Guiné-Bissau. País "está no abismo" desde que atual PR assumiu o poder

por Lusa

O investigador guineense Wilson Té considerou que a Guiné-Bissau "está no abismo" desde que o atual Presidente, , chegou ao poder, defendendo que mesmo após as legislativas de 04 de junho o círculo de crise vai continuar.

Em declarações à agência Lusa, o investigador do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI) da Universidade Nova de Lisboa referiu que a situação no país se agravou desde fevereiro de 2020, quando Umaro Sissoco Embaló tomou posse, e criticou o silêncio da comunidade internacional face à situação.

"A comunidade internacional já devia ter reagido há muito tempo, porque já desde 27/02/2020 a Guiné-Bissau está no abismo. Nós já assistimos a violação de direitos humanos, raptos e espancamentos, a tortura, vandalização das rádios, de pessoas. Mas há um silêncio total da comunidade internacional", lamentou.

O investigador criticou igualmente o "silêncio absurdo" da comunidade internacional quando o Presidente reiterou, no passado dia 19, durante a inauguração do porto de pesca artesanal e perante vários embaixadores, que não vai nomear Domingos Simões Pereira para o cargo de primeiro-ministro, caso a coligação que lidera - Plataforma Aliança Inclusiva (PAI) -- Terra Ranka -- ganhe as eleições.

Simões Pereira é o presidente do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), que lidera a coligação PAI -- Terra Ranka e que está atualmente na oposição, depois de o Presidente ter derrubado o Governo liderado pelo seu partido, vencedor das legislativas de 2019, mas sem maioria.

Para Wilson Té, estas declarações de Sissoco Embaló são "uma afronta à democracia na Guiné-Bissau" e "uma violação da vontade do povo, porque na democracia quem tem a palavra é o povo", além de que o artigo 98 da Constituição estabelece que "o primeiro-ministro é nomeado pelo Presidente da República tendo em conta os resultados eleitorais".

O investigador atribui o silêncio da comunidade internacional a "interesses que estão em jogo", "principalmente dos vizinhos" da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO).

"Se a comunidade internacional vê que com a presença de Umaro Sissoco Embaló no poder os seus interesses na Guiné-Bissau estão a ser levados em conta ou resolvidos, eles vão calar-se, infelizmente", disse.

O investigador do IPRI considerou ainda que o círculo de crise vai continuar, seja qual for o vencedor das legislativas.

Se vencer o Movimento para Alternância Democrática (Madem-G15), liderado por Braima Camará e do qual o Presidente é um dos fundadores, o PAIGC e mesmo o próprio Partido da Renovação Social (PRS), que integra a coligação no Governo, "vão voltar a questionar a fiabilidade das eleições" e a contestar os resultados apresentados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), defendeu.

Em causa está a legitimidade do atual secretariado da CNE, cujo anterior presidente, José Pedro Sambu, foi nomeado presidente do Supremo Tribunal. A lei estabelece que a nova composição daquele órgão deveria ser escolhida pelo parlamento, que entretanto foi dissolvido pelo Presidente, em maio de 2022.

Esta questão nunca foi oficialmente resolvida, pelo que Wilson Té considerou que pode agora voltar a ser invocada.

Por outro lado, se o vencedor das eleições for a PAI -- Terra Ranka, a crise vai continuar, não apenas pela questão da escolha do nome para primeiro-ministro, mas também porque o Presidente quer escolher os ministros de determinadas pastas que "considera sensíveis" como as Finanças, Interior, Defesa Nacional ou Negócios Estrangeiros, defendeu.

Na perspetiva de Wilson Té, esta pretensão do chefe de Estado vai gerar um novo problema e contribuir para a "continuidade da crise" porque "a Constituição da República dá toda a autonomia e direito ao primeiro-ministro de constituir o Governo com o partido que ganhou as eleições".

Perto de 900 mil eleitores votam em 04 de junho nas sétimas eleições legislativas na Guiné-Bissau desde a abertura ao multipartidarismo, em 1994, a que concorrem 20 partidos e duas coligações.

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