Fim do vínculo com Monarquia inglesa. Barbados torna-se a mais recente República no mundo

por Carla Quirino - RTP
Príncipe Carlos e Presidente da República de Barbados, Sandra Mason Toby Melville - Reuters

A Rainha Isabel II de Inglaterra deixa de ser chefe de Estado da ex-colónia britânica. A partir de hoje há uma nova república no mapa político mundial. A ilha de Barbados, nas Caraíbas orientais, termina a obediência à coroa britânica mas o Príncipe Carlos, que esteve presente nas cerimónias de transição da mudança de estatuto constitucional, destaca a amizade contínua entre as duas nações.

Barbados amanhece já republicana. À meia noite de 29 para 30 de novembro nascia a nova república quebrando os laços de 400 anos de imperialismo britânico.

"Desde os dias mais sombrios do nosso passado e da terrível atrocidade da escravatura, que mancha para sempre as nossas histórias, o povo desta ilha forjou seu caminho com força extraordinária", declarou Príncipe Carlos, no discurso da cerimónia.

"Emancipação, autogoverno e independência foram os seus pontos de referência. Liberdade, justiça e autodeterminação têm sido seus guias", rematou o monarca, em frente a uma multidão na praça dos Heróis Nacionais, em Bridgetown.

Esta celebração coincide com a data que assinala o 55º aniversário do Dia da Independência de Barbados, do Reino Unido.
Festividades em Bridgetown | Jeff J Mitchell - Reuters

Mia Mottley, primeira ministra e líder do Partido Trabalhista, eleita em 2018, explica à BBC porque foi escolhido este momento: "Nós acreditamos que este assunto monarquia – república estava pendente e não deveria passar do 55º aniversário da Independência sem ser resolvido".

"Uma grande parte do que estamos a fazer exige que nos engajemos com o mundo, e eu quero que nos envolvamos com o mundo, como a melhor pessoa possível que possamos ser", acrescentou.
DecisãoEm setembro de 2020 foi anunciada a decisão de romper com o vínculo da monarquia inglesa.

A então Governadora Geral, Sandra Mason, afirmou no Discurso do Trono Anual de que tinha chegado o momento do país "deixar totalmente para trás o passado colonial".

"A população de Barbados quer um chefe de estado do país. Esta é a declaração final de confiança em quem somos e no que somos capazes de alcançar", disse Mason
Os ventos de mudança A população reflete sobre o que significa e como essa mudança os afetará. As opiniões divergem.

A poeta LaShawna Griffith diz à BBC: "acredito que o país ao tornar-se uma República está a cortar com os nossos laços coloniais. Nos últimos 55 anos nós temos lutado para tornar Barbados naquilo que acreditamos que o país pode ser. E para mim, tornámo-nos numa república significa que colocamos um ponto final à subserviência em relação a Inglaterra e à monarquia. Nós precisamos de ser livres".

Mas a mãe de LaShawna pensa de outra forma.

Sharron Gibson lança a dúvida: "Isto não vai mudar nada. A vida vai ser melhor amanhã? Muito bem, vamos ser uma república, e isso vai ser melhor para as nossas vidas? Não vamos continuar a trabalhar para pagar as contas?”

Nigel Mayes, que vende laranjas no centro da cidade, tem mais certezas: "Eu estou feliz. Estamos sozinhos agora, sem rei ou rainha da Inglaterra". Mayes acrescentou à Reuters: "Esta é a mudança que faltava após a independência".Processo de descolonização lento mas naturalOs colonos britânicos controlaram a ilha em 1620 e tornaram o território um importante exportador de açúcar.

Barbados foi construído à custa do trabalho escravo africano.

Em 1834 foi oficialmente abolida a escravatura mas o país permaneceu como colónia britânica.

Apesar de ter conquistada a independência em 1966, a rainha Isabel II permaneceu como Chefe de Estado da ilha.

As docas onde outrora desembarcaram milhares de escravos deram lugar a marinas de barcos de luxo mas as marcas do passado estão por toda a ilha. No último ano cresceram os debates na sociedade sobre retirar ou não os símbolos colonialistas.

O ativista Alex Downes promoveu uma campanha para a estátua de Lord Nelson ser removida da National Heroes Square, conhecida por Trafalgar Square, bem no centro da capital Bridgetown.
"Tirámos a estátua como ato simbólico. Isto é em Bridgetown, o coração de Barbados. E agora vamos tornar-nos numa república. Penso que estas etapas fazem parte de um processo" sublinhou Downes.

Se o efeito cascata desta mudança pode demorar a sentir-se, a mensagem de LaShawna é muito clara e assenta no orgulho de fazer parte desta nova história do país.

"O dia da república começou e nós pintamos novos espaços para receber este nascimento da remodelação da nossa sociedade. Reclamamos a nossa soberania, reclamamos a nossa identidade cultural. Isto é o que nós somos".

Os jovens da República de Barbados acreditam que a tem que continuar a luta para o país se manter firme e por conta própria.

A ilha de Barbados continuará a ser uma república dentro da Commonwealth, o grupo de 54 países que fizeram parte do Império britânico, e estende-se por África, Ásia, Américas e Europa.

Joe Little, o editor-chefe da Majesty Magazine, com sede em Londres, disse à AFP que a decisão de Barbados foi uma "progressão natural" de uma tendência que começou com o reinado da Rainha Isabel II, em 1952.

"Acho que inevitavelmente é algo que vai continuar, não necessariamente neste reinado, mas no próximo - e provavelmente vai acelerar" sublinhou.
Presidente da RepúblicaSandra Prunela Mason, advogada de 72 anos, foi nomeada governadora geral da ilha em 2018 pela Rainha Isabel II, cargo agora transformado em Presidente da República.

Depois de ter sido professora no ensino secundário, foi a 1ª mulher admitida na Ordem dos Advogados nos Barbados, a 1ª mulher ocupar o cargo como embaixatriz e a 1ª mulher a integrar o Tribunal de Apelação do país como magistrada.
República de BarbadosDe acordo com o censo de 2010, a ilha tem cerca de 288 mil habitantes. 82,4 por cento tem ascendência africana e 75% professa a religião cristã.

Inglês é a língua oficial mas a população também fala Bajan, um idioma regional.

A ilha tem uma extensão de 430 quilómetros quadrados. Depois das exportações de açucar, o turismo passou a ser um sector crucial para a economia do país.

A cantora Rihanna está entre os naturais de Barbados mais famosos.
Foi-lhe conferida a honra de Herói Nacional.

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