será investigar "todos os laços e/ou coordenação entre o Governo russo e indivíduos associados à campanha do Presidente Donald Trump", mas também "qualquer o assunto" que decorra destas investigações, o que alarga, e muito, o âmbito do inquérito.

A indicação de um procurador especial e independente para a investigação terá sido um pedido dos legisladores democratas. E tanto estes como os representantes republicanos aplaudiram a escolha.

"Bob [Robert Mueller] era um bom procurador federal, um grande diretor do FBI e não podíamos encontrar melhor pessoas para assumir esta função", disse a senadora democrata Dianne Feinstein.

"Mueller é uma escolha soberba, tem um currículo impecável. Será amplamente aceite", foi a mensagem deixada na rede Twitter pelo republicano Jason Chaffetz. "Uma escolha excelente", aplaudiu a senadora republicana Susan Collins.
Trump lacónico
"Precisamos de factos", avisou por seu lado o líder da Câmara dos Representantes, o republicano Paul Ryan.

Mueller, muito "respeitado", abandona assim a prática num escritório privado de direito para se deixar envolver no furacão Trump. Tem como vantagem que só poderá ser demitido por erro, ao contrário de um procurador normal ou de um diretor do FBI.

O Presidente reagiu à notícia num comunicado lacónico e frio, sem sequer se referir ao novo procurador especial.

"Como já disse várias vezes, uma investigação completa confirmará aquilo que já sabemos: não houve nenhum conluio entre a minha equipa de campanha e uma entidade estrangeira".

"Estou impaciente para que se conclua rapidamente", acrescentou Donald Trump.

O Congresso, de maioria republicana, rejeitou várias vezes a nomeação de um procurador especial mas desenvolvimentos recentes e uma alegada tentativa de interferência de Trump no processo acabou por gerar mal-estar.
Escândalo atrás de escândalo
A nomeação de Mueller tenta isolar a investigação do poder político, reduzindo ao mínimo a supervisão do ministério da Justiça. O FBI investiga desde o ano passado uma polémica que mistura política e espionagem e lança dúvidas sobre o dedo de Moscovo nas eleições norte-americanas.

O assunto levou já o ministro da Justiça apontado por Trump, Jeff Sessions, a afastar-se em março do inquérito, após se saber que se encontrou por duas vezes com o embaixador russo em 2016.

Antes, em fevereiro, Michal Flynn, conselheiro de Trump para a Segurança Nacional durante pouco mais de um mês, teve de se demitir após virem a lume suspeitas do seu envolvimento com os russos.

Flynn havia admitido à equipa do Presidente que estava a ser investigado, o que não impediu a sua nomeação.

Recentemente, a 9 de maio, Donald Trump demitiu de surpresa o diretor do FBI James Comey, alegadamente devido às investigações a Flynn.

As revelações mais recentes, baseadas em notas de Comey publicadas nos jornais, afirmam que o Presidente tentou obstruir o inquérito judicial, pedindo a Comey para por um ponto final ao inquérito. Comey diz que recusou desistir, o que terá levado a sua demissão.

Já Trump desmente qualquer pressão sobre Comey, apesar de admitir, numa entrevista, que a demissão está ligada à sua exasperação com o inquérito às alegadas ingerências russas.Comey foi convidado para se explicar publicamente numa audição no Congresso mas até quarta-feira à noite ainda não tinha dado resposta.

Apesar disso, o Presidente parece até lançar de propósito mais achas na fogueira, atiçada pelos democratas que o acusam desde a campanha de ser demasiado próximo do Moscovo.

A 10 de maio, ao receber o embaixador russo em Washington e o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, na Casa Branca, Trump terá revelado propositadamente informações sobre planos do auto-proclamado Estado Islâmico para fazer explodir aviões em voo usando computadores portáteis.

A informação, contudo, tinha o nível mais elevado de segurança e era conhecida apenas por alguns membros da Administração. Não era suposto revelar nem aos mais próximos aliados dos Estados Unidos e muito menos aos russos.

Donald Trump durante um encontro em maio de 2017 na Casa Branca Foto Reuters
A soldo de Putin
De acordo com um artigo publicado no início da semana pelo Washington Post, Trump terá ainda revelado pormenores sobre a obtenção das informações, que poderão colocar em risco toda a operação de espionagem.

A Casa Branca desmentiu oficialmente que quaisquer pormenores tinham sido revelados durante o encontro. Mas o próprio Trump assumiu depois ter o direito de "partilhar com os russos" a informação que bem entendesse no interesse comum da luta contra o grupo islamita.

Se os serviços secretos norte-americanos ficaram em choque, o Presidente russo ironizou depois com a polémica, referindo que Lavrov se tinha "portado mal" por não o ter informado de nada.

Já esta quinta-feira o Washington Post abriu mais uma frente, ao revelar uma conversa privada no Capitólio, com quase um ano, em que o líder dos Republicanos na Câmara dos Representantes diz a outros republicanos que acredita que Putin pagava a Trump.

Na altura, o magnata ainda não era o candidato republicano à Casa Branca.
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